O primeiro-ministro devia abster-se de reivindicar certas vitórias – porque descredibiliza tudo aquilo em que toca. Se hoje disser ao País que a Terra é redonda e gira em torno do Sol duvido que alguém acredite. Pelo contrário, gera uma horda de seguidores do geocentrismo e é provável que na semana seguinte ele próprio se filie no grupo dos que defendem que o Sol gira em torno da Terra. Por uma questão de higiene nacional, devia calar-se e eclipsar-se de cada vez que algo corre bem.Ao colar-se à divulgação dos resultados do PISA (Programme for International Student Assessment), o estudo da OCDE que de três em três anos avalia os conhecimentos dos alunos com 15 anos, Sócrates manchou irremediavelmente as boas notícias. Sim, porque os resultados do estudo são, efetivamente, uma boa notícia.
Nos três PISAS anteriores, Portugal surgia sempre abaixo da média dos países da OCDE e vergonhosamente qualificado. Pior: durante uma década não se vislumbraram melhorias. Os resultados do estudo realizado em 2009, respeitante a alunos nascidos em 1994, mostram uma evolução francamente positiva nas três áreas analisadas, a saber, Matemática, Língua Materna e Ciências.
O que interessa agora saber é a quem atribuir os créditos – para caucionar as políticas certas. E nesta equação os contributos das políticas de Maria de Lurdes Rodrigues (MLR) são cruciais. Se é certo que as mudanças introduzidas por MLR no primeiro ciclo ainda não se fazem sentir – escola a tempo inteiro, reforço da formação de professores de Matemática, ensino do Inglês – outras foram essenciais.
A primeira terá sido o esquema de substituição de professores, que diminuiu a assustadora frequência dos “furos”. A segunda, o aumento das prestações sociais. A terceira, a estabilização do corpo docente, com o fim dos famigerados mini-concursos. A quarta, o lançamento do Plano Nacional de Leitura. O quinto, o combate com mais meios e menos centralismo ao insucesso escolar. Outras haveria, mas a lista seria longa.Os contributos de David Justino (que se bateu pela introdução de exames e pela divulgação dos seus resultados, dando origem aos rankings) e de Marçal Grilo (que se empenhou na criação de um sistema universal do pré-escolar) não são de desprezar.
Quanto a este património, note-se, MLR valorizou-o em vez de o desprezar, como tantas vezes acontece com governantes recém-chegados na ânsia de “mudar o rumo”. Este legado ainda dará frutos? Estou certo de que sim. Só é uma pena que Sócrates se aproprie deste património, que é menos dele do que da ministra que afastou para salvar a cara em relação aos professores. Que estes estavam incomodados com um sistema de avaliação que macaquearam e deturparam até à exaustão, descredibilizando-o, já o sabemos. Que o primeiro-ministro se tenha vergado ao oportunismo eleitoral de 2009 (que outros e muitos prejuízos nos trouxeram…), só se desculpa porque, afinal, o Sol gira em torno da Terra.
NOTA: No afã de fazer depressa, fiz mal. De facto, a extinção dos miniconcursos e o lançamento do Plano Nacional de Leitura foram realizados pelo ministro David Justino – Maria de Lurdes Rodrigues manteve-os e potenciou-os. Pelo erro peço desculpa aos visados e aos leitores.