Marcelo Rebelo de Sousa dirigiu-se esta quinta-feira aos portugueses para transmitir uma mensagem de otimismo. Mesmo renovando, como já se sabia, o estado de emergência – que vigorará até 2 de maio -, o Presidente da República apontou para o tão propalado regresso gradual à normalidade. Na mensagem, proferida a partir do Palácio de Belém, passou a bola ao Governo, ou seja, disse que a manutenção da emergência “dá tempo e espaço” para que este prepare “critérios para a abertura gradual da sociedade e da economia”.
O Chefe do Estado sublinhou que essa recuperação deverá ter por base fatores de ponderação concretos, como o tempo, os territórios e os setores de atividade a que o levantamento ou ajustamento das medidas se apliquem, com o intuito de “gerar segurança e confiança” aos portugueses. No fundo, notou, para que “possam sair de casa” e reatem “paulatinamente a sua vida” sem correrem o risco de “dar de passos precipitados e contraproducentes”.
As outras duas razões invocadas para manter o País sob inúmeras restrições no combate ao coronavírus foram de ordem mais imediata. Por um lado, o facto de ainda haver muitio por fazer nos lares e, por outro, a salvaguarda da capacidade de resposta do Serviço Nacional de Saúde (SNS).
“A nossa tarefa nos lares não dispensou um minuto, mas precisa de mais algum tempo. Detetar, isolar, despistar é importante não só para quem lá vive, mas também para quem está cá fora. Consolidar essa tarefa, em clima de contenção, ainda é imperativo”, explicou, por um lado.
“Somos o quarto país da Europa que mais testa por milhão de habitantes e, ainda assim, o número total de contaminados fica abaixo dos 20 mil ou 30 mil que admitia há uma quinzena, mas temos de continuar a estabilizar o número diário de internamentos em geral e de internamentos nos cuidados intensivos em especial”, de modo a que, realçou, se assegure que o SNS consiga “responder à evolução do surto” num quadro em que os contactos sociais aumentem professivamente. Marcelo não quer que eventuais descuidos provoquem “recuos” ou “recaídas” por falta de vigilância ou monitorização da propagação do coronavírus.
Ciente de que a retórica conta, o Presidente ensaiou uma viragem cautelosa da página. Ficou subjacente, na mensagem de aproximadamente 13 minutos, que o pior já terá passado. Embora, como repetiu, abril – sem cedências a “facilidades tentadoras” – seja a chave para ganhar maio e os meses subsequentes, Marcelo quer dar o salto para “a tal terceira fase”, a da paulatina recuperação da economia e da normalização do funcionamento da sociedade (para as quais o decreto presidencial abre, de resto, caminho). “Tudo dependerá do que conseguirmos alcançar até ao final de abril e do bom senso com que gerirmos uma abertura sedutora, mas complexa”, advertiu. O próximo mês, esse, foi definido como “a ponte entre o dever e a esperança”.
Socorrendo-se do que a imprensa internacional tem dito e escrito sobre o “milagre” português nesta luta sanitária, Marcelo foi salomónico. Repartiu o mérito pelo “sacríficio” dos portugueses, pelos responsáveis políticos – do presidente da Assembleia da República, ao Governo, passando pela oposição, sindicatos e confederações patronais -, pelo aconselhamento dado pelos especialistas e garantiu que o espírito de unidade nacional “ficará para a História”. Acrescentou que a vitória parcial é também “fruto” do esforço daqueles que “há mês e meio ou mais demonstram que não tem preço salvar vidas ou ajudar os que as vidas salvam e garantir o básico do nosso quotidiano”.
“Se isto é um milagre, nós, povo português, somos um milagre vivo há quase nove séculos. Se isto é um milagre, o milagre chama-se Portugal”, rematou, já depois de deixar uma palavra de apreço e incentivo aos mais idosos – que, assegurou, “ninguém quer encerrar num gueto” -, aos jovens dos quais “poucos” têm falado e aos autarcas. Sobre estes últimos, atirou, será o “primeiro a testemunhar” abonatoriamente sobre o “papel de proximidade” que desempenharam. Mesmo que outros, que não identificou, “a pretexto de uma visão estreita do Direito ou da Justiça”, questionem as “decisões dramáticas” que foram forçados a tomar no período mais crítico da crise.