A pandemia de Covid-19 começou há pouco mais de um ano, mas desde o seu início que milhares de investigadores têm compilado e analisado ao pormenor – através do rastreamento de dados – as políticas governamentais adotadas por cada país para a conter. O objetivo é perceber quais delas foram e são mais eficazes e, no futuro, conseguir, até, comparar a situação entre países onde foi adotada ou não determinada estratégia.
Muitas equipas têm feito um trabalho árduo de rastreamento de dados em todo o mundo e, na última semana, vários dos investigadores envolvidos nesta análise reuniram-se em conferência para discutir os progressos feitos e o que deve continuar a ser feito no futuro. “Só no nosso rastreador estiveram envolvidos mais de 40 cientistas e voluntários na atribuição de códigos a mais de 11 mil medidas adotadas em 57 países”, explica à Nature Peter Klimek, físico do Complexity Science Hub Vienna, na Áustria, e da Universidade Médica de Viena, e um dos envolvidos neste grande projeto, referindo que existem muitos outros rastreadores, cada um com centenas de voluntários e investigadores.
Em relação às maiores dificuldades na realização desta grande análise, Klimek fala da falta de financiamento em alguns rastreadores, que acabaram por desistir do projeto. Mas, de acordo com o físico, manter os voluntários motivados também tem sido uma tarefa árdua. “Para alguns, rastrear o impacto das medidas de contenção da Covid-19 é uma forma de lidar com o stress da pandemia”, explica o físico. “Mas quando alguém se demite, perdemos o que conseguimos até então e podem ocorrer atrasos na disponibilidade de dados em algumas regiões”, refere.
Com os dados disponibilizados até agora, os cientistas têm percebido que a adoção de medidas como o recolher obrigatório e o encerramento de escolas, lojas e restaurantes têm estado, no geral, entre as mais eficazes. Mas entre os diferentes rastreadores há várias discordâncias no que diz respeito à classificação da eficácia das medidas, por exemplo. “Não é certo que medidas altamente restritivas sejam automaticamente mais eficazes do que uma adoção conjunta e inteligente de restrições mais modestas”, refere o físico.
Além disso, há outros fatores que devem ser analisados quando se fala da eficácia ou não de uma certa medida adotada num país. “Por exemplo, fatores socioculturais podem tornar o distanciamento físico mais eficaz num país do que noutro”, explica Klimek. A tarefa dos cientistas tem-se tornado ainda mais exigente ao longo do tempo, porque as vagas da pandemia têm sido completamente diferentes, as medidas adotadas pelos governos foram-se diversificando muito e as pessoas começaram a aderir cada vez menos às restrições, apesar do surgimento das novas variantes do coronavírus.
“Precisamos de intensificar as nossas atividades de rastreamento, mesmo que essa tarefa se revele cada vez mais assustadora”, diz o físico.
Klimek explica que ainda não foi encontrada a melhor forma de traduzir os dados dos sistemas de rastreamento em modelos matemáticos, mas acredita que os rastreadores são “um tesouro único” que podem ser muito úteis na preparação da próxima pandemia. Mas, então, porque não juntar todos os rastreadores?
“Cada rastreador tem os seus próprios aspetos e perspetivas”, explica Klimek, referindo que eles integram dados de diferentes bancos. “Do ponto de vista da qualidade dos dados e dos seus resultados, juntar rastreadores num super banco de dados não é boa ideia”, garante o matemático, que diz que a melhor forma de conseguir prever quais são as medidas e estratégias governamentais mais eficazes é “continuar a usar todos os rastreadores durante o maior tempo possível”. Mas é importante que os rastreadores registem todas as políticas adotadas para que haja dados confiáveis com qualidade.