Estas posições ficaram patentes nos discursos proferidos pelo socialista Ramos Preto, pela bloquista Cecília Honório e pelo comunista João Ferreira na conferência “Libertar Portugal da austeridade”, dinamizada pelo ex-Presidente da República Mário Soares, que encheu a Aula Magna de Lisboa.Com várias figuras do PS na plateia, como o ex-ministro Pedro Silva Pereira e o ex-secretário-geral Ferro Rodrigues, o deputado socialista Ramos Preto considerou que o Governo se serviu do memorando e usou o seu texto “fora do contexto em que foi assinado como um pretexto para ir além da ‘troika’ sem qualquer embaraço, violando o seu contrato eleitoral”.
“O Governo e a ‘troika’ decidiram não ouvir o PS e os resultados estão à vista: destruição de 458 mil postos de trabalho, dívida pública a atingir 127% do Produto Interno Bruto, défice em clara derrapagem, espiral recessiva e dificuldade em cumprir os compromissos junto dos credores”, referiu Ramos Preto.
O socialista defendeu que há um caminho alternativo, tendo como base um novo governo legitimado por eleições e “a renegociação das condições de ajustamento, que dê sentido ao esforço nacional dos portugueses”.
“Este Governo viola as suas promessas eleitorais e executa um programa para o qual não tem mandato. Deixou de ter legitimidade de exercício e só há uma maneira de reconduzir o país: ouvir o povo através de eleições livres”, salientou.
Em representação do Bloco de Esquerda, a deputada Cecília Honório defendeu que o “fim da ditadura dos credores” só acabará com uma solução à esquerda.
“A chantagem da dívida exige convergências populares. Qualquer proposta de manutenção do memorando produzirá um governo ainda pior do que o atual”, disse, num recado dirigido a alguns setores do PS.
Para Cecília Honório, só um governo de esquerda será capaz de desenhar um novo mapa político.
“O que foi roubado terá de ser devolvido, a proteção legal destruída tem de ser recuperada”, advogou a dirigente do Bloco de Esquerda, recebendo palmas da plateia.
Mais clara foi a demarcação do eurodeputado comunista João Ferreira face à linha política assumida pela atual direção do PS.
“No atual contexto, a alternativa passa, tem de passar, por uma política patriótica de esquerda e por um governo que a concretize. Uma política patriótica que recuse a ideia atávica de que a solução para os nossos problemas sempre dependerá de terceiros, ou pior, a ideia de que essa solução passa por aprofundar os caminhos que nos conduziram a muitos desses problemas”, disse, numa crítica à via federalista europeia.
Para João Ferreira, pelo contrário, a alternativa deve “recuperar imprescindíveis instrumentos de soberania económica, monetária e orçamental, propondo vencer atrasos, bloqueios e défices crónicos do país”.
“Uma política patriótica e um Governo patriótico que rejeite de imediato o programa da ‘troika’, subscrito por PS, PSD e CDS, e que encete uma renegociação da dívida pública, nos seus montantes, juros, prazos e condições de pagamento”, apontou ainda o responsável do PCP.
“Vim de Coimbra para dizer basta”, declarou a líder da associação de Aposentados Pensionistas e Reformistas (APRE), Maria do Rosário Gama, independente, que discursou imediatamente a seguir ao ex-Presidente da República Mário Soares.
Maria do Rosário Gama acusou o Governo de ser subserviente em relação aos “desejos” da ‘troika’ e de permitir que o poder financeiro imponha as suas regras, concentrando o capital.
“Que jeito deu ao Governo o memorando da ‘troika’, que forma hábil de cumprir desejos íntimos e de implementar um programa neoliberal. Nós reformados estamos a ser alvo de uma ofensiva mesquinha, somos considerados um fardo social, somos os não utilitários, sem direitos para além dos mínimos necessários à sobrevivência”, afirmou a apoiante das candidaturas presidenciais de Manuel Alegre.