Na manhã de quinta-feira, 7, não se esperavam grandes surpresas na sala de audiências do Juiz 12 do Juízo Central Criminal de Lisboa, no Campus da Justiça. Aguardava-se a leitura da sentença de mais um julgamento de um caso de vendas de pinturas falsificadas, em que os arguidos são por norma punidos com penas de prisão suspensas. Mas, afinal, o coletivo de juízes exarou um acórdão com o efeito de uma inédita pedrada no charco: condenou o antiquário Francisco Simões da Cunha e o comerciante de arte Joaquim Pinto dos Santos, ambos do Porto, a sete e seis anos de prisão, respetivamente.
O esquema dos traficantes começou a correr mal em novembro de 2011, quando o pintor José de Guimarães soube que uma falsificação de um quadro seu tinha sido vendida. Apresentou uma queixa-crime e a PJ iniciou a investigação. E o novelo era longo.
No final, comprovou-se a venda de oito quadros fraudulentamente atribuídos a José de Guimarães, com assinaturas e certificados do pintor falsificados. E uma pintura falsa de Cesariny foi vendida… duas vezes – na primeira por €7 500 e na segunda por €5 200. O primeiro comprador, às tantas, começou a ter dúvidas sobre a autenticidade do quadro. Francisco Cunha, o antiquário, dispôs-se a desfazê-las, levando a “obra”, com a autorização do comprador, à peritagem de um especialista. Na verdade, o que fez foi vendê-la uma segunda vez a outro comprador… Lucro a dobrar.
Nas contas finais, estima-se que as burlas de Joaquim Santos, 48 anos, e Francisco Cunha, 71, lhes tenham rendido cerca de 150 mil euros. Agora, o tribunal impôs-lhes o pagamento a José de Guimarães de uma indemnização por danos patrimoniais de €135 941,08, a que acresce outra, por danos morais, de €10 743,87.
Nestas histórias há sempre um morto – e o caso que aqui se relata não é exceção. O arguido Joaquim Santos alegou em tribunal que as obras de José de Guimarães em causa lhe foram entregues por um industrial de panificação do Porto, que também era colecionador e comerciante de arte, para que as colocasse no mercado e as vendesse. Esse indivíduo, argumentou, assegurou-lhe que as pinturas eram autênticas.
O referido industrial/colecionador morreu em março de 2008. E, em tribunal, a viúva e a sua filha garantiram que nunca o viram na posse das obras de José de Guimarães em questão no processo – e que nem as tiveram na casa familiar, onde o homem gostava de expor os quadros que adquiria. Xeque-mate.
Ambos os arguidos recorreram das condenações para a Relação de Lisboa. Mas só Joaquim Santos ficou em liberdade provisória. O antiquário Francisco Cunha voltou para a cadeia do Porto onde, desde julho de 2018, cumpre, em cúmulo jurídico, uma pena de dez anos de prisão, que remete para diversas condenações por burlas, que começaram em 2003.