Era um jovem político em ascensão no PS quando, em 1997, apresentou ao Conselho Económico e Social (CES) aquela que se tornaria uma das principais bandeiras dos governos de Guterres – o Rendimento Mínimo Garantido. Então secretário de Estado, Paulo Pedroso, constituía com Ferro Rodrigues, ministro do Trabalho e da Solidariedade, a dupla que tutelava a área social. Hoje, no entanto, acha que o PS tem de aceitar que chegámos, nesta área, “ao fim de um ciclo”. E explica melhor: “O conjunto da despesa com políticas sociais não pode continuar a crescer ao mesmo ritmo que antes.”
Docente no ISCTE, mantém-se afastado da política desde que, em 2009, tentou ganhar para o PS a Câmara de Almada. Agora, Pedroso é uma das personalidades, quase todas ex-governantes, a quem António Costa pediu ajuda para o programa do PS, que prometeu apresentar a 6 de junho. Mas, por enquanto, trata-se apenas de uma convocação. Só serão chamados a pronunciar-se lá mais para diante, quando o Gabinete de ?Estudos, dirigido por João Tiago Silveira, tiver pronto um esboço do programa. Aberta a independentes, a nova direção do Gabinete está a incluir os contributos apresentados pelo Laboratório de Ideias e Propostas para Portugal e pela Convenção Novo Rumo. ?A primeira reunião dos “notáveis” com a direção ainda não está sequer marcada.
Dinamizar a contratação coletiva
“Tem de haver uma mudança de abordagem do PS nesta matéria. Fizemos a manta social crescer para todos os lados. Agora há que repensar e escolher para que lados vamos esticá-la”, diz Pedroso. É uma imagem para ilustrar uma das traves em que, segundo ele, deverá assentar o programa para as legislativas, “uma recalibragem nas políticas sociais”. Se, no conjunto, esta despesa não pode crescer muito em percentagem do PIB, há que definir as medidas em que se aposta. “O PS não deve cair na armadilha de pensar que temos de voltar aos anos 90.”
Por ele, acha que a primeira prioridade deve ser o combate à precariedade social das famílias jovens. “Nos últimos 30 anos, o grupo etário mais pobre deixou de ser o dos idosos para passar a ser o das crianças. Por isso, precisamos de instrumentos que defendam a situação das famílias jovens.”
Pedroso, que mais tarde substituiria Ferro Rodrigues como ministro do Trabalho e da Solidariedade, entende que a segunda prioridade do PS nesta área deve ser “a dinamização” da contratação coletiva. Agora, diz, “há que reequilibrar uma correlação de forças, que foi muito alterada por este ?Governo em desfavor dos trabalhadores.”
Falta política externa
Ana Maria Bettencourt, outra das convocadas e uma das mais reputadas personalidades do PS em matéria de Educação, responsabiliza a atual maioria PSD/CDS pela degradação de alguns indicadores, sobretudo o insucesso escolar no ensino básico. Agora, pretende que PS retome uma medida que, segundo ela, merecia bastante consenso?no Conselho Nacional de Educação, a que presidiu de 2009 a 2013 – o projeto Educação para Todos: “Cada pessoa é única e temos de criar condições para que desenvolva os seus talentos, incluindo as crianças com necessidades educativas especiais.”
Por ela, defende o regresso de outra das bandeiras do PS, o Programa Novas Oportunidades, destinado à requalificação de adultos. Ainda que não necessariamente nos mesmos moldes. “Chamem-lhe Novas Oportunidades ou outra coisa qualquer, até porque o sistema precisava de alguns retoques. Mas não podemos continuar a ter uma mão de obra dos adultos desqualificada.”
A sustentabilidade do Ensino Superior e da Ciência são outras das apostas que esta docente quer ver contemplada: “Temos uma geração extraordinária de jovens cientistas e laboratórios de ponta. Devemos assegurar-lhes os recursos para que continuem o seu trabalho. Há opções que têm de fazer-se pelo País.”
