Não vem mal maior ao mundo quando um filme é “panfletário”, se as causas forem justas. É esse o caso de Da 5 Bloods, o primeiro filme de Spike Lee depois de finalmente ter sido reconhecido com um Oscar, com estreia exclusiva na Netflix. Da 5 Bloods é um Spike Lee atípico. Logo à partida, porque decorre fora do território norte-americano. O realizador desloca a ação para o Vietname, num filme pós-guerra em que ressoam traumas, passando sempre pela discriminação racial (como em todas as guerras travadas pelo Estados Unidos, os negros estiveram na linha da frente).
O filme obedece a uma estrutura parecida com a do western clássico de John Huston O Tesouro de Sierra Madre (1948), em que as personagens partem em busca de um tesouro perdido e acabam desvirtuadas e amaldiçoadas pela cobiça. Aqui, ao mesmo tempo que se defrontam com os seus fantasmas, vão traindo os seus próprios ideais, encarnados na personagem mítica de Norman, o quinto irmão, morto em combate, retratado como um Che Guevara afro-americano.
O enredo tinha todos os elementos para resultar num filme grandioso e eloquente. Contudo, falta-lhe, por um lado, a dimensão artística – Spike parece trabalhar deliberadamente para o pequeno ecrã, sem aprimorar o sentido estético, apesar de ter uma marcante linguagem de montagem em que intercala imagens de arquivo. Por outro lado, falta-lhe elegância na exposição dos argumentos, colocando na voz das personagens o discurso ideológico de forma ostentada, em vez de deixar que a história fale por si. Isto, junto com as personagens estereotipadas, torna Da 5 Bloods cinematograficamente uma desilusão, distante da frescura de Não Dês Bronca (1989) e sem o rasgo de BlacKkKlansman: O Infiltrado (2018).
Salva-se pela pertinência e atualidade do discurso. Spike Lee, de resto, até conseguiu incluir aqui referências ao movimento Black Lives Matter. É o cinema em direto.
Da 5 Bloods > De Spike Lee, com Delroy Lindo, Jonathan Majors, Clarke Peters > 154 min > Netflix