Apresenta-se como “realizador, pai, entusiasta do cinema, das estórias, da televisão e das séries” e alguém que “gosta do que faz”. Lembra que em pequeno queria ser arqueólogo ou paleontologista, até descobrir que eram nas estórias que estava o seu fascínio e não nas suas personagens.
Natural de Coimbra, mudou-se para Lisboa aos 17 anos para se formar na Escola Superior de Teatro e Cinema, integrando uma turma repleta de grandes nomes, João Salaviza, Carlos Conceição, António Gonçalves, Ricardo Oliveira e Nádia Henriques, que hoje guarda com carinho, e que trabalharam no coletivo criativo que criou, a Uzi Filmes. Foi quando esta se começou a desfazer que criou, em conjunto com a sua mulher Andreia Esteves, a produtora Coyote Vadio.
Trabalhou 10 anos em novelas, estando mais do que habituado às suas especificidades e clichês, argumento que usa para dar credibilidade a “Pôr do Sol”. Já realizou “A Bruxa de Arroios” (2012), “Linhas de Sangue” (2018), “Teorias da Conspiração” (2019), “Desliga a TV” (2019) e “Até que a Vida nos Separe” (2021).
Habituado a estar atrás das câmaras, hoje é reconhecido até quando delas está longe, devido ao tremendo sucesso da “série de humor, a que gostamos de chamar mini novela de verão”. Em entrevista à Visão, Manuel Pureza relembra como começou esta aventura e, no dia do episódio final, promete que ainda faltam “as maiores pérolas”, deixando um desafio aos espetadores para o fim que se avizinha.
Porque escolheram o nome “Pôr do Sol”, numa sátira cheia de clichês? Foi o mais clichê de que se lembraram?
Não (risos). Tenho quase a certeza disto, mas se não for acho que o trio criativo [o próprio, Henrique Dias e Rui Melo] não se zanga por eu dizê-lo. Fui eu que tive a ideia do nome.
É muito difícil identificar qual foi o exato momento em que aconteceu determinada ideia. As nossas reuniões têm sido forçosamente por zoom, mas são muito divertidas. Alguém manda a ideia: “E se o gajo viesse num cavalo que anda para trás” ou “e se este levasse com três tiros e não morresse”. E todos pensam: “Isso é boa ideia aponta”.
O nome, segundo me lembro, começou com o “trailer” que nós insistimos em fazer para vender a ideia muito bem vendida. Porque, nos dias que correm, não é fácil avaliar um projeto por um dossiê, quando estamos a falar de imagens, de estórias. Se disséssemos: “A nossa ideia é fazer uma novela a gozar”, iam ver o dossiê e pensavam: “Está bem, e a minha ideia também é telefonar à minha avó, tchau“. Outra coisa é verem um trailer do género: “Meu Deus alguém deitou fogo à cereja…”. Então, fizemos o trailer num dia e meio e vendemos o projeto. Acho que, quando estávamos no ping pong de ideias para o fazer, eu disse: “Isto devia chamar-se ‘Herdade do Pôr do Sol’, e acabou por ficar “Pôr do Sol”.
Mas fui eu como podia ter sido o Henrique ou o Rui. Justiça lhe seja feita, o Henrique tem uma capacidade de non sense acima da média e tem a coragem de escrever as ideias que tem. Da cabeça para o papel às vezes perde-se tanta coisa, mas o Henrique tem este dom incrível e está numa forma física da sua escrita invejável. Estou muito feliz por finalmente o nosso trio ter conseguido encontrar um lugar, não ao sol, mas ao “Pôr do Sol”.
Falou do trailer ou episódio piloto, como se faz nos Estados Unidos. Foi um excerto de 10/15 minutos que fizeram para propor a ideia. Estavam receosos da reação da RTP?
Receosos nunca! Eu acho que nós desconfiávamos que era irrecusável, e não é um laivo de vaidade. Nós sabíamos que estava bem feito e que, no limite, o que as televisões diriam seria: “Não temos dinheiro agora para isso”. É um projeto que não é particularmente barato, tem um elenco grande e cenários naturais, em vez de estúdio.
