1. Paradaise
Fernanda Melchor
Repugnância, desalento, aflição. Segundo livro da mexicana Fernanda Melchor (n. 1982) a ser traduzido para português, nova avalanche de emoções, em quase tudo semelhante à provocada pela primeira obra, Temporada de Furacões, vencedora do Prémio Literário Casino da Póvoa em 2024. Em Paradaise, há Polo e Frank, uma dupla improvável de desintegrados, que se junta a engendrar um plano macabro com tudo para ser um insucesso.
O primeiro é um jardineiro contrariado, de mal com a vida e com muita sede de álcool (e de afeto), desejando por todos os meios encontrar uma saída para a vida miserável que lhe calhou. “E como é que fugiria daquilo, porra? Também não lhe ocorria nada. Não tinha nada, não possuía nada de seu”, lê-se, a meio do romance, este desespero sentido em toda a obra. Frank é o rapaz gordinho e malcriado, o neto castigado de um casal de avós ricos, que vivem no condomínio de luxo Paradaise, sexualmente obcecado por uma vizinha mais velha. A povoar esta história, que se lê num sopro, culpa de uma escrita ansiosa e pontuada de impropérios, os temas da pobreza, da diferença de classes, da violência. Elsinore, 136 págs., €16,65
2. A Fraude
Zadie Smith
Um novo romance de Zadie Smith é sempre um acontecimento editorial, sobretudo quando se trata de um livro há muito aguardado (a sua última ficção era de 2016). Além disso, A Fraude não deixará de surpreender os leitores. Se em obras anteriores a escritora inglesa, uma das mais destacadas da sua geração, se centrava no seu tempo, agora oferece-nos um retrato do final do século XIX, através da sedutora reconstituição de um julgamento (uma pessoa fez-se passar pelo herdeiro de uma enorme fortuna) que teve como principal testemunha um homem que cresceu como escravo na Jamaica. Pelo meio há dois escritores em confronto, Charles Dickens, que a literatura celebrou, e William Harrison Ainsworth, que o esquecimento devorou. D. Quixote, 536 págs., €24,90
3. Quando as Montanhas Cantam
Nguyên Phan Quê Mai
Pelos meios ao dispor e por uma hegemonia também cultural, durante muitos anos a Guerra Vietname foi contada em narrativas americanas, o que não deixou de ser uma contradição. Entre outras dimensões, a crescente publicação de romances de escritores vietnamitas tem proporcionado um contacto mais direto com o outro lado, com quem lá estava antes (vítima de outras guerras) e com quem lá ficou depois (com um país para reconstruir). É tudo isso que Nguyên Phan Quê Mai nos oferece em Quando as Montanhas Cantam, o seu primeiro romance publicado em Portugal. A escritora, nascida em 1973, podia ser a neta, no livro, que ouve a história da avó. Uma saga familiar igual a tantas outras, única pela resiliência vivida por tantos. Alma dos Livros, 360 págs., €19,45
4. As Pequenas Chances
Natalia Timerman
Na onda dos livros de autoficção, chega a Portugal o último romance da brasileira Natalia Timerman, psiquiatra, psicoterapeuta, crítica literária e também escritora. Parte de um inesperado encontro no aeroporto entre a protagonista e o médico de cuidados paliativos do seu pai, e viaja até às semanas da doença, à ansiedade dos últimos dias e à vivência do luto. E eis que, num rumo pouco óbvio, esta ideia de procurar novas versões do passado, para manter viva a história desse alguém que partiu, leva a autora a investigar as raízes da comunidade judaica na Europa de Leste, de onde os seus bisavós partiram para o Brasil, há mais de 100 anos. Uma viragem interessante, que alimenta bem uma história, descobre-se no final, com um quê de criação literária. Tinta-da-china, 216 págs., €15,90