Em teoria, é o sonho de qualquer produtor de salmão: um peixe que cresce praticamente duas vezes mais depressa, ficando pronto para ser comercializado em 16 a 20 meses, contra os 30 a 34 meses de um espécime normal. Na prática, o primeiro salmão geneticamente modificado (com um gene do salmão-rei, da costa do Alasca) demorou 25 anos a entrar no mercado canadiano – e a maior parte desse tempo foi passado em testes e processos regulatórios. E a batalha da empresa que o produz ainda vai a meio: agora há que lidar com a desconfiança do público em relação aos organismos geneticamente modificados (OGM), desconfiança essa alimentada pelos movimentos ambientalistas, que continuam a levantar dúvidas sobre a segurança dos transgénicos para a saúde e para o ambiente.
A empresa que o produz, no entanto, assegura que, além de ser perfeitamente seguro para a saúde, o salmão AquAdvantage não se limita a ter um impacto neutro no ambiente (por exemplo, todos os animais são fêmeas estéreis, para não haver o risco de dominarem o ecossistema, se forem introduzidos no oceano). O que distingue o peixe transgénico é precisamente ser mais ecológico, diz a AquaBounty Technologies, em resposta à VISÃO. Ao ponto de apresentar essa vantagem como razão para não baixar os preços, apesar de crescer mais depressa e necessitar de menos 25% de alimentação para chegar à idade adulta. “O nosso salmão é criado em tanques de aquacultura, não em aquacultura de mar. Ao ter a produção mais próxima do consumidor, e reduzindo os impactos ambientais negativos e a pegada ecológica, os consumidores poderão ser atraídos pelos benefícios e estarão preparados para pagar um preço mais alto.” Além disso, . Para já, diz o porta-voz da empresa, Dave Conley, o salmão geneticamente modificado está a ser vendido, aos distribuidores, ao preço médio do salmão não transgénico (€7,8 o quilo).
Entre maio de 2016 e agosto de 2017, a AquaBounty vendeu cinco toneladas de salmão transgénico. O sucesso já levou à decisão de renovar as instalações da empresa no estado americano do Indiana, com capacidade de produção de 1200 toneladas anuais, e de construir outros tanques no Canadá, para 250 toneladas por ano. O projeto passa por produzir o suficiente para entrar em breve no mercado dos EUA, onde está em processo final de aprovação pela entidade reguladora, a FDA (Food and Drug Administration).
Mas não há planos para exportar o peixe para a Europa. Questionado pela VISÃO sobre essa possibilidade, a resposta de Dave Conley foi um lacónico “não”. E há uma razão para isso – a opinião pública na União Europeia é tradicionalmente muito mais avessa aos OGM dos que os EUA e o Canadá, e as políticas são moldadas tendo em conta essa má fama. Uma das diferenças na abordagem ao tema é notório na legislação da rotulagem: enquanto que do outro lado do Atlântico se considera que não há diferenças fundamentais entre produtos OGM e não OGM, e portanto não é necessária rotulagem especial, na UE, qualquer produto com mais de 0,9% de transgénicos tem de mencionar esse facto na embalagem.
Esse é também o motivo pelo qual a maçã Arctic Golden (geneticamente modificada para não escurecer depois de cortada, à venda nos EUA desde novembro) não chegará tão cedo à Europa. “Não temos planos para pedir a aprovação da maçã em países europeus, embora seja uma possibilidade para o futuro”, admite à VISÃO Neal Carter, presidente da Okanagan Specialty Fruits, empresa produtora da Arctic Golden. As campanhas em curso de associações ambientalistas para convencer cadeias de restaurantes e supermercados a boicotarem a maçã, no continente norte-americano, é só uma amostra do que esperaria o fruto transgénico no Velho Continente.