Sentado à esquerda de Gianni Infantino, na abertura do Mundial no Qatar – país em relação ao qual decretou um bloqueio em 2017 –, Mohammed bin Salman é o epítome do ditado popular “há mais marés do que marinheiros”. Dependente do petróleo saudita e seduzido pelas promessas de mudança, o Ocidente parecia disposto a ignorar os excessos de Mohammed bin Salman (mais conhecido por MBS) – a detenção e a tortura de ativistas políticos; uma intervenção militar no Iémen, que detonou uma das mais graves crises humanitárias de que há memória; ou o encarceramento de dezenas de membros da família real e de líderes, empresariais e políticos, no hotel Ritz-Carlton em Riade durante meses, como forma de os expropriar de riqueza e de influência. A tudo isto, a comunidade internacional virou a cara. Até que, em 2018, o assassínio do jornalista dissidente Jamal Khashoggi – morto e desmembrado com uma serra de osso –, no consulado saudita em Istambul, lhe trouxe a asperidão dos líderes mundiais e a promessa do então candidato presidencial norte-americano Joe Biden de transformar a Arábia Saudita num Estado pária. Seria um outro autocrata a alterar novamente as regras do jogo: a invasão da Ucrânia pelas tropas de Vladimir Putin fez disparar os preços do petróleo e entronizou a realpolitik. Em semanas, Boris Johnson apanhava um avião com destino a Riade, o inimigo jurado Erdogan abraçava-o publicamente e até Joe Biden rumou à capital saudita para pedir ao maior exportador de petróleo mundial um aumento da produção. Tentando evitar um aperto de mão, Biden optou por um cumprimento de punho. O gesto fê-los parecer estranhamente amigáveis. “Ele fez Biden parecer fraco”, comentava um colunista saudita em Jeddah. “Ele enfrentou uma superpotência e ganhou diante do mundo.” De sorriso nos lábios, na posição mais proeminente do futebol global, o herdeiro do trono saudita era um homem de regresso ao topo da política mundial.

Aquele que é, por estes dias, o novo patrão de Cristiano Ronaldo é o sexto de 13 irmãos, filho da terceira mulher do rei Salman, uma mulher da tribo – em criança chamavam-lhe “o filho da beduína” –, e um improvável herdeiro do trono. Estudou na Universidade de King Saud, na capital – ao contrário dos seus cinco irmãos mais velhos, enviados para universidades nos EUA e no Reino Unido –, e era ele que ocupava o lugar de conselheiro ao lado do seu pai, quando este era apenas governador da província de Riade. Hoje com 87 anos, Salman bin Abdulaziz Al Saud subiu – também ele de forma inesperada – ao trono em 2015, depois da morte dos seus dois irmãos mais velhos. Ao contrário das monarquias tradicionais, o trono saudita tem passado de forma lateral entre os filhos do fundador do Estado saudita, Mohammed bin Saud, constutuído em 1932, como forma de manter o delicado equilíbrio de poder entre a vasta família real. E assim deveria continuar. Mohammed bin Nayef, primo de MBS e príncipe herdeiro até 2017, sucederia ao atual rei Salman, descendo, pela primeira vez, uma geração, mas mantendo a lateralidade da sucessão. No entanto, MBS tinha outros planos.