Mas não temíamos a reação, tanto mais que sabemos que a RTP é uma casa que arrisca, por mais que seja criticada pelo público, que diz que é “sempre a mesma coisa”. Não é, é a estação que mantém uma estratégia teimosa de apostar na qualidade, na inovação e nas propostas arriscadas, onde nem sempre os números de espectadores justificam o investimento. Nos últimos tempos, temos vários exemplos: “O último a sair”, “Sara” [ambos de Bruno Nogueira]; “Desliga a televisão” e “Pôr do Sol”, que fomos nós que fizemos; “#Casa do Caís”, “Frágil”. Temos séries inacreditáveis na RTP Play, algumas só nesse formato, porque não cabem na grelha da RTP.
Se nos dissessem: “Queríamos tanto, mas não temos dinheiro”, então íamos ter de ir bater a outra porta. A primeira porta foi a RTP, falámos diretamente com o José Fragoso, diretor de programas. Vínhamos de outros programas como o “Até Que a Vida nos Separe” e, antes de deixar a coisa esfriar, disse: “Zé, preciso de reunir contigo, tenho uma coisa para te mostrar, tens de ver isto à minha frente”. Foi por zoom, mostrámos e foi imediato, porque se não fosse ali o José Fragoso ia deixar escapar aquele projeto.
Podemos considerar “Pôr do Sol” uma novela ou uma uma série? Ou é difícil de se definir nestes moldes?
Eu acho que é uma série devido à duração, são 16 episódios de 30 minutos. Vai acabar já hoje e começou praticamente ontem. Mas o seu formato é claramente o de uma novela. Pouco interessará defini-la. Podem perguntar: “É uma mini novela ou uma série?”. É uma coisa muito divertida. O que nós sabíamos é que não queríamos fazer sketches, mas sim uma paródia ou sátira às novelas e, sobretudo, que fosse uma coisa muito verdadeira. É, portanto, uma série de humor, que nós gostamos de chamar mini novela de verão.
Falando da duração, numa entrevista afirma que foi uma “vitória” ter conseguido que o formato ficasse 16 episódios de 30 minutos e não os habituais 45…
O que nós achamos, e por isso é que disse que era uma vitória, é que o humor tem um tempo muito próprio, ou seja, não aguenta muitas vezes 45 minutos. Torna-se chato, pode haver uma curva que não resulta tão bem. O que funciona melhor, em qualquer produto de ficção, é as pessoas ficarem com vontade de mais e não com vontade de passar à frente.
A nossa regra foi 16 episódios de 30 minutos para que as pessoas nunca sentissem o “passa à frente” ou “este episódio está chato”. É um desafio muito grande fazer funcionar uma história em meia hora. Quando vemos “Pôr do Sol”, e falo enquanto espetador, não há um momento em que não aconteça alguma coisa, não há um momento morto. Começas a ver um episódio e passado dois minutos já acabou.
E, às vezes, ainda se tem de passar para trás porque se perdeu alguma coisa…
Eu acho que é preferível essa ligação honesta com o público. As séries da Netflix, que são mais modernas na sua forma, apostam neste mini formato de 20 minutos. Também tem a ver com o facto de as pessoas já não perderem muito tempo a ver coisas, têm uma vida muito agitada. Portanto, quanto mais curto for, melhor. Isso é horrível para mim, enquanto espetador e amante da séries e filmes, mas ao mesmo tempo percebo que é uma transformação natural que tem acontecido nos últimos tempos.
Falando nessa transformação, acha que com “Pôr do Sol” também vemos uma aproximação à forma como se vê televisão hoje em dia, isto é, sem um horário específico e com a possibilidade de fazer binge watching, na RTP Play, como acontece com qualquer série na Netflix ou HBO?
Sem dúvida, a RTP Play está ativa dessa forma já há muitos anos. No “Pôr do Sol”, estreiam os episódios às 12h na RTP Play e às 21h na televisão linear. Eu acho que a RTP Play é uma das melhores plataformas de conteúdos que há a nível europeu, só que nós – público português – temos a tendência a não ligar nada a inovações desse género que aconteçam no nosso país.
