Em Dor e Glória (2019), Pedro Almodóvar devolvia Antonio Banderas ao seu cinema, com uma interpretação visceral, cheia de traços autobiográficos, fazendo um dos melhores filmes da sua carreira. Em Mães Paralelas, em menor medida, faz o mesmo com Penélope Cruz. E, apesar de não ser superior à sua última longa, este talvez seja o mais almodovariano dos filmes de Almodóvar, pelo menos desde Volver.
É almodovariano para começar no estilo da intriga. Embora se trate de um drama, em Almodóvar, géneros aparentemente antagónicos atravessam-se com naturalidade. Aqui, o realizador espanhol usa, sem pudor, ingredientes típicos da comédia, como os jogos de coincidências ou um sentido melodramático que se pode tornar irónico, para construir o trágico.
Ao contrário do que acontecia em Dor e Glória, em Mães Paralelas estão de volta as magníficas personagens femininas, que sempre nos seduziram, e atrizes a condizer. Assim acontece no eixo Penélope Cruz, uma mãe tardia e abandonada, e Milena Smit, atriz-revelação que Almodóvar trouxe das séries, no papel de uma jovem mãe, vítima de violação. Mas também encontramos, de novo, a insuperável Rossy de Palma, a mais almodovariana de todas.
O tema-base é a maternidade, mas a maternidade associada à questão da identidade. E um dos pontos mais interessantes do filme é a forma como, em pano de fundo, numa segunda linha narrativa, se constrói outra, em volta dos fantasmas ou destroços da guerra civil. Feridas que, ainda hoje, Espanha tem dificuldades em sarar ou encarar. Desenterram-se as ossadas de um massacre coletivo num pueblo remoto, em busca dos corpos dos antepassados. Aqui, como as mães, as personagens procuram-se a si próprias, em busca da verdade sobre os seus ascendentes ou descendentes. Querem saber quem são.
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Mães Paralelas > De Pedro Almodóvar, com Penélope Cruz, Milena Smit, Rossy de Palma, Aitana Sánchez-Gijón > 123 min