A extrema direita alemã prossegue o seu desfile triunfal na conquista de representação nos Parlamentos Regionais da Alemanha. Este domingo, 18, nas eleições para a Câmara dos Deputados de Berlim, a Alternativa para a Alemanha (AfD) conseguiu posicionar-se como a quarta força política da região, tendo obtido 14,2% dos votos (25 de 160 mandatos). E isso, apenas duas semanas depois de ter conquistado o segundo lugar nas regionais e Mecklemburgo-Pomerânia Ocidental, com 20,8 por cento (ou 18 de 71 assentos no Parlamento regional).
Apesar destes dois casos não serem representativos para toda a Alemanha, temos de ter em conta que, com Berlim, a AfD se encontra agora representada nos Parlamentos regionais de 10 dos 16 Estados Federados alemães e que isso lhe abre boas perspetivas para as eleições nacionais de 2017, o que obrigatoriamente redesenhará as paisagem política alemã a médio prazo.
Trata-se da ascensão de uma formação política racista, que faz lembrar a subida da Frente Nacional, em França, ou do UKIP, no Reino Unido. As formações políticas do establishment político germânico encaram esta deriva direitista, que já se esboça há alguns anos, com frustração e resignação, começando pelo centro-direita, mas também passando pelos sociais democratas do SPD e acabando na esquerda socialista arregimentada na Die Linke (A Esquerda) .
O discurso truculento anti-imigração, a ruidosa demagogia contra a “vaga” de refugiados, muçulmanos, terroristas, parasitas do estado social alemão, bem como os ataques à chanceler Angela Merkel, acusada de irresponsabilidade por ter convidado toda a gente a refugiar-se na Alemanha e de não cuidar dos interesses do povo comum e dos interesses nacionais, tem beneficiado esta direita radical.
A AfD não é um simples partido populista de direita. Começou como ala política do movimento islamofóbico Pegida e transformou-se rapidamente no cadinho em que se amalgamaram várias correntes de extrema direita, adoptando uma agenda política idêntica à de grupos abertamente neonazis, retirando a estes o estigma de extremismo.
O seu sucesso espetacular pode dever-se, em certa medida, ao facto de os partidos atualmente no governo central em Berlim (a coligação de conservadores da CDU com o SPD) terem feito conceções à demagogia dos populistas. A política de braços abertos em relação aos refugiados, assumdida por Angela Merkel, não resistiu às pressões. O Executivo alemão encabeçou o processo que, no ano passado, levou ao acordo duvidoso com o governo autoritário da Turquia para conter o fluxo de refugiados sírios nas fronteiras turcas e, por duas vezes, agravou as regras para asilo tornando a estada de refugiados na Alemanha mais desconfortável. Ou seja, mesmo com o seu partido na oposição, os votantes da AfD sentem que qualquer reforço eleitoral do seu partido pode influenciar as políticas governamentais.
E isso é relevante, num país em que o tema refugiados é determinante para o voto de um em cada quatro berlinenses, segundo uma sondagem do instituto de pesquisas de opinião Infratest Dimap.
A análise minuciosa dos resultados eleitorais deste fim de semana em Berlim permitem tirar algumas ilações quanto a quem vota neste partido emergente.
A AdF foi capaz de mobilizar o eleitorado abstencionista. A participação eleitoral deste domingo (66,9%) aumentou quase sete pontos percentuais relativamente à das eleições de 2011 (60,2%). E quem mais ganhou com esta descida da abstenção foi, segundo a análise do Infratest Dimap, a AfD. Em Berlim, captou 64 mil votos de ex-abstencionistas, ao passo que todos os outros partidos juntos captaram apenas 41 mil.
Mais: praticamente todos os partidos perderam votos para os populistas de extrema direita. Assim, o partido de Angela Merkel, a CDU, perdeu 37 mil votos para os populistas da Afd, ao SPD fugiram 22 mil e Die Linke 11 mil, tantos quantos os perdidos pelo partido Pirata, de voi literalmente varrido da paisagem política. Os menos prejudicados com a transferência de votos foram os Verdes (ecologistas) com “apenas” três mil votos em Berlim.
Um dos pontos realçados por este estudo de opinião é o de apenas 26% dos eleitores da AfD terem votado por convicção – 70% depositaram o seu veredito na urna por estarem dececionados com os partidos do establishment. Ou seja expressaram o seu protesto nas urnas.
A análise do eleitorado por género e por grupo etário também é reveladora. Quem vota na AfD são sobretudo homens (em Berlim foram 15% dos eleitores e apenas 9% das eleitoras). A faixa etária mais representada entre quem votou nos populistas situa-se entre os 45 e os 59 anos.
Quaisquer que sejam os resultados das próximas eleições regionais e das nacionais de 2017, esta deslocação da paisagem política para o extremo direito terá implicações de longo prazo na Alemanha – e por conseguinte na Europa – numa altura em que os partidos tradicionais parecem pouco preparados e ainda menos empenhados numa “mudança de agulha” nas suas agendas políticas.