Numa carta dirigida à Provedora de Justiça, o Volt Portugal pediu a abertura de um processo junto do Tribunal Constitucional “para a extinção do partido ADN [Alternativa Democrática Nacional]”. Assinado pelo co-líder Duarte Costa (a par de Ana Carvalho), o documento solicita ainda uma providência cautelar para impedir o ADN de participar nas eleições europeias de 9 de junho – nas quais concorre com a psicóloga e comentadora Joana Amaral Dias como cabeça de lista.
O Volt Portugal pede ainda “a requisição” da subvenção pública de 340 mil euros atribuída ao partido liderado por Bruno Fialho, correspondente aos resultados alcançados nas legislativas de 10 março.
“O Volt Portugal nasceu para acabar com todos os extremismos e populismos na Europa”, diz Duarte Costa
Segundo o Volt Portugal, o ADN incumpriu a Lei n.° 64/78, que proíbe organizações fascistas em Portugal. Em causa, estão várias posições assumidas pelo partido, ao longo destes últimos anos, mas o “momento decisivo” surgiu na sequência das declarações do presidente Bruno Fialho que, num podcast, sugeriu enviar “pedófilos”, “criminosos estrangeiros”, “deputados”, “Mamadou Ba” e “todos da extrema-esquerda” para o Tarrafal, referindo-se ao campo de concentração criado pelo Estado Novo, que funcionou entre 1936 e 1974, na ilha de Santiago, em Cabo Verde.
À VISÃO, Duarte Costa justifica esta ação com o facto de o Volt Portugal “ter nascido para acabar com todo o tipo de extremismos e populismos na Europa”. Este passo é visto pelo dirigente como “parte do trabalho do partido em Portugal”. “Defendemos a liberdade de expressão, mas os limites dessa liberdade estão definidos pela lei. Consultámos juristas, e concluímos que esses limites foram claramente ultrapassados e que era hora de avançar com esta ação. O Volt Portugal apenas acionou o Estado de Direito”, completa.
Duarte Costa afirma “ter boas perspetivas” quanto a este processo, recordando que existe em Portugal “um precedente”: em 1992, a Procuradoria-Geral da República considerou ter provas suficientes para solicitar ao Tribunal Constitucional a extinção do Movimento de Ação Nacional (MAN), por este “defender ideias fascistas e racistas e procurar o derrube da democracia, características inconstitucionais”. O grupo de extrema-direita acabaria por se autodissolver e os juízes do Palácio Ratton não chegaram a pronunciar-se sobre o caso.
“Os fascistas são eles”, acusa Bruno Fialho
Contactado pela VISÃO, Bruno Fialho “lamenta que as pessoas do Volt Portugal não respeitem a liberdade de expressão do cidadão”, defendendo que o que foi dito no podcast foi “apenas humor, à volta de uma situação que já pertence ao passado, que não ofendeu ninguém, muito menos tentou equiparar situações do passado e do presente”. “Hoje, estas pessoas tentariam proibir uma série como ‘Alô, Alô’ [sitcom britânica transmitida entre 1982 e 1992, que satirizava a ocupação de França pela Alemanha nazi]. Quem estava naquele podcast era o Bruno Fialho-cidadão, não o ADN, não o Bruno Fialho-político”, sublinha.
O presidente do ADN considera que a queixa apresentada “é apenas uma tentativa desesperada de [o Volt Portugal] aparecer”. “Estamos a falar de um partido que não tem qualquer expressão em Portugal, que é patrocinado por globalistas que querem destruir a liberdade de expressão e tudo aquilo que conhecemos em Portugal e na Europa. Os fascistas são eles!”, acusa. “Percebo o que se está a passar… O Volt Portugal quer apenas ‘surfar a onda’ porque sabe que, hoje, o ADN está na liga dos grandes”, acrescenta.
Recorde-se que o ADN ocupou a vaga do Partido Democrático Republicano (PDR), fundado em 2014 pelo antigo bastonário da Ordem dos Advogados e ex-eurodeputado António Marinho e Pinto. Renomeado como ADN em 2021, o partido presidido por Bruno Fialho tem-se destacado adotando posições antissistema e contracorrente, com destaque para a contestação contra o processo de vacinação para a Covid-19. O ADN alega estar a verificar-se em todo o mundo “uma mortalidade excessiva” associada a estas vacinas. O partido tem vindo a assumir posições associadas às políticas da direita radical populistas, nomeadamente em temas como a imigração e a segurança.
Grande surpresa nas últimas legislativas, o ADN somou mais de 102 mil votos, dez vezes mais do que nas eleições anteriores (tinha conseguido apenas 10 911 votos em 2022). A Aliança Democrática (AD) chegou a queixar-se de confusão das siglas, que poderia justificar este crescimento, mas esta versão foi sempre rejeitada por Bruno Fialho. Certo, é que o resultado valeu uma subvenção pública ao partido de quase 340 mil euros.