Mais do que um filme on-the-road é um documentário na berma da estrada, onde, por definição, o ponto de partida se confunde com o ponto de chegada. Scro GRA tem como tema genérico e contexto o Grande Raccordo Anulare, o anel rodoviário que circunda a cidade de Roma. Algo mais parecido com a CREL do que com a segunda circular ou a circunvalação. É por isso um filme suburbano, localizado onde o outro cinema não vai. Tão perto e tão longe do Coliseu, da Fontana de Trevi, da basílica de São Pedro. Uma realidade de betão que, por vezes ainda fundida com uma ruralidade esquecida, onde se encontram mundos, universos paralelos, próximos ou distantes, mas também comuns a habitantes de outros subúrbios, que moram nos intervalos entre os viadutos.
Há uma lógica circular, que acompanha a própria estrada, que faz rodar as histórias e as gentes, num constante regresso às mesmas personagens. Acontece com o metaforicamente estimulante homem que tenta gravar o som das árvores – e o que terá a natureza a dizer sobre aquele universo em redor? Também acompanha os paramédicos da ambulância que socorre as vítimas dos excessos no asfalto. Descobre as prostitutas dos subúrbios e as dançarinas que apesar de parecerem não o são (e não querem ser confundidas). Entra em casa e nos bailes da comunidade latino-americana. Descobre um intelectual observador e uma mãe solteira acabada de chegar à nova casa. Entra nas filmagens de uma fotonovela com atores falhados, daqueles que nunca o chegaram a ser. Mostra como os suburbanos se divertem à noite e como ao longe avistam a cidade (cidade onde nós nunca chegamos a ver… nem eles).
Parte do concreto para o geral e do geral para o concreto. E o resultado é um fresco circular, de histórias, vidas, personagens, à margem de qualquer maneira. Foi esse encanto que, surpreendentemente, convenceu o júri do festival de Veneza, atribuindo-lhe o Leão de Ouro. É o quinto documentário de Gianfranco Rossi. Opta por um primado da estética, contrário à linha do documentário cru. Prefere o cuidado da fotografia à brutidão do real, ainda que, como se sabe, a realidade seja suja e bruta.
Sacro SA, de Gianfranco Rossi, 93 min