Ryder Carroll cresceu a pensar que tomar boas decisões é mesmo difícil. E sobretudo a tentar não desanimar quando uma e outra vez se distraía no meio das tarefas. Em miúdo fora diagnosticado com distúrbio do défice de atenção (DDA), e tornara-se um adulto igualmente desatento ou, como hoje prefere dizer nas suas palestras, “focado em demasiadas coisas ao mesmo tempo”. Resultado: nunca sabia para que lado se virar.
O tempo foi passando e ele já trabalhava há uma década em design de produto digital quando teve uma epifania – ironicamente de papel e caneta na mão. E se começasse por fazer uma lista daquilo que o ocupava na altura, as coisas em que deveria estar a trabalhar e aquelas que gostaria mesmo de fazer, estabelecendo prioridades? Foi assim que este americano, a morar em Brooklyn, arrancou para a criação do Bullet Journal, um misto de agenda e diário (journal, em inglês), com listas de afazeres quotidianos e metas mensais.
O BuJo, como lhe chamam os íntimos, é “um sistema analógico para guardar o passado, organizar o presente e planear o futuro”, resume Ryder no vídeo de apresentação e lê-se agora na capa do livro que acabou de lançar nos Estados Unidos da América e em vários outros países (O Método Bullet Journal, Lua de Papel). Mas ficará mais bem explicado como uma “prática de mindfulness disfarçada de sistema de produtividade”, resume o designer no site oficial (bulletjournal.com).
A palavra bullet não surgiu por acaso. Foi escolhida pelo autor para designar as entradas no caderno, sempre curtas e objetivas – afinal, bullet significa bala, mas também serve para designar os pequenos símbolos que muita gente gosta de pôr no início das frases, quando faz listas. A ideia é as frases serem lidas num só olhar, ou não fosse ele um designer, naturalmente centrado no princípio de que a forma segue a função. E para que tudo fique ainda mais claro, cada uma das entradas deve ser antecedida de um símbolo.
Muitos seguidores quiseram que os seus próprios bullet journals fossem também cadernos de desenhos, conclui-se ao seguir as hashtags #bulletjournal ou #bujo no Instagram ou no Pinterest. “Se as pessoas se tranquilizam a passar mais tempo dedicadas ao caderno, a fazer florzinhas, quem sou eu para dizer que é errado…”, comenta Ryder, cujos cadernos têm sido sempre a preto e branco.
A hashtag #lettering devolve igualmente milhares de páginas, porque uma caligrafia clara e atrativa facilita a leitura. Aliás, escrever à mão é talvez o maior segredo do êxito do método de Ryder, porque existe evidência científica de que o cérebro retém melhor as informações dessa forma do que quando o fazemos no computador. O movimento estimula a nossa mente de modo mais eficaz do que num teclado e por isso retemos informação durante mais tempo. Mais: ao delinearmos cada letra, começamos automaticamente a filtrar o que é importante.
O grande desígnio do Bullet Journal é ajudar as pessoas a viverem de maneira intencional, “a terem vidas produtivas e relevantes”, costuma dizer Ryder, hoje com 37 anos. E para isso será preciso começar por “destralhar” a mente, libertar espaço como quem arruma a despensa, fazendo um “inventário mental”, defende.
Segundo vários estudos, temos 50 a 70 mil pensamentos por dia. “E é como entrarmos cheios de fome num supermercado sem uma ideia do que queremos comer – claro que fazemos más escolhas e acabamos a ter de telefonar para encomendar uma pizza”, comparou o designer, numa TED Talk recente, lembrando: “A ‘fadiga decisória’ é um dos componentes de stresse diário e do cansaço mental; por causa dela, adiamos pequenas decisões ou ações que ficam no fundo da mente, a drenarem a nossa energia.”
Um estudo publicado em 2011, no Journal of Personality and Social Psychology mostrou que delinear um plano alivia a ansiedade de concluir uma tarefa e aumenta a eficiência em executá-la. Ryder propõe que os objetivos sejam divididos em projetos viáveis pequenos, seguindo três regras: não pode haver barreiras para entrar neles; devem ter uma lista de tarefas clara; e devem demorar menos de um mês a ser completados.
Por fim, mas não menos importante, todo o dono de um bullet journal terá de dedicar cinco minutos por dia a manter o seu inventário mental atual. “Temos de rever o mapa, senão andamos à deriva”, diz o inventor deste método. “Faço isto há anos e, no final, mostra-me o poder que tenho para moldar a minha vida.” Sempre sem perder de vista o principal conceito-chave do seu método: não podemos inventar o tempo, só aproveitá-lo
Como funciona o “BuJo”?
Pense no Bullet Journal como se fosse uma construção de Lego
PREPARAÇÃO Arranje um caderno em branco e uma ou mais canetas
ÍNDICE Reserve as primeiras quatro páginas (para numerar o caderno)
REGISTO FUTURO Anote as tarefas para o ano todo, em quatro páginas
REGISTO MENSAL Tenha uma perspetiva das tarefas, em duas páginas
REGISTO DIÁRIO Arrume as tarefas e as ideias que tem ao longo do dia
REGISTO RÁPIDO As notas devem ser curtas e concisas
SÍMBOLOS Para ajudar a categorizar: – Nota, 0Evento, .Tarefa, xTarefa cumprida, >Migrar tarefa, <Tarefa agendada, Tarefa irrelevante, *Prioridade, !Grande ideia
COLEÇÕES O índice e os registos são as coleções-base, mas pode criar outras para coisas que lhe interessem
MIGRAR Todos os meses, faça uma limpeza dos registos, migrando (para um próximo registo mensal) ou agendando (no registo futuro) o que interessa e eliminando o que não interessa
EVENTOS São experiências agendadas previamente (Festa anos João) ou registadas após a ocorrência (Assinei contrato)
NOTAS Incluem factos, ideias, pensamentos e observações. Exemplo: “Bolo João – sem glúten”