Três partes, 52 capítulos, cerca de 600 páginas, essencialmente um alvo: José Sócrates. O antigo Presidente da República Cavaco Silva lança esta quinta-feira no Centro Cultural de Belém o seu livro Quinta-feira e Outros Dias, com apresentação de Manuel Braga da Cruz, ex-reitor da Universidade Católica.
A VISÃO desta semana apresenta-lhe em exclusivo excertos do prefácio, escrito pelo próprio. Um texto que deixa já nota daquilo que se pode encontrar na obra: um retrato “fidedigno” e com “um nível de detalhe inédito na nossa democracia” sobre os tempos em que foi Presidente da República com José Sócrates como primeiro-ministro, ou seja, de 2006 a 2011. As relações com Passos Coelho e os momentos conturbados até à indigitação de António Costa
ficam prometidos para um próximo volume.
O livro que é lançado hoje traz muitas revelações sobre temas que, a seu tempo, fizeram correr muita tinta e deixaram muitas dúvidas no ar, como a avaliação dos professores, a escolha de Pinto Monteiro para Procurador-
Geral da República ou o negócio de venda da Vivo.
O escândalo das escutas em Belém, em plena campanha para as legislativas de 2009, é um dos que suscita mais curiosidade. “As intrigas políticas do verão de 2009”, assim se chama o capítulo que promete explicar aos portugueses o episódio que mudou a “coabitação” entre primeiro-ministro e Presidente. Uma relação que Cavaco explica ao detalhe, explicando num capítulo que o Expresso divulgou no último sábado, que Sócrates ia sempre “preparado para as reuniões” e geralmente com “boas notícias”, mas que “demorou pouco tempo” até que o Presidente percebesse que “frequentemente, as palavras não se conformavam à realidade dos factos” e passasse a “olhar desconfiado para
as ‘boas notícias’ do primeiro-ministro”. Cavaco aproveita este primeiro volume das suas memórias de Presidente da República também para deixar clara a
interpretação que tem e sempre teve da função que ocupou. Interpretação essa que se traduziu sempre numa postura bem distinta daquela que hoje conhecemos ao sucessor Marcelo Rebelo de Sousa. E Cavaco dá conta disso: “os 25 anos de forte exposição” enquanto ministro das Finanças e depois primeiro-ministro servem para explicar o “distanciamento relativamente à comunicação social, a reserva da Presidência da República nas relações com a imprensa e a minha recusa da política-espetáculo, tão cara a muitos políticos por proporcionar notícias e fotografias, mas que, em minha opinião, não traz qualquer benefício ao País”. É caso para dizer que qualquer semelhança com as selfies de Marcelo pode não ser pura coincidência.