Na Guarda, primeiro círculo com resultados fechados, os três principais partidos repetiram a classificação de 2024, com AD, PS e Chega a elegerem um deputado cada. Mas, em 2025, há uma diferença substancial no número de votos de cada um deles.
A Aliança Democrática elegeu Dulcineia Moura com 32 91 votos (39,56%), uma subida considerável face aos 29 033 votos alcançados pela coligação há ano, correspondente a 34,12%. O Chega ficou em terceiro lugar, mas também subiu, de 15 821 votos (18,59%) para 17 247 (21,13%)
A grande queda foi do Partido Socialista, que passou de 31,88% para 26,40%. Ou seja: uma descida de 5583 votos (de 27 133 para 21 550 votos).
Newsletter
Curiosamente, a Iniciativa Liberal subiu agora ao quarto lugar na Guarda, mas quase com o mesmo número de votos obtido há um ano: 1 994 em 2025 e 1 913 em 2024.
Uma hora antes de as televisões anunciarem as projeções, já circulavam algumas sondagens à boca das urnas (umas verdadeiras, outras falsas) no Epic SANA Hotel, a sede da AD. As oito da noite só vieram dar o mote para o cântico preparado: “AD! AD! AD!”, gritaram em uníssono as poucas dezenas de apoiantes da coligação liderada por Luís Montenegro.
Traduzindo em futebolês: o entusiasmo sentido na sala era como se fossem adeptos de um clube grande a festejarem a vitória por 1-0 em casa contra uma equipa que luta para não descer de divisão.
Foto de José Carlos Carvalho
A escassez de sorrisos entre os apoiantes, nos minutos seguintes, depois de assentar a poeira, confirma que no seio da AD ainda havia muita gente que tinha esperança numa surpresa agradável, num resultado mais expressivo, quiçá que permitisse à coligação PSD/CDS governar em maioria com a IL. Essa possibilidade parece, no entanto, muito distante.
Newsletter
Noutras circunstâncias, seria motivo de regozijo esta queda calamitosa do grande adversário do PSD – as projeções dão o PS com um dos piores resultados da sua história, podendo ficar mesmo abaixo dos 20,77% de 1985, quando o PRD roubou grande parte dos votos aos socialistas. Mas a perspetiva de ingovernabilidade e, sobretudo, o fantasma do Chega, que pelas projeções pode mesmo ficar em segundo lugar, está a deixar nervosos muitos sociais-democratas. Com razão.
Coube a Hugo Soares fazer a primeira reação às projeções, no palco da sede da AD. “Os portugueses votaram, escolheram e a AD saiu reforçadíssima”, começou por dizer. “Parece-me seguro dizer que o País reforçou a confiança no governo e no chefe de governo, dr. Luís Montenegro”, continuou, antes de ser interrompido por aplausos.
“A diferença face aos demais adversário parece-me bastante substantiva, o que significa que os portugueses tiveram uma firme convicção no ato eleitoral. Escolheram de forma inequívoca a coligação para continuar a governar os destinos de Portugal. Qualquer comentário mais definitivo terá de esperar pelos resultados finais.”
Saindo do palco sem admitir perguntas a jornalistas, Hugo Soares evitou falar sobre a nuvem negra em que todos na sala estão a pensar: como pode a AD governar o país em minoria e estando entalada entre uma oposição de esquerda e de extrema-direita?
Quando as primeiras sondagens apareceram nos quatro ecrãs, cada um em seu canal informativo, o silêncio apoderou-se dos socialistas aqui presentes. Não admira: além da derrota anunciada, a proximidade do Chega e a possibilidade de o partido passar a terceira força política deixa qualquer apoiante de rastos.
Por exemplo, a sondagem do CESOP – Universidade Católica Portuguesa para a RTP prevê a vitória da AD, com entre 29 a 34% dos votos. O PS aparece num expectável segundo lugar, com entre 21 a 26%, mas poderá ser ultrapassado pelo Chega, que tem 20 a 24% das intenções de voto. Segundo estas previsões, a coligação de Luís Montenegro poderá eleger entre 85 a 96 deputados e os socialistas entre 52 e 63 mandatos, enquanto para o Chega se prevê entre 50 e 61 deputados. Os números das outras sondagens não andam muito longe destes, o que leva a crer que os resultados finais não irão afastar-se muito disto.
