As obras no interior da catedral, na Cidade do Panamá, a um bom ritmo no início do verão, permitiam antecipar boa parte da euforia que se vive ali por estes dias – e um pouco em todo o mundo católico. A capital do país estava já em contagem decrescente para celebrar os 500 anos da sua fundação (foi em 1519 que Pedro Arias Dávila estabeleceu a primeira povoação europeia na costa do Pacífico), no mesmo ano em que será também Capital Iberoamericana da Cultura, oportunidade única para mostrar o seu desenvolvimento e vida cultural. Além disso, cereja vermelho-escarlate no topo do bolo, à boleia da Jornada Mundial da Juventude (JMJ), os panamianos teriam ainda a visita do Papa.
Numa das salas da Catedral Santa Maria La Antigua, que se ergue numa praça do Casco Viejo, como é conhecida a mais antiga zona da cidade, uma equipa de portugueses tinha sido encarregue de lhe dar uma nova vida. “Fomos escolhidos pelo retábulo-mor. Acabámos por ficar também pelo retábulo lateral, por um monumento funerário, duas pias de água benta, duas pinturas sobre tela….”, elencava Marlene Maia, responsável de comunicação da Dalmática, empresa de conservação e restauro sediada em Lousada que escolheu para si o nome do traje litúrgico próprio do diácono na Igreja Católica, a propósito da obra que os levou ao Panamá.
Ali instalados desde o início de 2018, já tinham conquistado a atenção do embaixador português no país, Pedro Pessoa e Costa, e da sua mulher, Ana, uma apaixonada pelo restauro e que não demorou a misturar-se com a equipa da Dalmática. “Estamos sempre disponíveis para apoiar qualquer empresa que tenha um projeto credível de internacionalização”, sublinha Pessoa e Costa, elogiando um restauro que não só conservou o que havia como reabilitou. A meio dos trabalhos, ali receberam ainda Augusto Santos Silva, ministro dos Negócios Estrangeiros, em visita bilateral ao país, antes de se depararem com outra surpresa: na parede por detrás do retábulo, iluminada e cheia de andaimes, sobressaia algo debaixo da sujidade. Como quem diz, uma enorme pintura mural, oculta há séculos e que ninguém conhecia.
Findos os trabalhos, a Dalmática tornou-se “selo de garantia” na região e já foi chamada a visitar obras do género no Perú, Colômbia, Equador, Cuba…Como brinca a responsável de comunicação da empresa, Marlene Maia, “ o nosso canal do Panamá já está aberto”.
Sob a benção de Maria
A razão de todo este entusiasmo com o evento que decorre do outro lado do Atlântico é mais que compreensível: o único Papa a visitar aquele país da América Central, até agora, foi João Paulo II, em março de 1983. A missa de inauguração da JMJ está marcada para esta terça-feira, dia 22, um dia antes da chegada de Francisco. Agendado pela primeira vez para a América Central, o encontro foi instituído pela primeira vez em 1986, em Roma, e repete-se a cada dois ou três anos, numa cidade diferente do mundo.
A expectativa dos portugueses em relação a este evento também aumentou substancialmente desde que o site da Presidência da República confirmou a presença de Marcelo Rebelo de Sousa na capital panamiana esta semana, fazendo crer que a candidatura portuguesa para receber aquele acontecimento em Lisboa será agora confirmada. O pedido fora feito oficialmente pelo patriarca de Lisboa, D. Manuel Clemente, no final de 2017, depois de cinco anos de conversações várias.
Na Cidade do Panamá estão também pelo menos 300 jovens escalados para as atividades de uma semana com a juventude de todo o mundo, sob o lema “Eis aqui a serva do Senhor. Faça-se em mim segundo a tua palavra”, remetendo para Maria, que sob o nome de Santa Maria la Antigua, foi tornada oficialmente padroeira do país pela conferência dos bispos em 2000. Isso explicará também que a escultura n.º 1 da Virgem Peregrina de Fátima tenha igualmente viajado para aquele país, no início da semana.
Reza a tradição que foi modelada com indicações da própria Lúcia de Jesus, a mais velha dos Pastorinhos, a 13 de maio de 1947. Desde então, ou mais precisamente desde 1945, pouco depois do final da II Guerra Mundial, percorreu o mundo por diversas vezes, depois de um padre de Berlim ter proposto que uma imagem da Nossa Senhora de Fátima percorresse todas as capitais e cidades episcopais da Europa, até à fronteira da Rússia.
Numa mensagem enviada aos peregrinos no Panamá, Carlos Cabecinhas, Reitor do Santuário de Fátima, fez ainda questão de acentuar o caráter excepcional desta viagem: “Entendemos que este é um momento muito importante e que por isso justifica a saída desta Imagem Peregrina nº1, aquela que é para nós a mais importante das Imagens Peregrinas de Nossa Senhora de Fátima”.
Por outro lado, acrescentou, “sabemos o quanto a devoção a Nossa Senhora está ligada a este acontecimento, o quão devoto João Paulo II era a Nossa Senhora, daí ter-lhe dado desde o início um cunho mariano”.
Cada JMJ realiza-se, anualmente, a nível diocesano, no Domingo de Ramos, alternando com um encontro internacional a cada dois ou três anos numa grande cidade. As duas últimas edições internacionais já foram presididas pelo Papa Francisco, que esteve em Portugal em maio de 2017, por ocasião do centenário de Fátima.