Com os seus vestidos justos e as suas saias travadas (uns dedos abaixo do joelho), e sempre de tons neutros, Claire Underwood tem sido descrita como a personificação do poder no feminino. Ao longo das várias temporadas da série House of Cards, a atriz Robin Wright, que interpreta a mulher de Frank Underwood, nunca usou acessórios espalhafatosos nem penteados elaborados. Assim, não distrai a atenção dos espetadores e passa uma mensagem clara: ela quer, pode e manda. Uma das raras imagens já avançadas como teaser da sexta e última temporada mostra Claire como Presidente dos Estados Unidos da América. Sentada à secretária da Sala Oval, lá está ela de saia escura e camisa branca, sem o cliché das florzinhas. Mas, se saltarmos para a realidade, tanto vemos a chanceler alemã, Angela Merkel, de vestuário viril, como a primeira-ministra britânica, Theresa May, de botas de cabedal até ao joelho. E se olharmos para Portugal, assistimos a uma coabitação pacífica entre os vestidos-mais-blazer da líder do CDS-PP, Assunção Cristas, as calças de ganga da deputada do Bloco de Esquerda Mariana Mortágua e o look masculino com um twist da presidente da Galp Paula Amorim.
Mesmo com uns kiwis à mistura (que em Portugal animaram as redes sociais há dois verões, como se vai ler), em que ficamos? As mulheres que ocupam lugares de topo – seja na política seja nas empresas – devem ou não usar uma versão feminina do fato do homem, para demonstrar que se encaixam bem num mundo ainda dominado por eles?
“Estamos infinitamente mais livres.” Ana Loya há de começar e terminar a entrevista com esta frase. A CEO da Mindshift Talent Advisory tem 59 anos e lembra-se bem de como era o ambiente quando começou a trabalhar – nas reuniões, sentia sempre necessidade de parecer mais velha. “Os homens punham fato e gravata, e ficava tudo normalizado, e nós, as mulheres, tínhamos de usar aquela roupa tradicional dos filmes de advogados: saia ou calça e casaco.”
Muito mudou, entretanto, e felizmente, acrescenta esta especialista em recursos humanos e coaching. Agora, apenas importa conhecer os limites da “liberdade de vestir” dentro dos padrões sociais. E o exemplo de Assunção Cristas é, a seu ver, um paradigma. “Veste-se como lhe apetece e, como tem educação, sabe que não se vai para a praia de vestido comprido nem para um cocktail de calças de ganga.”
Hoje, prevalece o bom senso, defende Ana Loya. “Quando as mulheres têm poder, a roupa é ‘terciária’. As pessoas escolhem a sua identidade e o poder atinge-se de várias maneiras.” Quanto à hipótese de usarem uma versão feminina do fato do homem, torce o nariz. Será preferível assumir a diferença e a feminilidade, diz. “Até porque se um homem machista vir uma mulher ‘vestida à homem’, continuará a ver uma mulher.”
Irina Golovanova, diretora da empresa The Body Language Academy, afina pelo mesmo diapasão. Para esta especialista em comunicação não verbal, as mulheres devem usar vestidos e recorrer ao azul. “Não é por acaso que redes sociais usam essa cor… Nós confiamos-lhes os nossos dados pessoais!” Assumidamente contra estampados (“porque dão um ar mais frágil”) e transparências (“a roupa interior é… interior”), confessa ter ficado espantada ao ver o vestido com kiwis usado por Assunção Cristas numa entrevista à revista Sábado, em agosto de 2016. “Não é o que estamos à espera do mundo político, tão conservador”, admite. Mas se foi uma opção deliberada para passar a imagem de uma mulher “jovem e livre”, funcionou, diz.
De dentro para fora
O importante é definir a mensagem que se quer transmitir, sublinha por sua vez Filipa Gonçalves, que trabalhou 17 anos na área dos recursos humanos de uma farmacêutica. “É através da nossa roupa que vendemos a nossa própria marca”, lembra. “E o importante”, acrescenta, “é sentirmo-nos confortáveis e transmitirmos uma imagem credível”.
Para a vice-presidente da Dress for Success Lisbon, associação que ajuda mulheres a vestirem-se para as entrevistas de emprego, a atitude é o que nos distingue. “A primeira imagem é importante, porque se tiram conclusões nos primeiros segundos, mas temos de nos vestir de dentro para fora. O que está por fora acaba por ser acessório.”
Será, então, natural que as mulheres políticas que pertencem a partidos de direita se vistam de uma maneira mais conservadora, enquanto à esquerda a tendência seja para uma maior informalidade. “Tem a ver com a mensagem que querem passar.”
Palavra de especialista
“Antes de falar, já estamos a comunicar”, lembra Irina Golovanova, diretora da empresa The Body Language Academy
> A USAR
• Vestidos com blazer
• Saias ou calças com camisa branca
e casaco
• Maquilhagem suave
• Azul-escuro
> A EVITAR
• Rendas e transparências, em geral
• Decotes pronunciados
• Saias curtas e saltos muito altos
• Cor de laranja
O que transmitem as cores
AZUL – Credibilidade
(40% das pessoas gostam dele)
PRETO – Liderança
(Combinado com branco transmite
mais poder)
VERMELHO – Poder
(Deve ser usado apenas em apontamentos)
VERDE – Equilíbrio
(Também mostra descontração)
CINZENTO – Profissionalismo
(A conjugar com um acessório de cor viva)
COR DE LARANJA – Entusiasmo
(Mas é considerada pouco profissional)
AMARELO – Criatividade
(E também pode transmitir ansiedade)
ROXO – Luxo
(Poderá passar um sentimento
de superioridade)