Na CNN, a projeção da Pitagórica para a CNN dá vitória ao PSD e CDS, com entre 29,1% e 35,1%, um resultado melhor do que os 28,84% obtidos nas últimas eleições. Neste caso, o Chega aparece à frente do PS, obtendo entre os 19,5% e os 25,5%, sempre acima dos 18,07% que em 2024 valeram ao partido 50 deputados.
Newsletter
Perante estas leituras, os mais novos, filiados na Juventude Socialista, são os mais abalados da sala, pelo menos por aquilo que conseguimos aferir. Abraçam-se, confortam-se com pancadinhas nas costas, secam lágrimas. E ninguém faz um comentário que seja. Nem os veteranos, os que vêm todos os anos, apesar de não fazerem parte do PS. Tudo calado. Comentários, só para os dirigentes que hão de pronunciar-se ao longo da noite, à medida que os votos apurados tragam mais certezas a esta noite eleitoral.
Uma curta reação às primeiras projeções das televisões para a noite eleitoral. Um empate técnico entre Chega e PS, a verificar-se – sobretudo se o Chega ultrapassar os socialistas – exige uma mudança imediata de liderança, no Largo do Rato. O próprio Pedro Nuno Santos concordará que é mau de mais.
Depois, se o PS ficar em terceiro lugar, tendo em conta uma ruidosa bancada destrutiva no parlamento – a do Chega -, a estabilidade será, mais do que nunca, necessária. E exige uma solução à alemã, mediante um acordo entre o primeiro e o terceiro classificados (com uma nova liderança socialista). E aceitar a realidade: André Ventura é o líder da oposição.
Se o PS ficar em segundo, “tem direito” a liderar a oposição e a estabilidade só poderá ser assegurada mediante uma coligação “arco-íris” (também inspirada num exemplo recente alemão): AD mais IL mais Livre. Sim, Livre. Tal como na Alemanha, a coisa pode não durar para sempre, mas é uma forma de garantir governabilidade e de ter um contrapeso às politicas neoliberais com que os partidos à esquerda nos “assustaram”, quando pensaram numa coligação AD/IL. Estará Rui Tavares à altura? Dirá ele que Montenegro só não tem maioria se não quiser?
Newsletter
É muito utópico pensar que isto é possível em Portugal, mas é pegar ou largar.
Estes são os dados avançados pela RTP, SIC e TVI nas primeiras projeções desta noite eleitoral divulgadas às 20h00.
RTP: (RTP/Universidade Católica)
AD (PSD/CDS) – 29% a 34% (85 a 96 deputados) PS – 21% a 26% (52 a 63 deputados) Chega – 20% a 24% (50 a 61 deputados) IL – 4% a 7% (6 a 12 deputados) Livre – 4% a 10% (4 a 10 deputados) CDU – 2% a 4% (2 a 4 deputados) BE – 1% a 3% (1 a 3 deputados) PAN – 1% a 2% (0 a 1 deputado)
SIC (ICS/ICSTE-GFK/METRIS):
AD(PSD/CDS/) – 30,3 a 34,7,% (82 a 94 deputados) PS – 21,6 a 25,8% (56 a 66 deputados) Chega – 19,9 a 24,1% (55 a 65 deputados) IL – 4,2% a 7,4% (6 a 12 deputados) Livre – 3,3% a 6,5% (4 a 10 deputados) CDU – 1,4% a 4% (1 a 4 deputados) BE – 1% a 3,6% (1 a 4 deputados) PAN – 1,4% a 4% (0 a 2 deputados)
TVI: (Intercampus)
AD (PSD/CDS) – 29,1% a 35,1% (80 a 100 deputados) PS – 19,4% a 25,4% (50 a 70 deputados) Chega – 19,5% a 25,5% (50 a 70 deputados) IL – 5% a 8% (6 a 14 deputados) Livre – 3,2% a &,2% (4 a 10 deputados) CDU – 1,3% a 4,3% (1 a 5 deputados) BE – 1,1% a 4,5% (1 a 5 deputados) PAN – 0,5% a 2,5% (0 a 2 deputados)
No total, são eleitos neste escrutínio 230 deputados, em 22 círculos eleitorais – 18 dos quais em Portugal continental e os restantes nos Açores, na Madeira, na Europa e Fora da Europa -, num ato eleitoral que tem um custo a rondar os 26,5 milhões de euros.
