Os enormes descontos feitos nas grandes superfícies dos Estados Unidos durante a ‘Black Friday’ são artificiais, na medida em que os preços são empolados numa primeira fase para depois descerem até à margem pretendida inicialmente pelo comerciante.
De acordo com uma investigação do Wall Street Journal, que teve acesso aos preços de fábrica de milhares de artigos e os comparou com o preço a que foram colocados à venda, numa primeira fase, e depois com o preço a que chegaram durante o famoso dia de descontos conhecido com o Black Friday, que se celebra na sexta-feira, os preços são uma “ilusão engendrada cuidadosamente”, na expressão de vários conhecedores da indústria citados pelo jornal norte-americano.
A crise económica nos dois lados do Atlântico faria pensar que as margens de lucro dos comerciantes norte-americanos estariam a descer, como forma de captar os consumidores e manter o volume de faturação, mas a verdade é que, entre 2009 e 2012, de acordo com os dados da consultora FactSet, as margens dos vendedores mantiveram-se fixas nos 27,9%, descendo apenas para 27,8% na altura das promoções.
Um dos exemplos concretos dados pelo jornal tem a ver com uma camisola: “o fornecedor vende-a à loja por mais ou menos 14,5 dólares, sendo o preço sugerido 50 dólares, o que dá ao comerciante uma margem de 70%. Poucas camisolas são vendidas a esse preço, mas com a descida para 44,99, o volume de vendas aumenta, sendo que a grande maioria é, depois, vendida a 21,99 dólares, o que dá uma média de venda de 28 dólares e dá à loja uma margem bruta de 45%, que é o objetivo inicial do comerciante.
A estratégia das lojas continua a convencer os consumidores, que se prevê que vão inundar as lojas norte-americanas na sexta-feira, como têm feito de forma consistente nos últimos anos.
No entanto, a adesão dos consumidores pode ter resultados trágicos: em 2008, Jdimytai Damour, empregado da Walmart em Valley Stream, no estado de Nova Iorque, morreu quando, ainda antes do amanhecer, as portas de vidro da loja cederam perante a pressão da multidão que queria entrar para aproveitar os descontos, e o empregado foi literalmente espezinhado pelos clientes, tendo morrido de asfixia, de acordo com o seu advogado, citado pelo Huffington Post.
Há, no entanto, alguns consumidores que ficaram tão desagradados com este ‘engano’ que recorreram aos tribunais. É o caso de Cynthia Spann que, de acordo com o Wall Street Journal, está a processar a cadeia de lojas Penney, pelos descontos-fantasma.
A cliente assegura que comprou três blusas com um desconto de 40% face ao preço regular de 30 dólares em março de 2011, mas em vez dos 30 dólares, o preço nos três meses anteriores tinha sido de 17,99, exatamente o mesmo que ela pagou para comprar as três blusas durante o desconto, que, considera, não era real.
Independentemente do desfecho deste e de outros casos em tribunal contra outras cadeiras de retalho, a estratégia dos descontos não deverá mudar.
As grandes lojas já habituaram os clientes a terem descontos sobre o preço original, por isso agora estão agarrados a essa estratégia. A Macy’s, uma das maiores nos Estados Unidos, tentou eliminar os descontos em 2007. “Os consumidores pararam de comprar, por isso percebemos que era uma má ideia”, disse o presidente da empresa, Terry Lundgren.