O Fado, nascido de circunstâncias populares da Lisboa do século XIX, fez parte de todo um enredo de “convívio e lazer” marcado pela vulgaridade “espontânea” da vida diária da época. Cantado nas “hortas, tabernas, nas ruas e vielas (…)”, o Fado foi em tempos associado “a contextos sociais pautados pela marginalidade e transgressão”.
Segundo o Museu do Fado, esta associação às esferas mais marginais da sociedade da época “ditar-lhe-ia uma vincada rejeição pela parte da intelectualidade portuguesa”, algo que já não vemos acontecer hoje.
“Ultrapassando as barreiras da cultura e da língua, com Amália o Fado consagrar-se-ia definitivamente como um ícone da cultura nacional. Durante décadas e até à data da sua morte, em 1999, caberia a Amália Rodrigues, o protagonismo a nível nacional e internacional”.
Hoje, cabe à fadista Mariza o papel de embaixadora da candidatura do Fado a Património Imaterial da Humanidade, que o VI Comité Inter-Governamental da UNESCO analisará a partir de hoje e até dia 27 (domingo), em Bali, na Indonésia e durante a qual se decidirão as candidaturas distinguidas.
Nomeada pelo ex-presidente da Câmara de Lisboa, Pedro Santana Lopes, Mariza defendeu que “um povo só é conhecido pela sua cultura” e, caso esta distinção seja outorgada ao Fado, “talvez nós portugueses possamos ter um orgulho maior naquilo que somos”.
O comité é presidido pelo embaixador da Indonésia junto da UNESCO (ONU para a Ciência, Educação e Cultura), Aman Wirakartakusumah, e é constituído por 24 países, entre eles, Espanha, Quénia, Japão e Venezuela.
“Apresentada pela CM de Lisboa através da EGEAC/Museu do Fado, em de Junho de 2010, a candidatura do Fado é agora distinguida num grupo restrito de 7 candidaturas consideradas “exemplares” pela UNESCO, do ponto de vista da sua concepção, preparação, apresentação e argumentação” segundo revela o site do Museu do Fado.
A delegação portuguesa deverá chegar quinta-feira a Bali, sendo composta pelo presidente cessante da Comissão nacional da UNESCO, embaixador Fernando Andresen Guimarães, o presidente da Comissão Científica da candidatura, Rui Vieira Nery, a diretora do Museu do Fado, Sara Pereira, e ainda o presidente da Câmara de Lisboa, António Costa e a vereadora da Cultura, Catarina Vaz Pinto.
O Fado compete com outras 6 candidaturas nesta distinção da UNESCO.
Lado a lado com Portugal nesta ‘corrida’ está a Colômbia que apresenta o Conhecimento Tradicional dos Xamãs (jaguares) de Yurupari, a Croácia candidata-se com Nijemo Kolo, uma dança de roda silenciosa da região da Dalmácia, o Chipre propôs-se à competição com Tsiattista, uma forma particular de recitar poesia popular tradicional do país.
A República Checa, por sua vez, candidata-se com um género de procissão chamada “Passeio dos Reis”, integrada no festival com o mesmo nome. O México apresenta Mariachi, música de cordas, letra e trompete originária da região de Jalisco, e o Peru lança-se nesta distinção com a Peregrinação que é realizada ao Santuário do Lord de Qoyllurit’i, uma das celebrações religiosas mais importantes no Peru, que reúne milhares de fiéis de vários pontos do país.
A diretora do Museu do Fado, Sara Pereira, destaca a importância da existência de um plano de salvaguarda, que considerou “o coração da candidatura” a Património Imaterial da Humanidade, para se chegar à fase final de apreciação pela UNESCO.
Em declarações à Lusa, a propósito da reunião de peritos da organização das Nações Unidas para a Educação, Ciência e Cultura, Sara Pereira afirma que este plano é composto por cinco eixos.
O primeiro, destaca, é criação de uma rede de arquivos que integra todas as instituições com objetivos de cooperação estratégica de preservação e fruição do Fado.