Da América e da Europa
A Europa na sua realidade concreta são “nações”, sem nenhum “centro” nem vontade política digna desse nome
1/6/2006
Nunca a América esteve tão omnipresente na cena planetária como neste começo de século e de milénio. Missão salvadora em lógico prolongamento de duas guerras mundiais e da guerra-fria que se seguiu à última, mas também vertigem na aparência incontrolada e incontrolável, depois, mau grado o desaire do Vietname, logo compensado com duas guerras do Iraque. A esta omnipresença americana correspondeu a retirada da Europa, nas suas duas expressões, da mesma cena mundial por ela dominada desde Waterloo, pelo menos. E com ela um novo relacionamento América-Europa e Europa-América, se não de total dependência, de subalternidade, sem exemplo no passado.
Como Roma depois da segunda guerra púnica, a América, após o duplo colapso político da União Soviética e da Europa democrática, assumiu, sem hesitações, a função hegemónica imperial, até então de exclusiva representação europeia.
Estamos em plena vertigem imperial e imperialista da América, mas desta vez sob o signo e a caução da Democracia exemplar de que os Estados Unidos (EUA) se reclamam e que nós mesmos, europeus, aceitamos como paradigmática, até porque, começou por ser, fora da Europa, a filha dilecta da História europeia.
American Vertigo é o título certo que um europeu, filho desse mesmo entusiasmo mítico pelos EUA, deu ao seu mais recente ensaio, na esteira do célebre de Tocqueville, sobre o caso americano, no momento em que se tornou o autor incontornável da nossa História. Como todos os ensaios de compreensão da América, mesmo nesta fase da hegemonia planetária dos EUA, o livro de Bernard Henry-Lévy é, ao mesmo tempo, um ensaio sobre a Europa. Ou melhor, sob fundo da Europa. Apesar da sua paixão pela América, American Vertigo de hitchkockiana ressonância é um espelhismo. Um duplo espelhismo, o da imagem da América em nós e a nossa na América.
O ensaio do mediático ex-novo filósofo é interessante, vivo, apaixonado e, por vezes, apaixonante. Corresponde um pouco ao que nós esperávamos desta revisitação de Tocqueville a 170 anos de distância. Mas já não é, porque o não podia ser, uma leitura e uma compreensão da América como a do tempo do célebre ensaísta e historiador. O espelhismo é inverso. A Europa de Tocqueville era o centro do mundo e a novidade e o golpe de génio de Tocqueville foi ter compreendido que essa não-Europa, em vias de se construir, era não só a “periferia”paradoxal da mesma Europa, mas já uma Europa outra, uma anti-Europa à procura de um futuro que teria o seu nome e seria o paradigma do futuro.
Há mais de século e meio, a tentação, já então forte, de ler a América no espelho da Europa era de natureza não apenas equívoca, mas assimétrica. A Europa era salvo na excepção Tocqueville o modelo, e a jovem América, que não chegara ao termo da sua “fronteira”, quando muito uma Europa futura. Um todo sobretudo no seu papel de continente “civilizado” e “civilizador”. Duas guerras suicidárias, o fim da descolonização que sempre de fora dava à Europa a sua figura civilizadora e imperialista, converteram o continente-Civilização, primeiro em destroços, depois num mundo politicamente sem centro e, por fim, embora de novo social e culturalmente ainda brilhante, numa espécie de Grécia que nem espera Alexandre nem a futura Roma para ser a subalterna realidade política em que se converteu.
Aproximar para fins de compreensão geopolítica a América e a Europa só tem sentido em relação a um passado recente em que uma e outra eram actores da História ou em vista de uma Europa, continente unificado ou unificável, futuramente (im)plausível.