E temos a sorte de ser gratuita, ao contrário das plataformas de streaming como a Netflix e a HBO…
Ou ao contrário da Opto, na concorrência direta [na SIC]. A verdade é que a RTP Play, com o “Pôr do Sol”, regista números absolutamente astronómicos por episódio. Se formos ver agora os 10 programas mais vistos da plataforma, são os 10 primeiros episódios do “Pôr do Sol”, o que é um bocadinho assustador (risos).
Acho que a RTP Play se está a cumprir e já se cumpria antes, tem série inacreditáveis: “#CasadoCais”; “#SÓQNÃO”(série de entrevistas da Joana Martins); “Frágil”; “Dolores” e “O Meu Sangue” (ambos de Tota Alves). A RTP Play já existia, mas, se algumas pessoas a vierem a descobrir por causa do “Pôr do Sol”, o mérito é da RTP Play. A série é só uma justificação, porque já o podiam ter feito antes. O que nós temos agora com o “Pôr do Sol” é pessoas a fazer batotice, que eu adoro. Vão ver o episódio às 12h na RTP Play [antes de sair na televisão] e depois vão dizer para o Twitter: “Ah, o gajo faz não sei quê”. Acho isso maravilhoso, é ótimo (risos), porque mostra que há uma vontade gigante de partilha. Do meu ponto de vista, enquanto produtor e realizador, digo assim: “As pessoas estão mesmo a querer chibar-se todas (risos)”. E acho isso maravilhoso, acho um jogo mesmo giro.
Falando no sucesso que a série está a ter. Estava à espera?
Não, não estava. Estava à espera que fosse bem recebida, mas não estava à espera de termos uma pessoa, a Telma, a propor uma loja a vender t-shirts do “Pôr do Sol”, que é incrível. Acho que está a ter uma adesão espetacular, deixa-me muito feliz que tenha congregado as pessoas à volta da televisão. Em última instância, é o que me lembro de gostar de fazer com a minha família. Quando dava um episódio de “MacGyver”, “Crime na Pensão Estrelinha”, “Casino Royal”,”Herman Enciclopédia”, “Little Britain” ou os “Jogos sem Fronteiras”, íamos todos ver. Guardo essas cenas de humor que víamos em família.
A televisão, às vezes, tem uma função um bocado assustadora, quando permite que as pessoas não falem umas com as outras. Com “Pôr do Sol”, o que acontece é que as pessoas estão a olhar, mas estão a rir-se em conjunto. É uma coisa que valorizo muito, esta experiência social e familiar a ver a série.
Um desafio que eu gostava de lançar para o último episódio é que as pessoas fizessem vídeos a reagir (reaction videos). É uma coisa que nós não temos cá, e que era engraçado porque no último episódio acontece tanta coisa. Acho que era muito fixe nós vermos as pessoas juntas, a rir em conjunto.
Falou das t-shirts do “Pôr do Sol”, mas vemos também as músicas da banda Jesus Quisto no Spotify, a euforia que se tem gerado nas redes sociais, desde os memes, a ser tendência no Twitter em Portugal… É uma série de culto já?
Eu nunca soube muito bem o que isso queria dizer (risos), ou seja, a partir de quando é que se torna série de culto? É quando todas as pessoas falam sobre isso? Então sim, é uma série de culto. É quando é tendência no Twitter? Eu não tinha o Twitter ativo até o “Pôr do Sol” nascer. Tinha dois seguidores um dia e, no dia a seguir, tinha três mil. Foi um bocado estranho, porque o Henrique e o Rui não têm Twitter, e de repente eu tenho e boom… estão todos aqui.
Há tanta coisa que está a acontecer à volta disto, que eu acho que sim, há qualquer coisa de culto à volta do “Pôr do Sol” que me deixa muito contente. A repercussão que tem na vida das pessoas, tornar o estar vivo uma coisa mais divertida, é porreiro.