Concorreram a estas eleições 21 forças políticas, mais três do que nas eleições de março do ano passado.
O Partido Liberal Social (PLS) é o único partido estreante neste ato eleitoral, juntando-se a AD (PSD/CDS-PP), PS, Chega, IL, BE, CDU (PCP/PEV), Livre, PAN, ADN, RIR, JPP, PCTP/MRPP, Nova Direita, Volt Portugal, Ergue-te, Nós, Cidadãos!, PPM e, com listas apenas numa ou nas duas regiões autónomas, MPT, PTP e PSD/CDS/PPM.
Nas legislativas anteriores, em 10 de março de 2024, a taxa de abstenção situou-se nos 40,10%, tendo-se verificado uma descida em relação às legislativas de 2022, nas quais a taxa de abstenção atingiu os 48,54%.
Caro leitor, convido-o a acompanhar-nos neste raciocínio para chegarmos às principais causas do aumento de 20% da taxa de mortalidade infantil (mortes por cada mil nascimentos), em apenas um ano.
O desemprego jovem (20,7%), apesar de ser inferior ao verificado há um ano (23,2%), leva a que a Geração Z (1997-2012), ainda abaixo dos 30 anos, saia de casa dos pais cada vez mais tarde. Se a esse dado juntarmos os preços de casas para comprar ou arrendar, incomportáveis para os salários baixos auferidos, temos a sequência perfeita para se constituírem novas e jovens famílias cada vez mais tarde.
Essa independência económica e esse início de vida conjugal protelados fazem também com que as mulheres estejam a ser mães cada vez mais velhas, entre os 35 e os 40 anos, fator determinante para o aumento da taxa de mortalidade infantil em Portugal. “Adiar a maternidade aumenta muito quer a taxa de infertilidade, quer as gravidezes de alto risco, ou seja, as patologias associadas que as mães, entretanto, têm. Também o facto de mais bebés nascerem prematuros [antes das 37 semanas] faz com que haja um maior risco de morbilidade e mortalidade”, explica Carla Silva, enfermeira-gestora do Centro de Saúde de Mafra, especialista em Saúde Materna e Obstetrícia há 34 anos.
Newsletter
Fertilidade Ao longo dos anos, a fecundidade da mulher vai naturalmente diminuindo e há também mais homens com alterações na capacidade reprodutiva
Entre as patologias que inspiram cuidados durante a gestação, falamos de diabetes, pré-eclâmpsia (hipertensão arterial que surge após a vigésima semana de gestação, acompanhada de um excesso de proteína na urina) e malformações genéticas, por exemplo. Como enuncia a enfermeira, “quanto maior for a idade da mãe, maior é a probabilidade de o bebé vir a sofrer de trissomia 21”.
O fator idade pode resultar em casais inférteis, pois ao longo dos anos a fecundidade da mulher vai naturalmente diminuindo e há também mais homens com alterações na capacidade reprodutiva, relacionadas com maus hábitos no estilo de vida, como o tabaco ou o consumo de álcool.
Outra explicação para o crescimento da taxa de mortalidade infantil é o aumento da imigração, com mulheres que não tiveram um acesso tão facilitado aos cuidados de saúde. “Recebemos imigrantes em gravidezes em fim de tempo que não tiveram qualquer histórico de acompanhamento médico”, conta Carla Silva, acrescentando que, “por vezes, apresentam fatores de risco relacionados com pré-eclâmpsia, com alterações de coagulação”.
O problema do SNS
Em 2024, morreram 252 bebés com menos de 1 ano, o que corresponde a uma taxa de três mortes por cada mil nascimentos, mais 42 do que em 2023, de acordo com os dados do Instituto Nacional de Estatística (INE), divulgados esta semana.