A América, goste-se ou não se goste, neste momento é ainda uma força que avança, uma vontade histórico-política com um sujeito próprio, e o novo César de um império romano fictício, mas que como tal se sonha ainda. A Europa na sua realidade concreta são “nações”e é o que como “nações”se vive que é importante sem nenhum “centro”nem vontade política digna desse nome. No melhor dos casos, em nome do seu fabuloso passado político é ainda uma sociedade de resistência e de protesto face a uma sociedade (a mesma) hiperliberal como a americana, mas que é uma Nação
Mas mesmo nesta perspectiva, a realidade europeia é, pelo menos, a de duas Europas não a antiga, da guerra fria, de oeste a leste mas uma pró-americana de ideologia e quase ocupação, e outra, mais contestatária, de tradição socializante e crítica em relação ao paradigma dominante americano. Paradoxo quase burlesco, típico da inversão de signo da nova fase do Ocidente, são os antigos países de Leste que caíram na escarcela dos Estados Unidos como frutos maduros, e são os do Ocidente, aliados preferenciais da América, que mais contestam as pretensões imperialistas do país de Lincoln e Bush.
Apesar de na ordem política e militar a Europa estar reduzida a uma “Natolândia”, a “velha Europa”, tão pouco cara a Rumsfeld, responsável pela nova estratégia norte-americana no mundo, não é bem e nunca será, mais um “Estado”em uma série de “Estados”da grande América. Até se pode dizer que esta tão impressionante supremacia americana no contexto de um Ocidente tão assimétrico como é o nosso, é, em grande parte, ilusória. Um bom entendimento com a Europa em todos os planos ainda é importante para os EUA e claro está não o é menos para a Europa. A Europa já o provou em circunstâncias graves é para os Estados Unidos um factor positivo na sua política planetária que tem muito de “fuga para a frente”. E a Europa não está sozinha no mundo. Ainda é um interlocutor válido no novo jogo mundial onde a China e a Índia entraram ou reentraram com espectacular presença. Sem falar na diversa mas complementar posição de ambas América e Europa em relação ao Islão.
A “impotência”europeia não é apenas um elemento negativo na perspectiva das relações América-Europa. Essa “impotência”é também sabedoria tardia mas efectiva de um continente que, depois de várias peripécias suicidárias se converteu no continente da paz por excelência. Continente de paz activa, entenda-se, não de espaço egoisticamente preservado de conflitos ou alheio aos males do mundo e, em particular, aos que afectam as áreas onde a Europa teve responsabilidades históricas e, agora, deveres éticos imperativos.
A América que está ou tem tendência mormente sob o ponto de vista tecnológico a estar em toda a parte e a intervir cada vez mais abertamente no destino do planeta como um todo, não só presume das suas forças como não pode levar a cabo a sua “missão”providencial sem o consentimento implícito e o apoio da Europa, por mais subalternizada que esteja ou pareça. Vendo bem, esta América tão fora dela e tão dominadora do mundo, não está certa de um futuro tão “americano”, como agora o imagina e nós europeus temos tendência a crer, hipnotizados pelo exemplo dos exemplos, o do Império Romano.
A América é um falso império romano, que se construiu no tempo lento de uma outra civilização imóvel por dentro durante quase mil anos, com quatro de gloriosa decadência. De um certo modo, a Europa, não apenas como passado, mas como realidade futurante, não tem menos garantia de perenidade (e de íntima coesão de memória) que esta América em contínuo processo de construção-destruição do seu próprio modelo. Nem o factor língua tão homogéneo ainda hoje lhe assegura o domínio cultural que é ainda o seu. Há uma caoticidade inerente à sociedade americana hoje factor até certo ponto do seu dinamismo que mina surda ou já visivelmente a espécie de “nação”, maior do que ela mesma, que são os Estados Unidos. É duvidoso que o seu novo modelo imperial como solução de emergência para canalizar os seus elementos centrípetos, lhe assegure, como outrora a Roma, uma perenidade política de alcance planetário. Mais fácil será que essa performance venha de impérios com memória milenária e estruturante, entre eles a China e o Japão.