O Marc Maron tem essa influência sobre mim. Eu nunca ouvia podcasts, por exemplo, e de repente descobri o do Marc Maron, e é incrível. Depois descobri que participou no “Glow”, da Netflix, e que também toca guitarra… E, de repente, o Marc Maron torna-se no meu objeto de culto. Se o mesmo acontecer com “Pôr do Sol”, e alguém diga: “Já pus o genérico como despertador, o meu toque de telemóvel é o Jesus Quisto a tocar o “Beavers in Loves”. É ótimo. De repente, alguém tem um poster do Lourenço em casa agarrado à Matilte… Epah, então aí acho que é melhor consultar um médico especialista, porque está a ficar grave… Mas sim acho que é uma coisa fixe.
Numa entrevista diz que já o reconheceram na rua por causa de “Pôr do Sol”. É estranho, para alguém habituado a estar atrás das câmaras, agora ser quase uma celebridade?
(Risos) Não é tanto por ser reconhecido. Vivo bem sem ser reconhecido, é preferível serem conhecidos os projetos que faço. O que eu penso é: “O projeto está a ser tão bem recebido, que as pessoas até sabem quem o realizou”, e isso para mim é extraordinário. Tu vês um filme e dizes: “Ah, claro que Suicide Squade é do James Gunn” ou o “Oito e meio é do Felini”, o que não acontece com séries de televisão.
E mesmo assim às vezes sabe-se o nome e não se tem a imagem mental da pessoa…
Sim, ou seja, isto está a ter uma repercussão a um nível que eu acho muito bonito. Porque, convenhamos, os fenómenos em Portugal não precisam de ser muito grandes, basta que haja uma onda de reconhecimento à volta de um projeto que o torna um fenómeno. Acho que “Pôr do Sol” está muito bem feito, os atores estão todos muito bem, a história é boa e a escrita excelente. A falar do meu trabalho, também acho que está bem realizado. A cena engraçada é que as pessoas gostam mesmo que cheguem as 21h para ver aquele episódio. E por causa disso, a seguir, se calhar, vão procurar quem realizou e pensam: “Manuel Pureza? Quem é que é este palerma?”, e vão à procura. O palerma tem estes óculos, o cabelo assim meio desgrenhado, uma barba… De repente, estou na rua e ouço: “Manuel Pureza”, e penso “isto deve ser alguém a gozar comigo”, algum dos meus amigos, até perceber que não era ninguém que conheço, uma das pessoas até veio falar comigo no Instagram a dizer: “Fui uma das pessoas que gritei na rua”. Mas é isto, está tudo bem, não é o meu reconhecimento que eu acho muito fixe.
A influência que estava a dizer que o Marc Maron tinha sobre si, se calhar as pessoas olham para si e acham isso…
Estou cá, falem comigo. A série tem tido uma grande unanimidade, mas há pessoas que dizem mal dela, isso é bom. Porque os fenómenos dos quais toda a gente diz bem eu desconfio, penso sempre que houve ali qualquer coisa, um avião que passou por cima da cabeça delas e largou um gás e estão todas a dizer que sim.
Ainda assim, devem ser raras essas pessoas…
É raro, mas há. É bom sinal, ainda bem que não agradamos a todas as pessoas, isso é ótimo. Há pessoas que acham que as nossas influências são umas, mas depois afinal são outras. Nós estamos fartos de falar no Herman com o “Diário de Marilu” e o “Casino Royal” e também falamos do “Moita Carrasco” do Nicolau Breyner, e há pessoas que acham que é algo completamente diferente, e ainda bem.
Acho que sobretudo devia deixar de haver uma coisa no nosso país que é a vergonha de dizer: “Eu gosto do trabalho deste meu colega”. Porque não? Dizermos bem uns dos outros. É uma coisa que não é culpa do “Pôr do Sol”, acho que é uma coisa anterior ao “Pôr do Sol”. Vamos ligar mais ao que é feito cá, há tanta coisa boa, que acho que é bom estarmos atentos.
