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© Carlos Barria / Reuters
Usain Bolt nunca falha nos Jogos Olímpicos. Está mais velho e menos rápido do que da primeira vez que assombrou o mundo, há oito anos, em Pequim, numa corrida com o atacador desapertado e em que começou a celebrar a vitória a mais de 20 metros do fim. Está também mais lento do que demonstrou há quatro anos, em Londres, quando venceu com mais de três metros de avanço sobre o seu compatriota Yohan Blake, então o seu mais directo adversário.
No Rio de Janeiro, numa noite quente e húmida, Usain Bolt correu a mais lenta das suas finais de 100 metros em Jogos Olímpicos. Pela primeira vez não bateu o recorde do mundo (como fez em Pequim, correndo em 9,69s) nem o recorde olímpico (os 9,63 que estabeleceu em Londres). No Brasil, perante um estádio que esteve, claramente, todo o tempo, a apoiá-lo enquanto vaiava o americano Justin Gatlin por causa do seu passado ligado ao doping, Usain Bolt limitou-se a fazer aquilo que sabe fazer melhor: ganhar. Sem precisar de superar as suas próprias marcas, nomeadamente os 9,58 do recorde do mundo que estabeleceu, em 2009, em Berlim. Mas assinou com o seu nome aquele que será, de certeza, o seu recorde mais duradouro, aquele que ficará na história por muitos e muitos anos: é o primeiro atleta a sagrar-se campeão olímpico dos 100 metros pela terceira vez consecutiva.
A proeza foi alcançada num corrida tipicamente à Usain Bolt: um arranque lento e um final demolidor. Nos primeiros 30 metros, o jamaicano ia claramente atrasado face a Justin Gatlin, 34 anos, o campeão olímpico de Atenas 2004 – o último da era pré-Bolt – e que, depois de ter passado quatro anos suspenso devido ingestão de substâncias proibidas, regressou para tentar afirmar-se como o “homem que destronou Usain Bolt”. Tentou-o, há um ano, nos Mundiais de Atletismo, em Pequim, e voltou a procurar essa façanha, agora, no Rio de Janeiro. Nas duas vezes limitou-se a ganhar a medalha de prata. E a ter o mesmo tratamento por parte da multidão: uma vaia monumental sempre que o seu nome é pronunciado.
Mais ninguém no mundo do atletismo tem uma aceleração sequer aproximada à que Usain Bolt consegue imprimir a partir dos 30 metros. É aí que, depois de conseguir endireitar o tronco após as passadas iniciais, ele explode literalmente. E galga metros com as suas pernas compridas, num movimento poderoso que parece deixar, em comparação, os adversários subitamente mais lentos e pesados. Pura ilusão: Bolt é que corre mais rápido do que todos os outros.
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© Kai Pfaffenbach / Reuters
“Sou uma lenda viva”, disse ele após concluir a prova e demonstrar que, afinal, prestes a completar 30 anos (no próximo domingo, dia de encerramento do Rio 2016), ele continua igual ao jovenzinho, alegre e sempre disponível, que o mundo conheceu há oito anos, a esmagar recordes uns atrás dos outros, com uma desfaçatez desconcertante.
Dentro e fora das pistas, Usain Bolt tem sido sempre igual. E no Rio demonstrou-o mais uma vez: demorou um pouco mais de 9 segundos para ganhar os 100 metros e depois passou mais de 90 minutos num autêntico carrossel de corredores a responder às solicitações das centenas de jornalistas que se acotovelavam na zona mista do Estádio.
Nisso, Bolt é também imparável. Revela uma simpatia genuína. É incapaz de recusar não responder a uma pergunta, em especial quando identifica os grupos de jornalistas onde percebe maiores afinidades. Por isso, abranda o passo, naturalmente, junto dos americanos, dos ingleses, mas também dos chineses e dos africanos.
“Estou feliz e orgulhoso comigo”, diz, sempre de uma forma assertiva, mas sem fanfarronice. Reconhece que não fez o tempo a que habituou os espectadores em Jogos Olímpicos e critica, por isso, o pouco tempo de descanso que a organização deixou entre a meia-final e a final (cerca de 40 minutos). “Era difícil, assim, conseguir um resultado melhor. Mas mesmo que a execução não tenha sido perfeita, continuo orgulhoso de mim.”
E lembra aquilo que todos já sabíamos: que a história ainda não acabou. “Vim para estes Jogos Olímpicos para ganhar três medalhas e provar que sou um dos maiores de sempre do desporto mundial”.
Mas o mais difícil, como também todos sabem, já está feito. Nos 200 metros, Bolt não tem nem nunca teve qualquer concorrência à sua altura e a Jamaica também dificilmente deixará escapar a vitória na estafeta de 4×100 metros. Nos próximos dias, repete-se a lengalenga: 1, 2, 3, e o Bolt ganha outra vez.