Faltam menos de trinta anos para que mais de metade da população mundial (52%) sofra de miopia, como estima a Organização Mundial da Saúde para o ano 2050. Os últimos 18 meses de pandemia, a causa de todos os confinamentos, deixaram as pessoas com menos acesso à luz natural e à exposição à luz solar. Em contraponto, ficaram muito mais horas em frente aos ecrãs, das televisões aos computadores, dos telemóveis aos laptops, seja em lazer, em teletrabalho ou em aulas no ensino à distância. A verdade é que a luz do sol, na dose certa e com uma boa proteção, leva a dopamina para a retina, substância que evita que o globo ocular se torne mais longo, evitando problemas degenerativos.
O olho tem um formato redondo, como uma bola de futebol, mas quando fica míope, torna-se mais comprido, ovalado como uma uva ou uma azeitona. A retina, o seu revestimento, pode ser esticada e diluída. À medida que se envelhece, podem surgir descolamentos da retina, podendo evoluir para a cegueira.
Em todo o mundo, cada pessoa passa, em média, um total de seis horas e 55 minutos a olhar para um ecrã todos os dias. Para quem está acordado das oito da manhã às onze da noite, isso representa 46% do seu tempo.
Uma nova investigação feita por oftalmologistas mostra que o tempo contínuo em frente ao ecrã está a mudar radicalmente os olhos humanos. E, tal como todo o corpo, o olho também deve parar de crescer depois da adolescência. A novidade é que agora o olho continua a crescer. De cada vez que os olhos passam muito tempo a focar objetos próximos, como telefones ou mesmo livros de bolso, isso faz com que o globo ocular se alongue, o que impede o olho de desviar a luz como deveria. Esse alongamento aumenta a miopia, o que faz com que objetos distantes apareçam desfocados. Nos Estados Unidos, a miopia afeta metade dos adultos jovens, o dobro de há 50 anos e mais de 40% da população. Por cá, mais de 2,5 milhões de portugueses sofrem de miopia. Em 12 anos, entre 2002 e 2014, houve um aumento da prevalência da miopia de 23% para 42 por cento. E, mais recentemente, entre 2019 e 2020, já contemplando a pandemia, dispararam os casos de miopia entre crianças e jovens, dos cinco aos 18 anos: a incidência média deste tipo de erro refrativo cresceu 40% durante o confinamento.
Nos adultos, isso pode causar tensão ocular ou acelerar problemas de visão já existentes. Mas, para as crianças, cujos olhos ainda estão em desenvolvimento, a situação é mais preocupante e a Academia Americana de Optometria e a Academia Americana de Oftalmologia consideram a miopia uma epidemia.
Trabalhar por períodos prolongados, seja a enviar mensagens de texto, a ler ou a escrever e-mails, é o que os optometristas chamam de “trabalho próximo”. O problema de segurar um ecrã perto da cara não é apenas a luz a brilhar nos olhos, mas também o cansaço visual que causa. Por um lado, os olhos piscam muito menos quando estão focados tão de perto e os seus músculos alongam-se por se acomodarem a tarefas constantes a curta distância. Quando se põe óculos, os músculos dos olhos relaxam, pois já não estão em esforço. O mesmo acontece se, sem os óculos, desviar o olhar do telemóvel, piscar algumas vezes e olhar para o horizonte durante 20 segundos.
Na primavera passada, investigadores chineses testaram mais de 120 mil alunos em quarentena, entre os seis e oito anos, descobrindo que a miopia e outros problemas de visão aumentaram até três vezes em comparação com os cinco anos anteriores – com apenas 2,5 horas a mais de ensino online, sem contar com videojogos ou uso de redes sociais.
Nos Estados Unidos, são cada vez mais as crianças a usar novas lentes de contacto aprovadas pela agência reguladora do medicamento norte-americana, a Food and Drug Administration (FDA), que remodelam efetivamente o olho para diminuir a miopia. Essas lentes mudam a forma como a luz se curva dentro do olho e puxa a imagem para a frente da retina, o que retarda o crescimento axial porque a imagem clara agora está na frente da retina.
Abordagens caseiras como GoCheckKids, uma aplicação de triagem de visão registada pela FDA permite que qualquer pai tire uma fotografia dos olhos dos seus filhos para analisar como a luz refrata e medir os riscos de miopia ou hipermetropia e outras doenças oculares. Em português, o site Salta à Vista também ajuda com sinais de alerta ou conselhos para pais e professores.
No início de novembro, na conferência anual de pesquisa ocular organizada pela Academia Americana de Optometria em Boston foram apresentados os resultados de um estudo feito durante sete anos que revelou um crescimento anormal do comprimento axial desacelerado a uma média de 50% entre os oito e os 17 anos.
Quanto maior for o comprimento axial, maior o risco de doenças oculares como glaucoma, descolamento de retina e catarata.
Para quem não conseguir evitar o excesso de tempo em frente aos ecrãs, saiba que as pausas são o melhor aliado da visão, pois ajudam a repousar, piscar e lubrificar. O ideal é a cada 20 minutos olhar para uma distância de cerca de sete metros, durante 20 segundos. É rápido e preventivo.