Apesar de ainda distante dos 287 de 2018, o valor mais alto nessa década (2015-2024), a subida coincide com atribulações graves na gestão do Serviço Nacional de Saúde, como o fecho das urgências dos serviços de Ginecologia e Obstetrícia dos hospitais e a falta de médicos das especialidades.
À crónica situação de falta de médicos de família junta-se, nos últimos anos, o fecho de maternidades e o encerramento de urgências. Não havendo ainda estudos que estabeleçam uma relação direta com a subida da taxa de mortalidade infantil, pedem-se análises detalhadas dos casos de morte de bebés à Direção-Geral da Saúde.
“Sendo a mortalidade infantil um indicador de excelência em cuidados de saúde, um aumento da mortalidade infantil, mesmo que abaixo da média da União Europeia, é um sinal para estarmos atentos à saúde materno-infantil”, referiu Ricardo Costa, presidente do Colégio de Pediatria, num artigo da Ordem dos Médicos.
A atual taxa é das melhores do mundo, sinónimo de desenvolvimento sócio-económico. O problema é a variação no espaço de um ano, subindo 20% de 2023 para 2024. Mas é preciso recordar que Portugal, em 1960, com 77 mortes por cada mil que nasciam, tinha a mais alta mortalidade infantil da Europa. Há 65 anos, num País pobre e rural, com 33% de taxa de analfabetismo, só 20% dos partos eram feitos em hospitais. E o Plano Nacional de Vacinação só entraria em vigor em 1965.
Com o sistemático encerramento de urgências aos fins de semana, em períodos festivos e em época de férias, o Governo demissionário criou, em dezembro passado, um projeto-piloto na região de Lisboa e Vale do Tejo, em que as grávidas devem telefonar para a Linha SNS 24 antes de se deslocarem às urgências de Ginecologia/Obstetrícia, para receberem indicação da unidade de saúde para onde devem encaminhar-se.
Não se conhece o número verdadeiro de partos realizados dentro de ambulâncias a caminho do hospital, mas contabilizando as notícias publicadas, em 2024, foram quase 50 e, até abril deste ano, houve pelo menos 21 nascimentos no transporte, um número que peca por defeito. Só na Moita, nos últimos dois anos, os bombeiros ajudaram 15 bebés a nascer.
Sempre houve partos em ambulâncias, na opinião da ministra da Saúde, Ana Paula Martins, embora admita que é preciso agir no sentido de os evitar.
A região da península de Setúbal, da qual a Moita faz parte, destaca-se nos dados recentes do INE e preocupa com uma taxa de mortalidade infantil de 3,7 por cada mil nascimentos, acima da média europeia. Segundo o INE, com 7,8% da população residente, esta região origina no seu território apenas 5,5% do PIB, sendo uma das áreas com menor peso de emprego no total da sua população residente (32,5% face a 59,7% da Grande Lisboa). É também nesta região que mais problemas tem havido em manter os serviços de Ginecologia/Obstetrícia abertos nos hospitais.
Mais progresso, menos mortes
Entre 1970 e 2008, Portugal registou uma diminuição de 94% na sua taxa de mortalidade infantil (TMI), um dos casos de maior sucesso na melhoria deste indicador
1877 Abertura do Hospital Dona Estefânia, em Lisboa, o primeiro dedicado à saúde das crianças e dos recém-nascidos.
1950-1953 A TMI era de 93,25 mortes por mil nascimentos.
1960 Morrem 77 bebés por cada mil que nascem, é a mais alta TMI da Europa. Apenas 20% dos partos são feitos em hospitais e 33% da população é analfabeta.
1965 Entra em vigor o Plano Nacional de Vacinação, universal e gratuito.
1970 Por cada 1 000 crianças nascidas, 55,49 morriam antes de completar o primeiro ano de vida. Ligeira subida de partos realizados em meio hospitalar (37,5%).
1971 Abertura dos primeiros centros de saúde, base do que viria a melhorar os cuidados de saúde. As doenças diarreicas eram a principal causa de morte destas crianças até 1 ano.
1974 Em mais de metade das habitações portuguesas não havia água canalizada, 40% não tinham esgotos nem casa de banho e em cerca de 36% não havia eletricidade.
