O cinema português dificilmente terá dinheiro para fazer um filme catástrofe, ao estilo das grandes produções norte-americanas, ou de M. Night Shyamalan, para retratar um previsível grande tremor de terra em Lisboa. A engenhosa solução de Rita Nunes foi criar um filme pré-catástrofe – em vez de filmar o fim do mundo, mostra-nos as peripécias antes de lá chegarmos. O percurso torna-se mais interessante do que o final apocalíptico.
Ouvimos há décadas cientistas a avisarem de que um grande terramoto, com magnitude semelhante ao que destruiu a cidade em 1755, voltará acontecer um dia. Só não sabemos quando. O assunto, no entanto, tornou-se uma espécie de tabu da sociedade portuguesa. Não se tomam as necessárias medidas de prevenção nem se fala muito sobre isto, exceto quando há pequenos sustos como o que aconteceu no final deste verão com um sismo de magnitude 5.6 sentido por muitos. Mas os sismos não fazem parte do nosso quotidiano, como acontece com os japoneses ou os californianos.
Rita Nunes evita o cinema sensacionalista, o que seria de extremo mau gosto. Coloca, antes, o acento tónico nos cientistas, um pouco como fez (numa parábola primária) Adam McKay em Não Olhem para Cima. Só que não confronta a Ciência com um negacionismo oficial. Encontra o conflito no filme dentro da própria Ciência: na capacidade de antecipação do sismo e na sua fiabilidade, bem como no peso das decisões políticas e sociais que daí advêm. O filme esforça-se por ser cientificamente rigoroso e essa é uma das suas virtudes.
Tal como acontecia na sua obra anterior, O Melhor dos Mundos não tem o fôlego de uma grande obra de cinema de autor, tornando-se limitado em alguns aspetos da linguagem cinematográfica. Contudo, é bem conseguido enquanto filme de argumento, sabendo colocar momentos de tensão no sítio certo e não se desviando de uma ideia de futuro iminente e realista, numa ficção verdadeiramente científica e não fantasiosa. E não deixa de ser um ato de coragem, pela forma sóbria e destemida como aborda um tema que, apesar de ser evidente, tem sido evitado.
O Melhor dos Mundos > De Rita Nunes, com Sara Barros Leitão, Miguel Nunes, Ivo Alexandre, Daniel Viana > 70 min