1 – #LASALIDA
Como tudo começou
“Não temos um líder, nem interesses políticos. O que se passa é que estamos fartos, fartos que nos roubem até dentro das salas de aula, fartos da falta de alimentos nos supermercados, crescemos com um país dividido, com um discurso violento. Queremos que o Governo faça o seu trabalho: fazer da Venezuela um local mais agradável de se viver”. É assim que Emilio Ladaeta, um dos estudantes do movimento #LaSalida, que tem assumido os protestos contra o Governo de Nicolás Maduro, resume a luta estudantil. Tudo começou a 12 de fevereiro passado, com os estudantes a tomarem as ruas para exigirem mais segurança, melhor economia, mais liberdade.
E isso só acontecerá, dizem, apontando um caminho a Maduro: “LaSalida”.
2 – A VIOLÊNCIA
Pior que o Iraque
Na República Bolivariana, uma pessoa é assassinada a cada 21 minutos. Em 2013, segundo o Observatório venezuelano da Violência, verificaram-se 24 700 mortes por homicídio. A Venezuela ocupa sempre o topo dos países com maior número de assassínios (entre o 5.º e o 15.º lugar). Segundo a Agência das Nações Unidas sobre o Crime e a Droga, a taxa de homicídios no país bate a do Iraque (mais de 50 por dia). Os crimes de carjacking, os raptos, os assaltos de rua são frequentes e, dada uma força policial mal equipada e ineficaz, cometidos com impunidade. A Venezuela é, além disso, um entreposto da droga colombiana e residência de vários cartéis.
3 – ECONOMIA
A revolução do papel higiénico
Um dos sinais de que o país se encaminha para uma economia disfuncional é o novo cartão de racionamento a usar nos cerca de cem supermercados do Governo. O sistema ilustra as dificuldades de manter uma economia socialista, num mundo capitalista: Caracas queixa-se dos especuladores gente que acumula bens escassos, como o papel higiénico, o leite, o óleo alimentar e a farinha e, por isso, criou esses cartões. Mas serão eles eficazes, quando parte dos açambarcadores pertencem à burocracia? E quando parte do problema está na revenda dos bens que o Estado tenta subsidiar para os seus cidadãos? Outro exemplo é o caótico sistema de câmbio com o dólar: existem quatro taxas, que mais não fazem do que alimentar o mercado negro e a insatisfação social. A que se jutam, ainda, as longas horas de espera para comprar mercearias baratas, os cortes de água, os apagões. Ah!, e não nos esqueçamos da inflação: 57% em fevereiro.
4 – LIBERDADES
Democracia radical ou ditadura?
As ONG’s denunciam assassínios a soldo do Governo, detenções arbitrárias, violações e tortura. Maduro ameaça tirar do ar as televisões que façam o jogo dos “nazi-fascistas”, cancela credenciais aos correspondentes de que não gosta e prende opositores políticos acusando-os de “terrorismo” e “conspiração”. Os media independentes são uma raridade e militares venezuelanos já impediram a entrada de toneladas de papel de impressão para jornais, na fronteira colombiana. “O Governo venezuelano abraçou abertamente as táticas clássicas de um regime autoritário”, diz o diretor da HRW Américas, José Miguel Vivanco. Apesar disso, há quem defenda o regime como uma “democracia participativa radical” (por oposição a “liberal “). Não sem alguma razão.
5 – LEGITIMIDADES
O apoio ao chavismo existe
Desde 1998, que o Partido Socialista Unido da Venezuela (PSUV) ganha eleições (nas últimas, municipais, em dezembro de 2013, obteve mais de 50% dos votos). Embora o MUD (Movimento Unitário Democrático) disponha de sólida implantação nas cidades, junto das classes médias, o PSUV tem os pobres e tem o campo a seu favor. Há razões para isso: conforme Nicolás Maduro explicou num artigo de opinião no New York Times, o regime foi eficaz a redistribuir os lucros, nacionalizados, do petróleo; de acordo com o Banco Mundial, o país reduziu a pobreza de 49%, em 1998, para 25,4%, em 2012. Tem o coeficiente de Gini, que mede a desigualdade da população, mais baixo de toda a América Latina. E gasta bastante mais do que os seus vizinhos em saúde e educação – quase erradicando a iliteracia.
6 – ALINHAMENTOS
Uma luta de classes?
Há quem entenda que os protestos são provenientes das classes médias e abastadas, apontando, para isso, a sua forte implantação nas redes sociais e a sua localização em bairros “ricos”. Mas nem todos os que defendem Maduro são fervorosos socialistas: “Quem está na rua é a linha dura da oposição de direita, que decidiu que não quer esperar até às próximas eleições para derrubar o Governo”, afirma Mark Weisbrot, de um think tank de Washington. Outros afirmam que alguns dos alvos dos manifestantes – supermercados do Governo, universidades públicas, clínicas onde médicos cubanos prestam assistência gratuita – mostram um ódio especial pelo Estado “assistencialista”.
7 – DILEMAS
Uma situação extremada…
Do que não restam dúvidas é de que, 13 meses após a morte de Hugo Chávez, a Venezuela está dividida: as manifestações promovidas pelo Governo também reúnem milhares de pessoas e em alguns “barrios” #LaSalida é palavra proibida.
8 – MEDIAÇÃO
… E sem esperança?
Talvez não. Nas últimas semanas, tem havido, também, sinais de que o desgaste pode levar as partes a negociações. Nicolás Maduro apelou, no NYT, ao restabelecimento de laços diplomáticos com os EUA e a um “diálogo que faça avançar a Venezuela”. Gustavo Cisneros, o maior “barão” de imprensa do país, escreveu uma carta aberta em que pede a mediação do Papa Francisco para se atingir a paz. E, já esta semana, a contragosto, embora, blogues chavistas davam como certo que essa mediação seria aceite. J.D.M.