O tempo no outono é por norma instável, mas vale a pena programar umas saídas em família nos intervalos dos pingos da chuva. São já vários os estudos a demonstrar que a natureza favorece a comunicação entre pais e filhos.
“A natureza restaura a capacidade de as pessoas prestarem atenção às conversas e reduz a fadiga mental. E isso pode ajudar os membros da família a comunicarem de forma mais eficaz e a relacionarem-se melhor uns com os outros”, sublinhou Dina Izenstark, professora de desenvolvimento infantil e adolescente na Universidade de San José, nos Estados Unidos, na apresentação do estudo Os benefícios afetivos e de conversação de uma caminhada na natureza entre as díades [relações simbióticas] mãe-filha, publicado em março deste ano.
Ao comparar as caminhadas de 20 minutos ao ar livre e dentro de casa de 28 pares de mães e filhas, a equipa liderada por Izenstark concluiu que tanto as mães como as filhas expressaram menos negatividade durante a caminhada na natureza. E que falaram mais sobre o ambiente à sua volta durante a caminhada dentro de casa, envolvendo-se em conversas mais neutras ao ar livre.
Mas há mais. Os investigadores descobriram que fazer uma caminhada na natureza não melhora o humor e a atenção entre mães e filhas apenas durante o passeio. O efeito perdura no tempo – todas as mulheres do estudo revelaram um sentimento maior de união no final.
Melhores conversas
Não é de hoje o interesse de Izenstark no impacto da natureza nas famílias. Em 2017, esta especialista em desenvolvimento humano descobriu que passar um tempo na natureza com uma criança – mesmo que fosse apenas uma caminhada de 20 minutos num parque – tinha o poder de fortalecer os vínculos pais-filhos e a coesão familiar.
Seria, porém, só no ano seguinte que uma equipa do Reino Unido iria demonstrar que a comunicação pai-filho funciona melhor em ambientes naturais, comparando com ambientes fechados.
Thea Cameron-Faulkner, professora de linguística na Universidade de Manchester, e duas outras investigadoras gravaram e analisaram dezenas de passeios entre crianças de três e quatro anos com os seus pais. “O nosso estudo demonstra que os ambientes naturais podem melhorar significativamente a qualidade das conversas entre pais e filhos”, afirmou na altura.
“Um dos aspetos mais desafiantes das conversas é ouvir e responder ao que as outras pessoas dizem”, lembrou, então, a co-autora Merideth Gattis, da Escola de Psicologia da Universidade de Cardiff. “E os resultados do nosso estudo sugerem que uma maneira simples para as pessoas melhorarem esse processo é passar tempo ao ar livre, em ambientes naturais.”
Basta sair de casa
Não é novidade que sair de casa, por si só, traz às crianças uma série de benefícios que vão muito para lá da óbvia diminuição do risco de obesidade. De acordo com várias investigações, os miúdos que passam tempo ao ar livre são mais felizes, inteligentes e criativos.
Desde, pelo menos, os anos 1990 que a comunidade científica está de acordo em como o movimento pode fortalecer a capacidade do cérebro para aprender e recordar aquilo que foi aprendido. Diferentes estudos demonstraram que muitas das vias neurais no cerebelo, uma área do cérebro envolvida na coordenação dos movimentos motores, estão também envolvidas nos processos de aprendizagem. Mais recentemente, descobriu-se igualmente que os movimentos transversais laterais e os movimentos de braços e pernas ajudam os dois lados do cérebro a comunicarem entre si.
Juntando a natureza a esta equação, os resultados são ainda melhores – e bastará um quintal, pisar a relva. Centenas de investigações indicam que a natureza tem impactos positivos na saúde das crianças.
A vitamina N e a ‘hipótese da biofilia’
“Há algo em estar no mundo natural que melhora o desenvolvimento cognitivo e a saúde física e mental”, costuma começar por dizer nas suas palestras Richard Louv, co-fundador da Children and Nature Network, uma organização criada por um grupo de educadores e escritores americanos preocupados com o afastamento das crianças da natureza.
“O tempo passado ao ar livre pode ajudá-las a terem mais confiança, pode ensinar a acalmarem-se, a melhorarem a concentração e a reduzir o stresse”, sublinha Louv, que cunhou o conceito de “transtorno do défice de natureza” e é autor de vários livros, incluindo os bestsellers Last Child in the Woods (à letra, a última criança na natureza) e Vitamine N: The Essential Guide to a Natural-Rich Life (um guia sobre a vitamina N, de natureza).
Na base de tudo isto está a “hipótese da biofilia”, popularizada pelo biólogo, naturalista e escritor americano Edward O. Wilson, em 1984. Biofilia vem do grego bios, vida, e philia de amor, afeição. No seu livro precisamente intitulado Biofilia, Wilson defende que os humanos têm uma tendência inata de buscar ligações com natureza e outras formas de vida. Porque evoluímos em ambientes naturais, é neles que prosperamos.
E pode bastar uma simples imagem. Um estudo realizado com crianças em Barcelona, que recorreu à ressonância magnética, descobriu que o acesso a espaços verdes urbanos ou apenas ver árvores e céu através de uma janela para aumentar a matéria cinzenta e branca em áreas do cérebro ligadas à memória, concentração e cognição.