A série está a ter uma grande audiência e share. Mas, corrija-me se estiver errada, parece-me que não se interessa muito por esses números concretos. Aliás, é até um assunto com o qual brinca nas redes sociais. Por exemplo, uma das suas publicações diz: “Pôr do Sol: Líder absoluto no segmento de ‘Pessoas Humanas’” E como legenda escreve: “Os números que fazem diferença”. Não é habitual vermos alguém brincar assim com este assunto…
Essa é a nossa parte mais agressiva, com a promoção que as novelas fazem delas próprias hoje em dia, que é: “A líder no seu horário”, “A líder no horário das 21h às 21h03”. Nós estamos a brincar um bocado com isso. Já fizemos: “Líder das novelas para a faixa das pessoas que dizem treuze”, ou seja, é completamente ridículo. As pessoas gostam, estão a aderir, é importante saber os números, com certeza, agora fazer gala dos números como: “Conseguimos a novela mais vista com cães” ou “Novela mais vista com pessoas com 1,50cm”…As pessoas já fazem anúncios desses, o que é que isso contribui para a minha felicidade? Nada. Se isso faz de mim um melhor espetador? Não. Mas as redes sociais estão cheias dessas coisas.
Sente que “Pôr do Sol” podia ter uma visualização internacional? Ou acha que a sua essência se perdia nas legendas?
A comédia, ao contrário do drama, não é uma boa venda. As plataformas não andam à procura de comédias de outros países que não sejam de língua inglesa, por uma razão simples. Há uma especificidade no “Pôr do Sol” que é: só para quem sabe onde é Santarém é que faz sentido (risos).
Falando nos atores, numa entrevista à Visão, Henrique Dias afirmou que a maioria dos atores estava assustada com o tom da novela. Sendo que havia essa preocupação inicial como conseguiram juntar um elenco com tantos nomes de destaque na ficção portuguesa?
As pessoas não tiveram receio em aceitar, aceitaram logo, não houve ninguém que tremesse. Depois de já estarem dentro do barco, tiveram foi receio de como ia ser velejado. Nós não queremos cuspir no prato que nos deu de comer, muitos de nós fizemos novelas e era importante que ficasse claro que é uma manifestação de profunda admiração.
Há uma figura incontornável neste projeto que é o Manuel Cavaco, que tem mais de 30 novelas feitas, tem 60 anos de carreira e aceitou fazer isto. Ele entrou nos ensaios feliz e disse com um tom grave: “Há uma maldição no nosso meio. Quando nos divertimos muito, a coisa não resulta”. E eu disse-lhe: “Vamos ver”, mas prefiro divertir-me muito e a coisa não resultar do que andar aqui a sofrer.
Assim quebraram a maldição…
Sim, isso foi extraordinário, assim como ver alguém com a longevidade e o sentido crítico do Manuel Cavaco tirar um gozo gigante de estar ali connosco. Agora, na ressaca da coisa liga-me várias vezes: “O episódio de hoje, que maravilha, aquilo ficou mesmo bom”. É excelente, nós criámos uma dinâmica de equipa, que é uma coisa que prezo muito nas produções da Coyote Vadio.
Sem dúvida houve muitos nervos e receio, mas que se dissiparam no final da primeira cena. Percebemos que estávamos a fazê-lo de uma forma séria, que ninguém estava a fazer de bonequinho ou palhacinho, que é uma coisa que eu sinceramente abomino.
Este gosto que se vê que tem pelas novelas. Já via novelas desde pequeno, ou seja, sempre as viu em casa, ou foi algo que foi crescendo devido ao trabalho, uma vez que trabalhou 10 anos nesse género?
Eu nunca vi novelas, nunca vi uma novela inteira, a única que vi, e que adorei, em miúdo era o “Desencontros”. Não sou espectador de novelas: conheço muitas, mas por força do meu trabalho. Sei do que as novelas se tratam, consigo adivinhar, mais ou menos, para onde vão, mas não tenho um gosto especial por novelas. Durante 10 anos fiz novelas, aprendi muita coisa, mas, em 2019, senti que se tinha esgotado o desafio. Eu preciso de desafios constantes e diferentes e senti que estava já a trabalhar para uma coisa que eu não gosto nada só para receber. Isso não é bom para alguém que se move num círculo de contar estórias.
