A notícia foi avançada pela imprensa moçambicana, e confirma aquilo que têm dito as várias Organizações Não Governamentais ainda no terreno, nove meses depois de o Idai ter tocado a costa da região central de Moçambique. Há pelo menos 260 alunos que abandonaram a escola na província de Manica, depois do desastre natural. “Estamos a trabalhar com os líderes comunitários e com projetos e parceiros de cooperação da área da Educação para ver se podem ir de casa em casa a perseguir os alunos”, referia recentemente Albino Chimoio, da direção distrital de Educação e Desenvolvimento Humano citado pela VOA, uma organização internacional de notícias multimédia, sedeada nos EUA e com presença em África há várias décadas.
No mesmo sentido, uma investigação da ONG “Educação Não Pode Esperar” refere que o ciclone traumatizou as crianças, nota a mesma peça. “Estamos a trabalhar na sensibilização, para levarmos a criança de volta à escola” disse Martinho Queface, oficial de apoio psicossocial daquela organização, que apoia o sector da Educação em Dombe, a zona mais devastada pelo ciclone em Manica.
Recorde-se que o Idai é considerado o prior desastre natural da História d Moçambique, tendo afetado mais de um milhão de pessoas. O número de óbitos nunca foi oficialmente fechado, mas suspeita-se que tenha ultrapassado o milhar. Crianças ficaram durante dias dentro de água ou abrigadas em ramos de árvores e telhados, sob intensas chuvas e ventos. Muitas delas perderam os pais ou toda a família durante a tragédia, e a fome tem tomado conta da região desde então. Alguns dos alunos nunca conseguiram regressar à sua casa, e outras tiveram que abandonar as comunidades onde viviam porque ou perderam a família, a casa ou ambas.
A VISÃO tem, ao longo dos últimos meses, dado conta de algumas das principais dificuldades que se têm sentido nas regiões afetadas ao longo dos últimos meses, onde muito foi feito, mas onde ainda falta fazer tudo. A fome tem sido uma das principais preocupações, uma vez que os terrenos não recuperaram a tempo de ser possível fazer qualquer sementeira, e com a chegada da época das chuvas, só em março ou abril será possível voltar a pensar em plantar alguma coisa.
Num país – e numa região – que depende sobretudo da agricultura de subsistência, esta questão tem-se tornado fundamental. Várias ONG estão a distribuir refeições nas escolas para promover o regresso das crianças à escola, e tentar dar-lhes uma espécie de regresso à normalidade, enquanto há relatos de diretores de escolas que tentam cultivar os próprios alimentos para garantir que os seus alunos – que muitas vezes têm que caminhar quilómetros para assistir às aulas – continuam a marcar presença.
Países em desenvolvimento são os mais penalizados
Recentemente, uma nota do Fundo Monetário Internacional dava conta de que os países em vias de desenvolvimento enfrentam significativas dificuldades com o agravar das alterações climáticas, que os têm atingido de uma forma bastante gravosa.
Em países como Moçambique as autoridades tentam, na medida das suas parcas possibilidades, adotar uma “abordagem de reconstrução e melhoramento” de estradas, trilhos e portos; restauração dos meios de subsistência agrícolas e promoção da resiliência a choques climáticos, desastres e eventos climáticos extremos como o Idai e o Kenneth, que num mês atingiram brutalmente a antiga colónia portuguesa. Essa abordagem está “a tornar-se no nvo normal”; referia Eyerusalem Fasika, gerente nacional interino do Banco Africano de Desenvolvimento em Lilongwe, Malawi, citado nessa nota do FMI.
Segundo o Programa das Nações Unidas para o Meio Ambiente, os custos que as economias em desenvolvimento deverão suportar para se conseguirem adaptar às alterações climáticas podem variar entre os 56 mil milhões e os 300 mil milhões de dólares – duas a três vezes o valor do financiamento atualmente disponível e não tendo em conta os custos humanos.
O dinheiro que nunca chega
A constante falta de verbas – estima-se que Moçambique precise ainda de 3 mil milhões de dólares só para recuperar dos ciclones – está a fazer com que parte da vida siga sem estas condições de melhoramento – e em alguns lugares, sem condições mínimas.
Nove meses depois do Idai há vários relatos de missas celebradas em Igrejas sem telhado, aulas em escolas cujo teto é feito de lona que foi deixada pelas primeiras ONG a chegar ao terreno em março, casas feitas de restos que sobraram da destruição dos ciclones. Tudo sinais de que se vier uma chuva mais forte, tudo voltará ao mesmo.
Mesmo os campos de reassentamento estão a sofrer de carências alimentares e de água potável, numa altura em que muitas ONG admitem que não deverão permanecer muito mais tempo no terreno – e depois de saírem, ninguém sabe exatamente o que pode acontecer.
É que só o Programa Alimentar Mundial (PAM) da ONU, por exemplo, ainda alimenta cerca de 120 mil pessoas, a quem presta ajuda regular só em Tete – que nem é a zona mais afetada da província da Beira.