1975 Começa o serviço médico na periferia com os recém-licenciados a irem trabalhar um ano para fora das grandes cidades.
1976 Primeiras consultas de Planeamento Familiar, mais informação sobre a pílula como método contracetivo hormonal, prevenindo nascimentos indesejados ou de bebés com problemas de saúde.
1979 Criação do Serviço Nacional de Saúde; construção de mais hospitais e mais centros de saúde.
1989 Plano de Saúde Materno-Infantil, numa altura em que também faltavam profissionais, como enfermeiras-parteiras e neonatologistas. É a implementação deste plano que irá ajudar a reduzir a TMI.
2006 Início da reestruturação dos Serviços de Urgência e encerramento de vários blocos de partos.
2008 3,31 mortes por mil nascimentos assinala uma melhoria considerável do indicador.
Fases da mortalidade dos nados-vivos
As mortes dos bebés entre o nascimento e o completar 1 ano de vida, são nomeadas e avaliadas de forma diferente
Infantil Óbitos dos que não completam o primeiro ano de vida
Neonatal Mortes até ao 28.º dia
Neonatal precoce Óbitos com menos de sete dias
Neonatal tardio Óbitos ocorridos com mais de sete dias e menos de 28 dias
Pós-neonatal Óbitos com mais de 28 dias de idade que não completam o primeiro ano de vida
Reina a confusão na rua Castilho. As urnas estão prestes a serem fechadas no continente e na Madeira, mas ainda faltam 60 minutos para isso acontecer nos Açores. Há que esperar, portanto. Enquanto isso, o desfile de notáveis vai acontecendo, para animar os mais de 20 jornalistas que estão à porta do hotel, de câmara, microfone ou caneta em punho.
As primeiras palavras oficiais da noite e as felicitações aos portugueses que votaram
Pedro Nuno Santos já cá está e, como seria de esperar, comentou perante o enxame que se formou à sua volta, que “não comentava nada”, que ia “esperar”. O povo é sereno, já dizia o outro.
Menos serena está a americana Michelle Chang que, ao lado do seu filho adolescente Christopher, quer saber a razão para tanto burburinho à porta do hotel em que está hospedada, mais 200 pessoas de todo o mundo que vieram assistir à convenção europeia da World Chamber of Commerce. Antes de entrar na carrinha Mercedes preta que os levará a um jantar na capital que visitam pela primeira vez, esta antiga presidente da câmara de comércio, e apoiante declarada de Trump, vai filmando a chegada de Pedro Nuno Santos.
Newsletter
Tal como ela, nenhum dos hóspedes sabe do que se trata, mas não se inibem de ficar no hall a observar o movimento. Artur Oliveira, a trabalhar no Altis há 13 anos, diz que deliberadamente não os avisam do que vai acontecer, pois no fundo este é um “evento como outro qualquer e os clientes até acham graça”.
Entretanto, na sala destinada aos discursos e a receber os apoiantes, já há gente nas cadeiras, a olhar para as notícias que falam das previsões da abstenção (entre 41,5 e 47,7%). Pela internet circulam várias sondagens falsas, tal como aconteceu em eleições anteriores. Não lhes vamos dar lastro. Previsões, já se sabe, só depois do jogo que é como quem diz depois do bater das oito da noite. Os nervos não são de aço e eles começam a estalar, logo a seguir à declaração de Pedro Vaz, um dirigente do PS, que felicita todos os portugueses que votaram e volta à narrativa na “tranquilidade”, embora lembre que o partido entrou na corrida para “ganhar”.
Alguns dos membros do grupo Semear Esperança chegaram bem cedo para garantir um bom lugar
No canto do lado esquerdo de quem entra, há um grupo de meia dúzia de pessoas do Semear Esperança, um movimento que nasceu dentro do partido a propósito do apoio a Miguel Prata Roque para a Federação da Área Urbana de Lisboa do Partido Socialista. Apesar de ele ter perdido, o grupo manteve-se coeso até hoje.
