Um recente estudo publicado na revista Circulation defende que a redução de 20% do açúcar presente em alimentos embalados e de 40% do açúcar nas bebidas prevenir 2,48 milhões de episódios de doenças cardiovasculares (como AVC, ataques cardíaco e paragens cardíacas), 490 mil mortes por causas cardiovasculares e 750 mil novos casos de diabetes só nos Estados Unidos.
Apesar de a investigação se ter focado no panorama norte-americano, facilmente poderá servir de espelho à realidade de outros países, uma vez que o consumo de alimentos processados, pré-confecionados e bebidas açucaradas é há muito associado a maus hábitos alimentares que contribuem para as chamadas doenças civilizacionais, como é o caso da obesidade, da diabetes e da hipertensão – todas elas com impacto na saúde e qualidade de vida das pessoas, mas também com peso nos sistemas de saúde.
Reduzir a quantidade de açúcar das receitas dos alimentos embalados (como bolachas, bolos, sobremesas, refeições pré-confecionadas, etc.) e das bebidas pode ser um primeiro passo para a adoção de novos hábitos e prevenção de doenças, defendem os autores do estudo conjunto levado a cabo pelo Massachusetts General Hospital, pelo Escola de Ciência e Política da Nutrição da Universidade Tufts, pela Escola de Saúde Pública de Harvard e pelo Departamento de Saúde e Higiene Mental de Nova Iorque.
“Reduzir o teor de açúcar em alimentos e bebidas preparados comercialmente terá um impacto maior na saúde dos americanos do que outras iniciativas para cortar o açúcar, como a imposição de um imposto sobre o açúcar, rotulando o teor de açúcar adicionado ou proibindo bebidas açucaradas nas escolas”, revela Siyi Shangguan, autor principal e médico assistente do Massachusetts General Hospital.
A luta portuguesa contra o açúcar
Portugal tem atacado em todas as frentes para incentivar um menor consumo de açúcar por parte da população. O foco é concreto: combater a obesidade (em 2019, 1,5 milhões de portugueses tinha obesidade e 4,6 milhões apresentava excesso de peso) e promover hábitos alimentares saudáveis como promotores de saúde.
Além do imposto sobre as bebidas açucaradas, que entrou em vigor em 2017, a gramagem do açúcar presente nos pacotes de uso único tem vindo a baixar e desde 2020 que não pode ser superior a quatro gramas por unidade. Este ano, alguns alimentos passaram também a ser proibidos nos buffets e refeitórios das escolas, como é o caso de “bolos ou pastéis com massa folhada e/ou com creme e/ou cobertura, como palmiers, jesuítas, mil-folhas, bolas de Berlim, donuts, folhados doces, croissants ou bolos tipo queque”.
Uma vez que se trata de medidas recentes, ainda não é possível tirar grandes conclusões sobre o impacto que estão a ter, sobretudo na saúde e no combate ao excesso de peso. Mas os números que vão sendo apresentados sobre o consumo são positivos: um ano depois de ter entrado em vigor o chamado ‘Imposto Coca-Cola’, o consumo de açúcar no País baixou 5630 toneladas.
Em 2019, o estudo do Observatório da Sociedade Portuguesa da Universidade Católica revelou que 41,1% dos participantes reduziram o consumo destas bebidas e que cerca de 10% deixaram de as consumir por completo. Segundo o relatório de 2020 do Programa Nacional de Promoção da Alimentação Saudável (PNPAS), verificou-se uma “diminuição de cerca de 15% do total de vendas das bebidas enquadradas no imposto, no período de 2017-2020”.
Além de dar a conhecer os novos hábitos e escolhas dos portugueses no que diz respeito às bebidas açucaradas, o estudo da Universidade Católica indicava ainda que estavam dispostos a aceitar um imposto sobre outros alimentos, como gelados, enchidos e batatas fritas de pacote. E este poderia ser um dos caminhos a seguir, tal como a subsidiação de alimentos saudáveis e promotores de saúde, incentivando ao maior consumo dos mesmos, defende Alexandra Bento, bastonária da Ordem dos Nutricionistas.
“É evidente que as estratégias de preços são muito importantes, aliás, o preço é um dos determinantes para a compra. Há um conjunto de estudos que falam também de estratégias de subsidiação, assim como foi taxado o açúcar nos refrigerantes, também podemos subsidiar produtos alimentares, como é o caso das frutas e hortícolas, cujo consumo deve ser aumentado por parte da população. Se nós taxamos alimentos e, de facto, estamos a taxá-los por uma questão de saúde, então também podemos subsidiar outros também por uma questão de saúde”, sugere Alexandra Bento, em declarações à VISÃO a propósito do impacto das más escolhas em determinadas doenças, como o cancro.
O chamado ‘Imposto Coca-Cola’ engloba bebidas com adição de açúcar ou outros edulcorantes nas suas receitas e concentrados destinados à preparação de bebidas.