Um estudo desenvolvido pelo laboratório Cold Spring Harbor, em Nova Iorque, concluiu que o sistema imunitário dos morcegos da fruta jamaicanos (Artibeus jamaicensis) e dos morcegos bigodudos da Mesoamérica (Pteronotus mesoamericanus) está mais bem preparado do que o organismo humano na defesa contra algumas doenças. Os morcegos são uma espécie já muito estudada pela comunidade científica pelas suas características invulgares – por exemplo, são os únicos mamíferos capazes de voar e possuem uma longevidade maior que muitos animais do seu tamanho. Agora uma investigação científica publicada na revista Genome Biology and Evolution, mostra como o seu sistema imunitário os protege de desenvolver cancro e previne infeções por vírus – como a Covid-19 e o Ébola.
Ao analisar amostras recolhidas em Belize, a equipa de investigadores descobriu que as duas espécies de morcegos possuem uma sequência de genomas simplificada que as protege de doenças e infeções, resultado da sua rápida evolução. Através da tecnologia de sequenciação, Oxford Nanopore os especialistas foram capazes de sequenciar genomas de ambos os tipos de morcegos e de comparar o seu material genético ao de outros mamíferos – incluindo humanos.
A comparação entre as sequências levou à descoberta de discrepâncias entre os genes codificadores de proteínas inflamatórias dos morcegos e outros mamíferos. Através dos dados obtidos, os especialistas concluíram que ambas as espécies de morcegos possuem uma baixa produção de interferons – uma proteína produzida pelas células quando infetadas por um vírus. Estes genes agem como um alerta ao sistema imunitário e despertam as defesas naturais do organismo. Deste modo, ao não produzirem interferons, os cientistas acreditam que os sistemas imunitários “invulgares” destes morcegos desenvolveram uma maior tolerância à presença de vírus.
“Não sabíamos que os genes do sistema imunitário eram tão positivamente selecionados nos genomas dos morcegos. Os morcegos têm uma série de coisas muito invulgares. Não reagem às infeções da mesma forma que nós. Em retrospetiva, não é surpreendente que esta diferença no sistema imunitário possa estar envolvida tanto no envelhecimento como na resposta ao cancro”, explicou W. Richard McCombie, um dos autores envolvidos no estudo.
Para além disso, os investigadores concluíram que os genomas dos morcegos possuem ainda mudanças genéticas relacionados com o cancro, incluindo seis genes de reparação de ADN e 46 supressores de tumores. “O nosso trabalho mostra como a imunidade e a resposta ao cancro estão profundamente interligadas. Os mesmos genes e proteínas imunitários desempenham papéis importantes na resistência ao cancro”, contou Armin Scheben, um dos investigadores do estudo.
Os especialistas esperam agora estudar a forma como funcionam estes genes imunitários nos organismos dos morcegos, de forma a explorar se podem vir a ser úteis para o tratamento de cancro e vírus em seres humanos.