Não digo que não volte a fazer uma novela, provavelmente até posso equacionar essa hipótese, se o projeto for interessante. Mas não acho, devido sobretudo às duas últimas novelas que fiz, que foram novelas muito difíceis, Fiz na Plural, num momento de viragem do canal da TVI para a hegemonia agora da SIC, que aconteceu com o “Golpe de Sorte”. Foi um momento complicado. Chegou 2019 e percebi que não era por ali que ia ser feliz e, portanto, mudei, fui encenar uma peça de teatro, escrevi no Teatro da Trindade e depois fiz outras coisas, que me diverti muito a fazer, como o “Até Que a Vida Nos Separe” e agora o “Pôr do Sol”.
Tem receio que, se um dia quiser voltar às novelas, se depare com um certo desdém por ter brincado com elas?
Se isso acontecer, é o primeiro motivo para eu não fazer essa novela. É próprio de alguém que não percebeu o alcance do que estamos a fazer. O que estamos a fazer é uma novela a sério, mas que põe algumas coisas no ridículo, e isso só pode ser saudável. O “Festa é Festa”, da TVI, tem uma certa dose de ridículo também, é uma novela engraçada, cómica. O “Amor Amor” da SIC foi atrás um bocado disso. O humor ser uma moda, pode não ser inteiramente mau.
Agora se alguém em algum canal disser assim: “Esse tipo pode vir, mas tem de acalmar-se porque vem da cena de ‘gozar’ com novelas”, eu não vou entrar nessa novela, não quero. Não gosto de paternalismos, nem de condescendências e acho que quem não perceber que o “Pôr do Sol” parte de uma zona de profundo respeito, não percebe nada disto. Uma coisa é quem nunca fez novelas dizer que as novelas são más, outra é quem fez saber rir-se de si próprio.
Falando dos diálogos, elogiou a escrita do Henrique, que se está a tornar num sucesso gigante com todas as frases a virar memes que estão por toda a internet. Há inúmeras frases emblemáticas desde: “Quero ser tão feliz como o Dalai Lama… ou o João Baião” ou “Não aguento mais esse cheiro a IC19”. Qual é a sua preferida?
Há várias (risos). Eu gosto muito da expressão do Tó Mané quando ele diz “Felt!”.
O final está aí à porta, será um episódio duplo esta sexta-feira. O que podemos esperar? Vamos ter um típico final de novela para chorarmos, é melhor prepararmos os lenços de papel, ou é um final mais animado?
É tudo isso e mais alguma coisa… Eu acho que se deve respeitar as novelas acima de tudo, portanto acho que sim. Vai acontecer muita coisa boa e má, mas só esta sexta-feira é que saberemos. É esperar para ver…
Em entrevistas anteriores refere que não exclui a hipótese de fazer uma 2ª temporada. Quão confiante está que isso possa vir a acontecer?
Não sei, adoraria que acontecesse. A vontade é enorme de todos nós, do elenco e da equipa. Vamos ver como corre. Acho que é sempre uma possibilidade. Vejamos o que é que acontece no decorrer dos próximos tempos.
Que projetos podemos esperar no futuro? Planeia manter-se neste tom mais cómico?
Não, tenho vários projetos já em carteira, vou começar agora a fazer um filme ainda este mês, temos mais uns projetos a arrancar até ao final do ano. A Coyote está sempre um bocadinho ativa à procura de novos desafios, sobretudo coisas variadas. O género da comédia é um género que me interessa, mas outros também, como foi o caso do “Até Que a Vida nos Separe”, uma série também muito importante para nós, e para mim uma das mais importante que fiz. Acho que é o caminho a percorrer. Espero que o próximo ano seja valente.
Agora com o final à vista, algum conselho de como conseguir tirar a música do genérico do “Pôr do Sol” da cabeça?
Cantá-la todos os dias (risos), e espalhar aos sete cantos do mundo que ela existe.