Durante o fim de semana que deu início ao processo de vacinação de adolescentes entre os 12 e os 15 anos, foram registados dezenas de casos de desmaios e síncopes de jovens nas salas de recobro, após a administração da vacina contra a Covid-19.
Os números oficiais ainda não foram divulgados pela Task Force, mas a situação é potencialmente assustadora para os pais e para quem possa estar nos recintos de vacinação. No entanto, garantem os médicos e especialistas contactados pela VISÃO, estas síncopes (“desmaios”, com perda de consciência transitória), lipotimias (“pré-desmaios”, sem perda de consciência) ou sensação de perda de equilíbrio nada têm que ver com a inoculação ou com a substância administrada.
Susana Lopes da Silva, professora especialista em imunoalergologia e membro consultivo da Comissão Técnica de Vacinação contra a Covid-19, sublinha que “é muito importante reforçar que as reações alérgicas às vacinas, incluindo às vacinas contra a COVID 19 são eventos muito raros”. “Sabemos que as reações alérgicas graves às vacinas estão globalmente estimadas em 1,31 por cada milhão de administrações. Da nossa experiência com a população adulta já vacinada com as vacinas anti-COVID, observámos que, apesar de inicialmente se ter pensado que a incidência de reações alérgicas graves seria muito superior, este facto não se tem verificado. Por outro lado, existe uma grande proporção de reações às vacinas e que podem ocorrer ainda nos primeiros 15-30 minutos, durante o período de vigilância, que não são alérgicas mas que se associam a fatores como o stress, a ansiedade ou mesmo eventualmente à dor associada à vacinação”, explica.
Acresce o aumento da temperatura das últimas semanas, a espera, a hidratação incorreta e outros fatores que facilitam reações chamadas vagais, que podem levar a sensação de desmaio ou mesmo desmaio. “Este quadro pode ser aparatoso, mas é uma situação autolimitada, que se resolve rapidamente e não deixa qualquer sequela. Observamos, às vezes, que depois de uma destas reações, se sucedem outras semelhantes nos indivíduos que a presenciaram…”, acrescenta a especialista.
O pediatra Mário Cordeiro, que também teve conhecimento de várias situações, tranquiliza os pais: “são uma situação normal sem motivo para preocupação”. “As reações vagais são motivadas por stress e ansiedade, quebras de açúcar ou calor são algo que acontece com alguma frequência nestas idades, e sobretudo no verão. Fora das situações de vacinas, é comum por exemplo nos centros comerciais, nas igrejas, nas praias”. A ocorrência pode ser assustadora, mas na grande maioria dos casos não tem quaisquer consequências – estas podem advir das quedas. “Uma vez em posição horizontal, o sangue flui novamente para o cérebro e as crianças ficam muito rapidamente bem”, explica o pediatra.
Fonte oficial do Infarmed sublinha à VISÃO que estes eventos são bem conhecidos como estando associados a processos de vacinação em geral e não a uma vacina em particular e que constam já da informação de todas as vacinas contra a COVID-19.O
São reações psicogénicas muitas vezes associadas à vulgarmente designada “fobia de agulhas” ou ao stress associado a todo o processo de vacinação, e que é particularmente observável em jovens. Um estudo de 2008 realizado no sistema de notificação espontânea norte-americano de apoio à segurança das vacinas (VAERS) calculou que 62% dos casos de síncope associados à vacinação e notificados entre 2002 e 2007 foram em indivíduos pertencentes ao grupo etário entre os 11 e os 18 anos.
Segundo o Infarmed, a sua ocorrência é agora ainda mais frequente, uma vez que a vacinação contra a COVID-19 ocorre numa escala muito alargada (sem precedentes na história da vacinação), com os jovens a participarem em grupo (a maioria dos processos de vacinação são individualizados), em espaços abertos, e onde muitos dos utentes se apercebem da ocorrência de situações de stress com outros vacinados e eles próprios ficarão mais sugestionados para estas ocorrências (são fenómenos já observados em Portugal e no mundo inteiro).
Já em meados de Julho, Georgy Genov, responsável de farmacovigilância da Agência Europeia do Medicamento, confirmou que “não é invulgar, entre os jovens, observarem-se episódios de síncope ou desmaio como efeitos secundários da vacinação”.
“O questionário que é administrado antes da vacinação pretende identificar as situações que sabemos estarem efetivamente associadas a um maior risco de reação alérgica grave e esses jovens serão referenciados para administração hospitalar da vacina. É fundamental que as famílias estejam tranquilas e que esse estado de confiança seja transmitido aos adolescentes”, destaca Susana Lopes da Silva.
O que é uma reação vagal?
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As reações vagais são perdas de consciência súbitas e transitórias, motivadas por uma redução do fluxo de sangue para o cérebro. Acontece quando há uma diminuição da pressão arterial por um estímulo fora do comum do nervo vago, um nervo que liga o cérebro ao estômago, e cumpre uma função essencial para regular funções vitais.
As causas que motivam esta reação vagal, ou desmaio, podem ser diversa ordem, mas os mais comuns são o stress ou ansiedade, medo, dor ou alterações de temperatura. Antes da síncope, os pacientes podem sentir-se com fraqueza, calores e suores frios, náuseas, palidez, tontura, palpitações ou visão turva.
Normalmente, basta a colocação na posição horizontal para que a situação melhore e a pessoa recupere os sentidos. Ao deitar-se a pessoa, o sangue circula rapidamente por todo o corpo, o que permite compensar a queda da pressão arterial e reduz a sensação de mal-estar.
Os profissionais de saúde que acompanham os utentes nos centros de vacinação contra a COVID-19 estão especialmente alerta para estas ocorrências e sabem como proceder para prevenir lesões traumáticas daí decorrentes (por ex., vacinar os utentes na posição sentada ou deitada, tranquilizá-los durante o procedimento, observar os vacinados num período de 30 minutos após a vacinação) e para garantir a sua rápida recuperação, assegura fonte oficial do Infarmed.
O Infarmed e a Agência Europeia de Medicamentos fazem regularmente análises do padrão quantitativo e qualitativo de todas as notificações de reações adversas às vacinas contra a COVID-19 (bem como dos restantes medicamentos), agindo com prontidão sempre que algum aspeto irregular é detetado.