“Prosperidade partilhada” ou “liberdade face ao Estado”? Rui Tavares e João Cotrim Figueiredo podem estar em campos opostos quanto à questão sobre qual o melhor modelo económico para o futuro do País, mas a troca de argumentos – à esquerda e à direita –, esta quarta-feira, na SIC Notícias, permitiu dar aos eleitores a oportunidade para conhecer essas diferenças.
É esse, aliás, o objetivo de debates a que os portugueses têm assistido nas últimas duas semanas. E foi exatamente isso que, desta vez, aconteceu. No Oceano que separa Livre e Iniciativa Liberal, navegou cordialidade. Não deveria ser nota de destaque – mas o contraponto com outros exemplos assim o obriga.
O debate tocou em temas como alterações climáticas, educação, fiscalidade ou modelo económico. Do primeiro ao último segundo, tal como era esperado, as opiniões divergiram. Rui Tavares sublinhou o desejo de ver concretizado “um País de uma prosperidade partilhada” que “dê asas a quem tem sonhos e projetos”; João Cotrim Figueiredo afirmou, por seu lado, que não resta “outra opção” a Portugal “que não seja crescer economicamente”.
O ponto alto? O ataque cerrado de cada partido às duas propostas-bandeira – e que mais têm dado que falar – de Livre e Iniciativa Liberal: o rendimento básico incondicional (RBI) e a taxa única de IRS de 15% (a flat tax), respetivamente.
João Cotrim Figueiredo tentou “aquecer” a discussão. Levar para estúdio, uma vez mais, a proposta do Livre de “testar” o RBI, que classificou como “um género de mesada para todos os portugueses” que custaria ao Estado “salvar 20 TAPs por ano”. E, na sequência, procurando colar o Livre (e a esquerda) à ideia de uma visão “utópica da sociedade”.
Rui Tavares respondeu, atacando à flat tax proposta pela IL, que, diz, representaria “uma perda de dois mil milhões em receitas fiscais“. “Como propõe recuperar essas receitas?”, questionou o líder do Livre, considerando que o crescimento económico na sequência dessa medida não passa de uma “fezada” de Cotrim Figueiredo.
No final, um empate, mas ambos os líderes terão deixado um sorriso nos rostos dos respetivos apoiantes.
Economia: dois modelos, nada em comum
O modelo económico para o futuro do País é o (principal) ponto que distancia Livre e Iniciativa Liberal – e isso ficou bem visível do princípio ao fim do frente a frente entre Rui Tavares e João Cotrim Figueiredo. O papel do Estado voltou a ser discutido à esquerda e à direita, com posições opostas. Tavares puxou por uma política assente na resposta à emergência climática; Cotrim Figueiredo chegou a admitir que, há 30 anos, até poderia estar “mais perto” do Livre, mas insiste que, em 2022, a solução passa pela “liberdade face ao Estado.
RUI TAVARES
“Queremos um país de uma prosperidade partilhada”.
“Precisamos de uma economia mais especializada, da descarbonização, que olhe para a emergência climática como oportunidade de ter prosperidade partilhada”.
JOÃO COTRIM FIGUEIREDO
“Fiquei sem perceber onde o Livre se posiciona em relação ao crescimento económico. Preocupo-me que no programa do Livre não caiba essa ideia.
“Portugal está num estado de estagnação que não permite outra opção que não seja crescer economicamente”.
“Todos os desafios para os quais Portugal tem de se preparar precisam de recursos que não foram gerados”.
Emergência climática: prioridade ou não?
O primeiro momento “quente” surgiu com o tema da emergência climática. Rui Tavares acusou o opositor de “não gostar de prioridades estratégicas”, dizendo mesmo que este “nega” esta questão devido a “dogmatismos ideológicos”. Por seu lado, João Cotrim Figueiredo rejeitou ter dito que “não há uma emergência climática”, mas acusou a esquerda de utilizar a expressão para “fazer campanha contra a economia de mercado”.
RUI TAVARES
“Negar a necessidade de ter prioridades estratégicas faz-me lembrar o tipo de dogmatismo que encontrei muitas vezes, também na minha família política, a situação em que se negam os factos para que se adequem à ideologia”.
“A emergência climática em Portugal deve ser entendida como oportunidade para a transformação económica”.
JOÃO COTRIM FIGUEIREDO
“A verdadeira emergência é a da estagnação”.
“Não disse que não há uma emergência climática, disse que não gosto da expressão porque em emergência tendemos a aceitar todas as soluções (…) A noção de alarme não é boa conselheira”.
“A esquerda usa noção de emergência e de alarme para fazer campanha contra economia de mercado”.
“Só fazendo a economia crescer é possível dar resposta aos problemas das questões climáticas”.
O preço de uma ideia-chave
Foi o ponto alto do debate, embora, neste caso, não se tratasse de defender qualquer proposta – pelo contrário, cada um dos intervenientes tentou desmerecer a bandeira com que o opositor mais tem dado nas vistas nesta pré-campanha… e, sobretudo, destacar os custos de cada uma delas. Para cima da mesa, regressaram as propostas de RBI do Livre e da flat tax da IL.
Rui Tavares fez contas à proposta da IL e afirmou que a taxação de IRS a 15% representaria a perda de dois mil milhões de euros de receitas fiscais e que recuperá-los, através do crescimento económico, é, neste momento, apenas “uma fezada”. João Cotrim Figueiredo respondeu, também foi à calculadora, e afirmou que o “teste” que o Livre propõe, com a introdução do RBI em Portugal, representaria “salvar 20 TAPs por ano”. “Portugal não é um País para testes”, disse o líder da IL, considerando que o Livre não faz mais do que idealizar uma “sociedade utópica”.
RUI TAVARES
“A IL fala de prescindir de 2 mil milhões de recursos de coleta fiscal com a taxa única de imposto,. O Livre quer, isso sim, recuperar 10 mil milhões de euros que Portugal perde em evasão fiscal todos os anos”.
“RBI custa um centésimo”.
“O que a IL tem é uma fezada [ao defender que a descida do IRS vai contribuir para o crescimento económico”.
JOÃO COTRIM FIGUEIREDO
“O Rendimento Básico Incondicional ou é básico ou incondicional. 500 euros por mês parece-lhe razoável? Se cada português recebesse 500€ por mês, a conta anual que equivale a salvar 20 vezes a TAP por ano. Salvar só uma TAP seria 25€ por mês”.
“Portugal não é um País para testes. Se o Livre gosta de ter um programa de testes, nós gostamos de coisas testadas”.