No início deste século, o então Presidente dos EUA, George W. Bush, lembrou-se de classificar o seu homólogo da Bielorrússia como “o último ditador da Europa”. A 23 de maio, Alexander Lukashenko confirmou esse título e voltou a demonstar que se arroga o direito de fazer o que lhe dá na gana. Ao ordenar o sequestro de um avião comercial que unia duas capitais europeias (Atenas e Vilnius) e assim deter um seu opositor (o jornalista Roman Protasevich), o líder do regime de Minsk quis mostrar aos seus críticos que eles não se podem sentir seguros em parte alguma do mundo, como sublinharam Gideon Rachman, no Financial Times, e Alain Frachon, no Le Monde. A repressão transnacional é um fenómeno que tem vindo a agravar-se nos últimos anos e um relatório da Freedom House, publicado em fevereiro, relata com minúcia o que fazem a China, o Irão e os demais regimes autoritários. No entanto, os raptos e as detenções à margem da lei estão longe de ser um exclusivo das ditaduras, como se pode constatar nos casos paradigmáticos que se contam de seguida.
Jornalista pendurado na forca
A 12 de janeiro, o New York Times publicou um artigo de opinião assinado por Arash Azizi, historiador e investigador na Universidade de Nova Iorque, em que o Irão é acusado de ter assassinado 360 pessoas em diversos países, desde a instauração da república islâmica, em 1979. E sublinhava ainda o “rapto, a condenação e a execução” como expedientes usuais do regime de Teerão para silenciar opositores, dando como exemplo Ruhollah Zam. Enforcado em dezembro, na capital iraniana, a história deste jornalista é digna de um thriller político. Filho de uma família religiosa e influente, revoltou-se contra os aiatolas na sequência das eleições presidenciais de 2009, em que Mahmoud Ahmadinejad garantiu um segundo mandato, apesar das acusações de fraude e dos violentos protestos em que dezenas de pessoas perderam a vida. Tal como sucedeu então a perto de quatro mil dos seus compatriotas, Ruhollah Zam foi detido e condenado por atentar contra a ordem pública. Mal saiu da conhecida prisão de Evin, emigrou para França e iniciou uma nova carreira como ativista e profissional da informação. A sua plataforma Amad News, com quase milhão e meio de seguidores, passou a denunciar os frequentes escândalos de corrupção e abuso de poder no Irão, e ele tornou-se um alvo a abater. Em outubro de 2019, aceitou um convite para se deslocar ao Iraque, mas nunca se reuniu com quem desejava. Em Bagdad, com a colaboração das autoridades locais, a Guarda Revolucionária iraniana pegou nele e levou-o de volta ao seu país, para responder por uma dúzia de crimes graves, a começar por espionagem. O seu destino, apesar das denúncias da Amnistia Internacional, dos Repórteres Sem Fronteiras e de outras ONG, estava traçado. Jamshid Sharmahd (sequestrado no Dubai, em agosto do ano passado) e Habib Asyud (também raptado, mas na Turquia, em outubro) podem ser os próximos.