“Este relatório é um apelo para acelerar em massa os esforços climáticos de todos os países e setores e em todos os prazos. O nosso mundo precisa de ação climática em todas as frentes: tudo, em todos os lugares, ao mesmo tempo.” Foi assim que António Guterres, Secretário-Geral das Nações Unidas, resumiu o Sexto Relatório de Avaliação do Painel Intergovernamental para as Alterações Climáticas (IPCC), instituição que trabalha sob a égide da ONU.
O relatório final, que demorou oito anos a fazer, tem milhares de páginas de análise de estudos científicos, pelo que cabe ao sumário para policy makers (responsáveis pela implementação de políticas) explicar ao mundo o estado da arte da ciência climática. Este sumário foi apresentado ao público na segunda-feira, 20, e traz más notícias: é praticamente garantido que não conseguiremos limitar o aumento de temperatura a 1,5º C e muito dificilmente ficaremos abaixo dos 2º C, até ao final do século, respetivamente as metas ideais e máximas do Acordo de Paris. Aliás, avisam os cientistas, o aumento de 1,5º C deverá ser atingido já nos próximos dez anos. O aumento previsto para este século é, para já, de 2,8º C – isto se forem implementadas todas as medidas climáticas a que os países se comprometeram até 2030.
“As alterações climáticas são uma ameaça ao bem-estar humano e à saúde planetária”, lê-se no sumário. “Há uma janela de oportunidade que se está a fechar rapidamente para garantir um futuro habitável e sustentável para todos.” São afirmações surpreendentemente contundentes, para um relatório que passa por um crivo político que tende a suavizar a linguagem.
Estas são as principais conclusões das 36 páginas do relatório-síntese.
. Há evidências de alta confiança que as atividades humanas causaram inequivocamente aquecimento global, sobretudo pela emissão de gases com efeito de estufa. A temperatura média global da atmosfera entre 2011 e 2020 foi 1,1º C acima da média 1850-1900.
. Já ocorreram mudanças generalizadas e rápidas na atmosfera, no oceano, na criosfera e na biosfera. Essas mudanças causadas pelo Homem estão a afetar muitos eventos meteorológicos e extremos climáticos em todas as regiões do globo, com impactos adversos generalizados e perdas relacionadas e danos à natureza e às pessoas.
. As comunidades que historicamente contribuíram menos contribuíram para as alterações climáticas são afetadas de forma desproporcional; os recursos financeiros aplicados na adaptação às alterações climáticas são insuficientes, sobretudo nos países em desenvolvimento.
. As Contribuições Nacionalmente Determinadas (medidas a que cada país se comprometeu) implementadas até 2030 tornam provável que o aumento de 1,5º C seja ultrapassado durante este século; dificilmente o aumento ficará abaixo de 2º C.
. Muitos dos riscos climáticos são maiores do que os prognosticados pelo anterior relatório do IPCC, finalizado em 2014. Os impactos de longo prazo projetados são várias vezes maiores do que os observados atualmente.
. Prevê-se uma interação entre riscos climáticos e não climáticos que irão criar riscos em cascata complexos e de difícil resolução.
. Todas as regiões do mundo deverão enfrentar novos aumentos nos riscos climáticos a curto prazo, tanto para os ecossistemas como para os humanos. Esses perigos e riscos associados incluem um aumento da mortalidade e morbilidade humana causada pelo calor, de doenças transmitidas por alimentos, água e vetores, de desafios de saúde mental, de inundações em regiões do litoral, perda de biodiversidade em ecossistemas terrestres, de água doce e oceanos e uma diminuição na produção de alimentos em algumas regiões.
. Algumas alterações são já inevitáveis e/ou irreversíveis, mas podem ser limitadas por mudanças profundas, rápidas e redução sustentada das emissões globais de gases com efeito de estufa. A probabilidade de ocorrência abrupta e/ou irreversível sobe com os níveis de aquecimento global mais elevados.
. As opções de adaptação atualmente viáveis sê-lo-ão cada vez mais restritas e menos eficazes com o aumento do aquecimento; as perdas e danos aumentarão e os sistemas humanos e naturais adicionais atingirão limites de adaptação.
. Limitar o aquecimento exige a neutralidade carbónica. As emissões desta década determinarão se é possível limitar o aquecimento global a 1,5º C ou 2º C.
. As alterações climáticas são uma ameaça ao bem-estar humano e à saúde planetária. As escolhas e ações implementadas nesta década terão impactos agora e para os próximos milhares de anos.