As duas cadeiras aiTai, desenhadas por Kengo Kuma (ainda em protótipo), pareciam ter sido pensadas para aquele momento, em que esteve à conversa com Álvaro Siza Vieira, no seu gabinete do Porto.
O nome significa “quero ver-te”, em japonês, e de facto, foi a pedido do arquiteto japonês que se deu o encontro, promovido pela Mor Design, a editora portuguesa de design, com quem ambos colaboram – e aproveitando o facto de estar de passagem pela cidade, na quinta feira passada, para visitar as obras do antigo matadouro industrial, e antes de se dirigir para Lisboa, onde se faria o soft opening do Centro de Arte Moderna da Gulbenkian (ambos os projetos são da sua autoria).
A cadeira de Siza Vieira, intitulada Alcântara, concebida há cerca de quatro anos, “abriu muitas portas”, confessou João Pereira, CEO da empresa, e permitiu que novas parcerias com designers e arquitetos de renome, nacionais e internacionais, se tivessem firmado.
A admiração de Kuma, 69 anos, pelo mestre da arquitetura portuguesa, de 90 anos, vinha de longe. Tinham-se cruzado fugazmente, em duas ocasiões, mas nunca tinham tido a oportunidade de se sentarem e trocarem opiniões. “Só tenho boas memórias do Japão”, confessou Siza. E bem frescas, acrescentamos nós, após ouvirmos algumas das histórias.
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Recordou, entre outros episódios, a atribuição do Praemium Imperiale, em 1998, concedido pela família imperial japonesa, em nome da Associação de Artes do Japão. “Foram muito generosos comigo”, disse. A cada ano eram distinguidas cinco personalidades, nos campos de pintura, escultura, arquitetura, música e teatro/cinema.
Além de Siza, um dos contemplados foi Robert Rauschenberg, de quem estava ao lado, na cerimónia encabeçada pelos imperadores japoneses. Impunha-se o mais severo protocolo, mas o artista norte-americano, “muito engraçado”, logo se esqueceu que não podia olhar o casal nos olhos e despertou os sorrisos de Akihito e Michiko.
Quando abordou a convivência com o arquiteto japonês Kenzo Tange (1913-2005), despertou um genuíno “Uau, a sério?” de admiração de Kengo Kuma, já que aquele era uma das suas grandes referências. “Tinha 10 anos quando o meu pai me levou a ver o pavilhão que fez para os Jogos Olímpicos de Tóquio [em 1964]. Era tão bonito e fiquei tão chocado que naquele dia decidi que queria ser arquiteto”, explicou.
Sentados nas cadeiras concebidas pelo outro, ambas de madeira (material “especial” e “mágico”, descrevem), discorreram ainda sobre este desafio. “A dificuldade em desenhar uma cadeira é que já foram feitas milhões ao longo da História. É preciso fazer algo diferente, mas que pareça realmente uma cadeira – há pessoas que fazem cadeiras que não parecem cadeiras, e mesas que não parecem mesas”, explicou Siza Vieira. Já para Kengo Kuma “desenhar uma cadeira é como definir-me: o que pode ensinar-me sobre mim?”
No final da conversa, veio o veredicto sobre o conforto das peças. “Sinto-bem… e sento-me bem”, disse Siza, provocando as gargalhadas dos presentes. Kuma devolveu-lhe a atenção: “É muito acolhedora… tal como a sua personalidade”.