Francisco Seixas da Costa, ex-secretário de Estado dos Assuntos Europeus, no segundo Governo de Guterres, lamenta que atualmente “a opção do Governo em matéria de política externa seja não ter opção”. Portugal, diz, tem de deixar claro o que defende na UE em relação à Rússia. Ou o que fará se algum país pedir a adesão da Ucrânia à NATO.
Com uma carreira diplomática de 40 anos, Seixas da Costa defende que um dos eixos da nossa política externa deve ser a internacionalização da economia portuguesa, que deverá ter como suporte a rede de embaixadas. Assim defende o regresso da Agência para o Investimento e Comércio Externo de Portugal (AICEP) à tutela dos Negócios Estrangeiros, “acabando com a bizarra situação atual, apenas fruto da moldagem do Estado aos caprichos políticos do dr. Paulo Portas”.
Macro quê?
Em outubro, no mesmo dia em que informou que o PS votaria contra o Orçamento do Estado para 2015, António Costa reuniu-se com uma vintena de economistas numa sala da Assembleia da República. Em cima da mesa estava a situação económica e financeira do País.
Cerca de um mês depois, aquando da apresentação da sua moção de estratégia ao Congresso do PS, Costa anunciou que iria encomendar, a uma equipa, a “elaboração do quadro macroeconómico prospetivo que balizará” a preparação “do programa do Governo”.
Assim, convidou 11 economistas para traçar esse cenário macroeconómico. O grupo, que é coordenado por Mário Centeno (diretor-adjunto do Gabinete de Estudos do Banco de Portugal), inclui Vieira da Silva (ex-ministro e atual deputado), Paulo Trigo Pereira (professor no ISEG), Francisca Guedes de Oliveira (professora na Católica do Porto), Fernando Rocha Andrade (dirigente do PS e professor na Universidade de Coimbra) Elisa Ferreira (eurodeputada), Vítor Escária (professor no ISEG), Sérgio Ávila (vice-presidente do Governo Regional dos Açores), Manuel Caldeira Cabral (professor na Universidade do Minho), João Nuno Mendes (ex-secretário de Estado) e João Leão (professor no ISCTE).
Mas, afinal, o que é isto de cenário macroeconómico? “É um exercício que identifica as evoluções mais prováveis da economia portuguesa, como a riqueza, o PIB ou os resultados orçamentais”, explica Vieira da Silva. Ou seja, para definir medidas políticas é necessário, primeiro, saber quais são as variáveis orçamentais. “Não é um exercício académico é mais proativo no sentido em que, se optarmos por esta ou outra medida, temos de saber quais são as margens de intervenção”, continua o deputado socialista.
Não é excel, estúpido!
E este não é um estudo que possa ser fechado em definitivo, dado que as variáveis oscilam tanto para baixo como para cima. O preço do barril de petróleo, por exemplo, está hoje nos 45 dólares, mas daqui a uns meses pode estar noutro patamar. Outro exemplo, o valor do euro em relação ao dólar está a baixar devido à injeção de capital do Banco Central Europeu.
Assim, não é de um mero exercício contabilístico numa folha de excel que se trata, do género tirar daqui para pôr ali, mas uma forma de balizar o impacto das opções tomadas. Manuel Caldeira Cabral diz que o “atual Governo não teve em conta estes efeitos. Fez cortes imaginando que iriam gerar poupança, mas que, afinal, tiveram efeitos macroeconómicos negativos”.
O que estes 11 economistas, que se têm encontrado com regularidade, têm feito é simular uma política económica diferente da atual com o objetivo de melhorar o crescimento.
Os resultados desta análise, que se prevê estar pronta no fim deste mês, vai traçar as fronteiras do futuro programa de Governo do PS e indicará “possibilidades e linhas de orientação”, refere Vieira da Silva, “não será um cardápio de medidas”. Muito embora as simulações estejam a ser realizadas com dados concretos, como algumas medidas já anunciadas pelo líder do PS (baixar o IVA da restauração para 13% ou repor integralmente os salários dos funcionário públicos) e outras que estão em fase de avaliação no Gabinete de Estudos do PS.