À terceira foi de vez. O milionário Alfred Mann não desistiu até ver o seu projeto de milhares de milhões de dólares passar no crivo da Food & Drug Administration (FDA), o organismo americano que controla a qualidade dos medicamentos. E, assim, conseguiu a segunda aprovação da história para uma forma de insulina inalável, desta vez para a sua empresa, a MannKind.
Há quase cem anos que o tratamento da diabetes abre o caminho à inovação médica. O mercado é apetecível – são já 347 milhões de doentes, em todo o mundo, e a tendência tem sido de subida. A última grande novidade chegou no final de junho e deixou médicos e, sobretudo, pacientes a sonharem com o fim das picadas diárias. Aplicada num aparelho com a forma de um apito, esta insulina em pó demonstrou a mesma eficácia no controlo dos valores de glicose no sangue, sem efeitos adversos assinaláveis.
Mesmo assim, quem tem boa memória, não esquece o desaire que foi a primeira tentativa de substituição do injetável. Em 2007, um produto também inalável, da Pfizer, seria retirado do mercado porque obrigava à administração de uma dose dez vezes superior, que acabava por ficar retida nos pulmões. Além disso, era demasiado caro e podia trazer complicações respiratórias.
O medo das agulhas
Agora, Mann, um outsider nesta área, apressa-se a dizer que a única semelhança entre um e outro produto é uma mera coincidência. O seu aparelho é muito mais pequeno e a insulina já vai decomposta e pronta a entrar na corrente sanguínea, numa absorção que acontece em apenas 12 minutos. Até o preço – ainda por definir – deverá ser competitivo com o da aplicação por canetas.
“Será menos doloroso e mais prático”, admite o médico Luís Gardete Correia, presidente da Associação Protetora dos Diabéticos de Portugal (APDP). De qualquer forma, a aprovação é só para adultos e não dispensa a administração de insulina basal – que permanece no sangue durante 24 horas e habitualmente é injetada à noite. “Espera-se que os problemas relativamente à primeira experiência tenham sido resolvidos”, nota Gardete Correia.
Em Portugal, deverão ser cerca de 100 mil os diabéticos dependentes da insulina, estima o diretor clínico da APDP, João Filipe Raposo. Para estes doentes, as quatro ou cinco picadas por dia farão parte da sua rotina, para o resto da vida. “Tentamos desmontar o estigma, levar as pessoas a administrarem a insulina em público, sem se esconderem na casa de banho. Mas há muita gente que tem medo de agulhas e continua a sentir vergonha de se picar à vista de outras”, admite o médico e investigador.
De qualquer maneira, não vale a pena ir a correr ao médico. Para já, não foi pedida qualquer autorização à Agência Europeia do Medicamento. E, mesmo nos Estados Unidos, ainda há um bom caminho a percorrer. Mann, dono de uma empresa relativamente pequena, tem de encontrar quem lhe compre a ideia e se disponha a fabricar e comercializar o produto. E o preço será sempre determinante. Em Portugal, o Estado só paga 170 bombas de insulina (que permitem a injeção contínua e pré-programada) por ano, para o País todo – e há pelo menos 10 mil doentes candidatos.