O holandês Van der Dussen foi condenado por três agressões sexuais cometidas em Málaga na mesma noite de agosto de 2003, em ruas próximas, e no espaço de uma hora e meia. Mas a polícia espanhola descobriu provas da sua inocência em 2007. Marcadores genéticos mostraram que o verdadeiro culpado, pelo menos de uma das violações – a única onde tinham sido recolhidas amostras de ADN – era um britânico chamado Mark Dixie, preso no Reino Unido por homicídio e violação. Apesar da descoberta da nova prova, Van der Dussen permaneceu preso em Espanha por mais nove anos. Só em fevereiro deste ano, o Tribunal Supremo determinou a sua inocência numa das três violações. Agora, finalmente em liberdade porque já havia cumprido o tempo de pena pelas outras duas condenações, o holandês exige uma indemnização de seis milhões de euros por ter sido condenado por algo que não faz e pelos danos físicos e psicológicos causados por anos de cadeia.
O caso é bizarro do ponto de vista legal. Porque apesar de o tribunal superior admitir que dificilmente haveria mais de um violador – dado o modus operandi, as horas e os locais em que foram praticados os crimes – o tribunal apenas admitiu, na revisão da sentença, que Van der Dussen não era culpado de apenas uma das violações, a tal em que havia provas de ADN. Nas outras duas, os tribunais usaram apenas como prova contra Van der Dussen o reconhecimento feito pelas vítimas. Um dos argumentos que serviu para condená-lo em 1ª instância – o de que a brutalidade e o modus operandi dos ataques eram tão semelhantes que só poderiam ter sido perpetrados pela mesma pessoa – não serviu para o absolver das três condenações.
Agora, Van der Dussen queixa-se de ter ficado com a vida destroçada por ter passado anos na cadeia com o rótulo de violador. “Passei os piores 4 mil dias da minha vida. Um inferno indescritível”, disse ao El País.
Saiu da cadeia de Palma de Maiorca à beira de fazer 43 anos e foi por Palma que ficou. Namora com uma voluntária que conheceu na prisão, alugou um apartamento, escreveu um livro que está prestes a ser publicado e trabalhou três meses num hotel como rececionista. Mas as sequelas da prisão são muitas. O psiquiatra que o acompanhou, José de Miguel Pueyo, fala de “um evidente dano psicológico, tanto agudo como crónico, que interfere negativamente na sua vida quotidiana”. O holandês sofre de transtorno de pânico, transtorno depressivo com ansiedade, transtorno obsessivo compulsivo, quadros que, segundo o relatório deste psiquiatra, começaram e desenvolveram-se durante o tempo de prisão, tendo-se agravado especialmente nos últimos dois ou três anos. “O dano gerado é enorme. Porque, além do mais, terá perdido muitas oportunidades vitais numa idade crítica da vida pessoal e profissional, dos 30 aos 40 anos.”
A defesa do holandês entende que seis milhões de euros é um valor justo por uma condenação injusta e pelos trabalhos, relações e filhos que poderia ter tido. A maior indemnização já concedida em Espanha por um erro judicial semelhante foi dada a Rafael Ricardi por quase 13 anos na prisão por violações que não tinha cometido: não passou de 1 milhão de euros.