De qualquer modo, se como “império ocidental”os EUA se consolidarem, é imperativo que associem a uma nova utopia precisamente essa Europa, filha do Império Romano, de onde a ideia de um império mundial surgiu. E que nessa Europa não se esqueça a Rússia, nação messiânica e imperial. Com estes três lados poderá reinventar o antigo triângulo mítico e místico que a religião dominante do Ocidente configurou na Trindade. O Ocidente é um todo e é uma ilusão de nação adolescente pensar que a mera supremacia militar, financeira e económica assegure à mais optimística criatura da velha Europa, o domínio do mundo. Sozinha, a América não chegará ao fim de si mesma.
Intifada social e cultural
“Em França resolvemos os problemas através de crises. E é preciso chegar ao paroxismo para as resolver”: François Mitterrand in C’était F.M., de Jacques Attali
8/11/2005
Tudo se paga. O preço da famosa “excepção cultural” francesa cifra-se, desde há quase duas semanas, nos milhares de carros incendiados no país das “luzes”. Ou antes, na periferia da sua capital, que abrange a França inteira. Bastaria isso para distinguir esta revolta dos bairros periféricos de Paris, cintura sociologicamente “guetizada”, apesar dos esforços feitos para evitar as consequências de uma fractura social à vista desarmada, da já mítica e mitificada sublevação do Maio de 68. Maio de 68 foi a crise de uma sociedade de abundância, induzida, entre outras coisas, pela longínqua revolução maoísta. Levada a cabo por uma juventude ultrapolitizada e socialmente privilegiada que encontrou no “maoísmo”uma ocasião inesperada de combater a ideologia dominante da esquerda europeia, a do marxismo de referência soviética.
A França de 2005 (como a Europa em geral) pouco tem que ver com a de 1968. Sem estar em crise, nem na ordem política nem na ordem social, gerindo com dificuldade uma economia sob o signo da pre-cariedade geral do emprego, mas incapaz de integrar nela os laissés pour compte do neo-liberalismo latente, vê-se agora confrontada com uma revolta inédita, de tipo simbólico. Contestação inconsciente, sobretudo, e por isso tão difícil de situar e, por consequência, de combater ou superar. Nada tem de ideológica no sentido tradicional, com motivos precisos e actores assumidos. Não há Cohns-Bendits desta intifada social e cultural de que são expressão e agentes jovens saídos, directa ou indirectamente, da emigração magrebina, na ressaca da descolonização.
A França, em particular, durante a vigência da política socialista, julgou possível “integrar”esses novos actores e a sua herança, no quadro do seu código cultural. Jack Lang foi o emblema desta integração tendencialmente “multiculturalista”. Durante anos a sua versão de uma França “mestiça”, culturalmente falando, conheceu um inegável sucesso. Zidane é o mito deste sucesso. Ou antes, a árvore que escondia a floresta, esta que, agora, como no final de Machbeth, sai do bosque urbano com cocktails molotov improvisados para pegar fogo ao paraíso entrevisto e fora de alcance.
Há anos que um mal-estar, ainda sem nome, corroía surdamente a sociedade francesa e a sua invejável utopia cultural, concebida para uma sociedade relativamente homogénea, de tradições colectivas de séculos, que tinham (têm) na escola a sua expressão. Os primeiros sintomas de autoguetização da sociedade francesa manifestaram-se no âmbito das escolas. Não nas privilegiadas de Paris e outras, mas sobretudo nessas onde a coabitação multicultural pôs em confronto tradições diversas da francesa clássica. Com a emergência histórica, política, ideológica, do Islão no plano mundial, o mundo, directa ou indirectamente vinculado a essa nova referência “cultural”, como é, sociologicamente, a da maioria desses bairros periféricos, o admirável modelo francês escrevemo-lo sem ironia, conheceu os limites da sua sedução. E até da sua aplicação, como o famoso e tão mal compreendido caso do véu islâmico nos recintos escolares francesas o mostrou.
