O ministro da Saúde afirmou hoje que não é uma “prioridade” pôr fim à isenção de taxas moderadoras em caso de Interrupção Voluntária da Gravidez (IVG), mas respeita a iniciativa desenvolvida pela Assembleia da República nesse sentido.
“Esta não é a nossa prioridade, é uma iniciativa da Assembleia da República que respeitamos”, disse Paulo Macedo.
“O Governo teve uma iniciativa clara sobre taxas moderadoras, a última vez que legislou, legislou e não deve estar sempre a legislar sobre os mesmos assuntos, deve haver alguma serenidade embora o que é para ratificar deva ser retificado quando é para melhor”, defendeu.
O ministro da Saúde falava aos jornalistas em São Tiago, no concelho de Portalegre, à margem da inauguração de uma unidade de convalescença e residencial de idosos que contou com um investimento de cerca de 1,2 milhões, criando 30 postos de trabalho.
Paulo Macedo fez questão de sublinhar que a “prioridade” do Governo em termos de taxas moderadoras “foi muito clara”, recordando que a estratégia passa por isentar os jovens.
O ministro da Saúde recordou ainda que têm vindo a “diminuir” no país o número de casos de IVG, sustentando que em 2014 registou-se uma diminuição “de quase 10 por cento” de casos.
No dia 3 de julho o parlamento vai discutir um projeto da maioria para equiparar a IVG aos outros atos médicos e aplicar taxas moderadoras seguindo o regime geral e uma iniciativa legislativa de cidadãos que propõe diversas medidas, como mostrar à mulher e fazê-la assinar uma ecografia antes da IVG, e também o fim da “equiparação entre maternidade e IVG” para efeitos de prestações sociais e taxas moderadoras.
A conferência de líderes parlamentares tinha decidido no dia 17 deste mês não agendar a discussão desta iniciativa legislativa de cidadãos, propondo que transitasse para a legislatura seguinte, o que foi decidido com o acordo de todos os partidos.
O presidente da Assembleia em exercício na altura, Guilherme Silva (Assunção Esteves estava em visita oficial à Guiné-Bissau) ficou incumbido de comunicar aos proponentes, explicando-lhes que a iniciativa caducava caso fosse discutida na generalidade e depois o processo legislativo não fosse concluído na especialidade e com votação final global. Sem iniciar a votação em plenário, poderia ser discutido na legislatura seguinte.
A Rádio Renascença avançou na quarta-feira que a presidente da Assembleia da República, Assunção Esteves, tinha-se comprometido com a discussão desta iniciativa e ficou desagradada com a tentativa de adiamento, tendo-se desdobrado em contactos nos últimos dias para tentar garantir que fosse debatida até às férias.
“Selvajaria moral”, acusa Isabel Moreira
A deputada socialista Isabel Moreira condenou hoje a “selvajaria moral” da introdução de taxas moderadoras na Interrupção Voluntária da Gravidez (IVG) argumentando que é “um ato de saúde materno-infantil” e que a isenção cumpre um objetivo de sigilo.
“A isenção de taxas moderadoras não é nenhum favor que se faz a quem interrompe uma gravidez. Todos os atos de saúde materno-infantil estão isentos de taxas moderadoras. É uma forma de obstaculizar que as mulheres possam interromper uma gravidez. Quem não considera uma IVG um ato de saúde materno-infantil deve ter um problema de deficiência cognitiva”, defendeu à agência Lusa.
A deputada socialista sublinhou ainda, relativamente ao projeto de lei de PSD e CDS-PP para introduzir taxas moderadoras na IVG, que “há um argumento muito importante, que é o argumento do sigilo”.
“Uma mulher pode não ter forma de fazer prova da sua insuficiência económica. Uma mulher que dependa do marido e não lhe queira dizer, quebraria o sigilo e estaria em causa este momento absolutamente pessoal das mulheres”, expôs.
Isabel Moreira afirmou ainda que o que está em causa é “impor taxas moderadoras à IVG em todos os casos, não só até às 10 semanas”: “Uma mulher que interrompa a gravidez para salvar a sua vida, paga taxa moderadora. Uma mulher que interrompa a gravidez porque foi violada, paga taxa moderadora. Portanto, isto é uma autêntica selvajaria moral”.
“Tenho pena de ver pessoas que se dizem muito conhecedoras na área da saúde e de direitos fundamentais, como a deputada Teresa Leal Coelho e a deputada Teresa Caeiro, dizerem que, enfim, se uma mulher parte uma perna paga taxas moderadoras e uma mulher que faz uma IVG deve pagar taxas moderadoras, ignorando que todos os atos de saúde materno-infantil estão isentos de taxas moderadoras”, sustentou.
Isabel Moreira sublinhou ainda que tanto o projeto de lei da maioria como a iniciativa legislativa de cidadãos (ILC) pelo “direito a nascer” partem da ideia errada de que Portugal tem “números terríveis relativamente à IVG”, quando apresenta “uma das menores taxas da Europa, abaixo de todas as previsões, e em que o número de abortos repetidos é menos de 1%”.
A deputada reiterou o que afirmou aos promotores da ILC quando foram ouvidos na comissão parlamentar de Assuntos Constitucionais, de que se tratada de “uma das iniciativas mais violentas contra as mulheres” que leu.
“Pretendia não só que a IVG deixasse de ser comparticipada como que qualquer mulher que fizesse uma IVG não teria justificação de falta, licenças, baixas comparticipadas, etc”, apontou.
Por outro lado, “obrigar as mulheres a ver e assinar a ecografia – só lhes falta esfregar com a ecografia na cara -, é um ato de uma indignidade enorme, já criticado por médicos de várias especialidades, quer de obstetrícia quer de psiquiatria”, sublinhou também Isabel Moreira.
Isabel Moreira condena também “a ideia que está subjacente ao projeto destas pessoas que é o progenitor homem ter uma palavra a dizer”, argumentando que “quem está grávida é a mulher”, que pode não saber quem é o progenitor, estando subjacente uma obrigação de a “mulher a dizer com quem teve relações sexuais”.
“Mais, o progenitor pode ser um violador”, declarou.