Depois de cinco semanas em declínio, as infeções por SARS-CoV-2 voltaram a subir em todo o mundo, sobretudo em países europeus como a Suíça, Grécia, Itália, França, Áustria e Alemanha. A subida pode ser menos abrupta e evidente do que aquela provocada pelo aparecimento da variante Ómicron, em dezembro de 2021, mas está lá.
Há cerca de três semanas, o número diário de novos casos de Covid-19 no Reino Unido deu uma reviravolta, impulsionado pela linhagem BA.2 da variante Ómicron. Em Portugal, onde, na semana passada, a média diária de novas infeções situou-se acima das 11 mil e registaram-se 123 mortes, esta linhagem já é responsável por 82% dos casos.
Se, até agora, não há razão para acreditar que a nova subvariante cause doença mais grave ou tenha maior capacidade de invadir o sistema imunitário, o epidemiologista da Faculdade de Ciências da Universidade de Lisboa, Manuel Carmo Gomes, sublinha que a BA.2, apesar de não ser mais contagiosa, tem um“serial interval” menor que a BA.1.
“O serial interval é o tempo médio que decorre entre o início dos sintomas num positivo e o início dos sintomas em alguém que este contagiou”, explica o especialista. Um estudo inglês mostrou que uma pessoa infetada com a variante Ómicron demora, em média, 3,72 dias até infetar outra, enquanto que uma pessoa infetada com a sub-variante BA.2 vê este tempo reduzido para 3,27 (cerca de menos 12 horas).
Não acho que isto seja muito preocupante. O que acontece é que a Ómicron está-nos a imunizar a todos com imunidade natural, até mesmo àqueles que tinham tido infeções anteriores
manuel carmo gomes – epidemiologista
“Não acho que isto seja muito preocupante. O que acontece é que a Ómicron está-nos a imunizar a todos com imunidade natural, até mesmo àqueles que tinham tido infeções anteriores”, defende, porém Manuel Carmo Gomes. “Pode acontecer que venha a haver uma subida em alguns países, nunca com a amplitude que observamos em janeiro deste ano, mas não muito mais do que isso”, assegura o epidemiologista.
É normal que os casos subam e desçam
De resto, Carmo Gomes sublinha que as subidas e descidas destas marés de ondas pandémicas são uma dinâmica comum sempre que temos um agente infeccioso que se transmite com muita rapidez.
“Quando o agente patogénico chega à população, consome toda a gente que pode ser infetada e depois fica sem gasolina, não há mais gente para infetar e temos uma queda rápida dos casos”. É por isso que, segundo o epidemiologista, olhando os gráficos com os casos de Ómicron, há um disparo repentino “que depois cai por aí abaixo”.
Depois desta primeira fase, quem pode ser infetado, mas ainda não o foi por ter estado mais resguardado, começa a expor-se e a voltar à vida normal, acabando por ser infetado e contribuindo para um novo disparo no número de casos. “É por isso que não me espanta que isto esteja a acontecer em muitos países da Europa”, afirma o especialista sublinhado ainda que, “normalmente, a segunda subida nunca é tão alta como a primeira”.
Mortes e internamentos
De qualquer forma, o crescimento do número de novos casos poderá ter algum impacto a nível dos internamento hospitalares. Se o Reino Unido já está senti-lo, Portugal, que se encontrava em descida, “agora estabilizou”, com cerca de 1100 pessoas na enfermaria e 60 nos Cuidados Intensivos.
Ainda assim, No nosso país, os internamentos estão sob controle e abaixo de uma situação limite. “O risco de internamento neste grupo etário [mais de 80 anos], para quem tem dose de reforço, é 3,7 vezes menor do que o risco de internamento de quem tem vacinação completa”, sublinha o relatório das Linhas Vermelhas.
Quanto à caracterização demográfica daqueles que acabam por sucumbir à doença, não há novidade. A esmagadora maioria (112 óbitos) foram pessoas com mais de 70 anos. O aumento de óbitos nesta faixa etária deve-se, segundo Carmo Gomes, ao aumento do número de infeções entre os mais velhos. “Se até há três dias, o número de mortes por milhão de habitantes vinha a descer, agora parou nos 25 por milhão”.
Quarta dose de vacina?
Com 95% destas faixas etárias vacinadas, por agora não há uma decisão quanto à administração de uma eventual quarta dose de vacina, a qual está a ser dada apenas a doentes com imunossupressão grave.
Nos Estados Unidos da América, a Pfizer já pediu autorização para avançar com a administração da quarta dose a maiores de 65 anos, apresentando dados de Israel, onde esta já é dada a pessoas com mais de 60 anos, imunodeprimidos, trabalhadores da área da saúde ou cuidadores de idosos.
Os resultados de um estudo israelita mostram que a quarta dose aumenta as defesas contra a Ómicron, mas ainda é tudo muito incerto quanto à duração desse aumento e o impacto nas hospitalizações.