Pouco a pouco, tudo parecia entrar na ordem. Puro engano. As duas águas nunca se misturaram tão harmoniosamente, como a utopia universalista da cultura francesa, única no mundo, assumida e estruturada, o teria imaginado. Não é ideologicamente que os casseurs de Clichy-sous-Bois se opõem a essa cultura de inscrição laicista quer dizer, sem vínculo orgânico com a ordem de qualquer crença, essência da famosa excepção cultural francesa. É como contracultura, no sentido mais elementar do termo, como rejeição visceral de um modelo de sociedade onde não se reconhecem porque com alguma razão não se sentem reconhecidos por ela. O mundo ocidental assiste, com pasmo, e algum com indisfarçado júbilo, a este espectáculo de fim de mundo, sem perceber nem admitir que estamos em presença de um exorcismo. Com aspectos de revolta infantil, há muito ficcionada pela literatura de vanguarda europeia. É um 5.° acto de Vítor ou os garotos do poder, de Roger Vitrac.
Na verdade, o que se está passadno em França neste pseudo-Maio 68, sem se assumir nos termos ideológicos que foram os dessa época, e sobretudo sendo os seus actores-vítimas a expressão inconsciente disso, é o síndroma de um mal-estar civilizacional e cultural que ultrapassa em muito o caso francês. É mesmo um paradoxo e daí a aura de escândalo (profético) que esta “rebelião sem causa”tenha lugar em França. Sem o saber, os jovens actores desta revolução em bruto, nem sequer anarquizante ou niilista como foram as minorias intelectualizadas do passado, economizam talvez aquele tipo de subversão radical no interior do sistema capitalista com que sonham todos os José Bové do planeta e o alter-mundialismo.
Pela mesma ocasião, reduzem à sua verdadeira dimensão a ameaça real, mas sobretudo cientemente cultivada, de um terrorismo mítico, sem relação alguma com a incapacidade efectiva da nova ordem mundial de aprender e, ainda menos, de dar uma resposta aos problemas insolúveis de uma sociedade indiferente aos danados da terra que, das riquezas e dos sucessos da nossa civilização, só conhecem a sombra televisiva.
Ninguém sabe se a França, surpreendida no seu sono democrático para além do que seria aceitável, desamparada como sociedade atingida no seu mal sonhado sonho multicultural, encontrará a resposta adequada a este desafio inédito. De revoluções tem memória, mas era ela o sujeito por excelência delas. De agressões exteriores também tem a sua conta e ela mesmo deu o exemplo em tempos de epopeia, como tal celebrada. O desafio agora é de outra ordem. É de ordem cultural e supõe uma resposta cultural. De uma percepção de si mesma de um tipo novo. Mas que Cultura está em condições de leccionar a pátria cultural por excelência de si mesma e de outras que durante séculos a imitaram? É em nome dos seus próprios ideais (mesmo se os não recebam em herança) que os jovens depredadores dos vários Clichy de França incendiaram o templo que não lhes reserva o lugar que a pátria igualitária por excelência prometeu à humanidade inteira há mais de 200 anos. Só ela está em condições de compreender, por dentro, o inaceitável. Nem que para isso volte ao ponto zero das suas promessas. Levará tempo a cumpri-las. Mas se não puder, não se imagine que alguém está em condições de as cumprir por ela.
Tempo e Ciência
O caos e a perplexidade não são novos na longa história do conhecimento
6/11/2003
O vertiginoso surto do conhecimento científico, tal como a Modernidade o assumiu, tornou a evidência de que ele era ao mesmo tempo a expressão e o paradigma, intrinsecamente problemática. Ao ponto de exigir como conceito, ou campo adequado para servir de horizonte à sua compreensão, nada menos que a ideia de “caos”.
E aqui importa menos visar o antigo campo unitário do conhecimento científico como objectivamente fracturado por uma pluralidade de saberes todos dignos de ser tidos como científicos pois é esse o estado desses saberes do que a ideia quase ininteligível ou impensável de que devamos renunciar ao antigo conceito de ciência como lugar do saber unificante ao menos, virtualmente de todos os saberes.
Este estado de coisas não só induziu os próprios cientistas, mas sobretudo os epistemólogos a rebater-se sobre a tábua salvadora de uma espécie de “relativismo”, oferecendo a saberes de estatuto similar e, mais ainda, ao saber irredutível ao antigo paradigma da “ciência”, a mesma pertinência. Assim, à caoticidade fáctica dos saberes viria juntar-se uma leitura dela que não estaria longe do niilismo epistemológico. O caos e a perplexidade não são novos na longa história do conhecimento.
Basta o nome de Górgias para o lembrar. Mas o que é novo é que essa tentação do niilismo epistemológico não é de puro recorte especulativo como o da sofística antiga, mas nasce e autojustifica-se a partir da anti-sofística por excelência que é (ou era) a Ciência, tal como de Galileu a Einstein se assumiu e se legitimou.
É por isso que a querela suscitada não por acaso nos EUA difere das perplexidades inerentes ao processo do conhecimento científico que se dirimiam no interior dos pressupostos próprios desse conhecimento. De que lugar é conduzida, ou surge, essa querela? Existe alguma forma de conhecimento em que as questões levantadas pela sua atomização, ao mesmo tempo técnica e prática, encontrem uma compreensão por assim dizer “ultracientífica”, como a História, no séc.XIX, imaginou legitimar-se ou aceder a uma compreensão de si mesma, convertendo-se em Filosofia da História? Em suma, um saber que seja uma espécie de Epistemologia da espistemologia? Ou, em sentido oposto, denegando, de uma vez por todas, ao conceito de Ciência a sua pretensão a paradigma de todo o conhecimento digno desse nome, abdica-se de toda a assimilação da evidência à verdade de tipo científico e confere-se a conhecimentos de outra ordem e, válidos nela, o estatuto de “verdadeiros”, ou, pelo menos, de válidos precisamente no campo que balizam e iluminam?
Na aurora da Modernidade que foi, ao mesmo tempo, a sua época de ouro, Pascal, antecipando Kant e opondo-se ao incipiente totalitarismo cartesiano (ao menos na ordem das realidades susceptíveis de inteligibilidade matemática), aventou a ideia de que a Verdade não é susceptível de uma visão unívoca e virtualmente omnicompreensiva. Em suma, que há ordens de “realidade”e, por conseguinte, maneiras de “compreensão”delas, ontologicamente heterogéneas. Pelo menos duas: uma que releva do espaço e da sua manipulação formal, em princípio infinita e reversível; e outra, do tempo, que também é susceptível dessa compreensão como uma ordem da sucessão, mas não do “tempo humano”que é da ordem do irreversível.
Tempo humano é uma expressão pleonástica. Ele é apenas a sombra congenital do homem como tempo, como realidade em busca de si mesma, mediada pelos outros, pela sociedade no seu conjunto e pela história que ele faz fazendo-se através da sua acção e dos seus sonhos. A “ciência”, o conhecimento o mais preciso e complexo que se pode obter acerca da realidade como real ou virtualmente objectivável, é sua “obra”e não um “Deus ex machina”que lhe ofereceria o conhecimento puro do mundo, deixando-o a ele de fora. E filho da sua liberdade mais alta que não é aquela que imaginariamente se outorga mas a do reconhecimento de uma evidência sem sujeito, de grau diverso, mas jamais fruto do seu querer subjectivo.
A esse título, e remontando ao acto mesmo através do qual o homem “conhece”anterior a toda a objectivação dura desse conhecimento a que se chama Ciência, mas somos nós que a baptizamos não há, vendo bem, razão, mais do que história, e contingente, para a Querela que por causa de um dado conhecimento mesmo o mais incontestável como o da Ciência nós travamos connosco mesmo enquanto sujeitos de outra forma de conhecimento relevando de outra evidência que a meramente intelectual. Na sua ordem não há conhecimento superior ao que como “ciência”se define e se limita. Quando Einstein intuiu imaginou, como ele dizia a sua famosa “teoria” ninguém se podia prevalecer de um conhecimento superior a esse. Mas também na sua ordem, quando Picasso pintava as Demoiselles d’Avignon, nada havia que fosse mais “original”, analogicamente mais verdadeiro que essa imagem, ícone do Homem, num certo tempo e para sempre.