Catarina Paiva, 62 anos, auditora reformada, desta vez decidiu vir mais cedo para estar na linha da frente, sentada nas confortáveis cadeiras do hotel Altis: “Somos pelo Pedro Nuno Santos. Ele precisa da nossa força. Não temos interesse político, não vivemos disto, por isso falamos de alto.” Acrescenta que querem renovar práticas, abrir mais e ir buscar gente mais jovem que o partido está envelhecido, constatam.
José Agostinho, 37 anos, já é o resto desse rejuvenescimento e está alinhadíssimo com o que o PS defende para o País. “Estamos unidos no partido. Todos estes camaradas defendem as mesmas coisas, como os interesses dos trabalhadores, um salário mínimo e médio mais digno”, revela, dizendo-se confiante na vitória. Será? Veremos o que dizem os prognósticos daqui a nada…
A dor no peito é um motivo de avaliação médica que se reveste de especial importância, na medida em que estão envolvidas causas com potencial de risco para a vida.
Sendo o enfarte agudo do miocárdio (na terminologia popular, ataque cardíaco) uma das causas de dor no peito, esta avaliação tem sempre de ser feita com o maior cuidado. Morrem por ano, em Portugal, mais de sete mil doentes por enfarte agudo do miocárdio, tornando-o na segunda maior causa de morte no nosso país.
De salientar que a maioria das mortes por enfarte acontece antes de os doentes recorrerem a cuidados médicos. Uma vez no hospital, a mortalidade é já muito menor, na ordem dos 2/3 por cento.
Newsletter
Primeiro, é fundamental avaliar o perfil de risco do doente, sabendo de fatores de risco como tabagismo, hipertensão arterial, dislipidemia, história familiar, diabetes, entre outros. Valorizamos, de modo diferente, as queixas em função do perfil de risco.
Segue-se a clarificação do tipo de dor. Características como a relação com esforço, deglutição, tipo de dor e sintomas associados (suores) remetem para causas diferentes. Sabendo isto, o médico pode ficar já muito perto do diagnóstico. Em todo o caso, são necessários quase sempre alguns exames para clarificar. O mais importante, nesta fase, é perceber se estamos perante uma situação aguda ou estável. Para tal basta, muitas vezes, uma boa história clínica e um eletrocardiograma.
Excluída a causa cardíaca, é altura de avaliar a origem não cardíaca de dor torácica. São muitas as causas de dor no peito e, uma vez mais, a história clínica pode ser muito esclarecedora. A dor opressiva e a relação com a deglutição podem fazer o médico pensar na origem esofágica, mas não são definitivas. A doença do refluxo deve então ser estudada.
A ansiedade está frequentemente envolvida, seja como causa absoluta ou, na maioria dos casos, como cofator. É sabido que a coexistência de ansiedade exacerba a maioria das queixas de dor no peito. Compete ao médico avaliar a relevância do fator emocional neste contexto.
Na verdade, os componentes orgânico e emocional não existem de forma separada. Estão sempre interligados! Se, por um lado, a ansiedade pode precipitar ou agravar uma queixa de dor no peito com origem orgânica, o contrário também é verdade. A existência de uma dor num local onde a generalidade das pessoas atribui potencial de fatalidade é, por si só, uma causa de ansiedade.
O enfarte agudo do miocárdio é uma das causas de dor no peito. Esta patologia pode ser fatal. Daí que se defenda que, se alguém tem esta queixa, deve recorrer a cuidados médicos.
A Associação Portuguesa de Intervenção Cardiovascular (APIC) tem dedicado especial importância à informação do público no que respeita a este assunto. No seu site, pode ler-se:
“O Enfarte Agudo do Miocárdio (EAM) é uma emergência médica. Conhecer e compreender os seus sintomas e agir o mais rapidamente possível pode ser decisivo para o seu prognóstico!”
Esta campanha (Stent Save a Life) chama a atenção para as queixas seguintes: dor no peito, suores, náuseas, vómitos, falta de ar e ansiedade. O alerta é para que qualquer doente com estas queixas ligue para o 112.
Será colocado em contacto com profissionais de saúde que vão avaliar e orientar para cuidados mais adequados à sua situação, através de uma estrutura a que chamamos Via Verde Coronária.
Excluídas as causas mais agudas de dor no peito, não devemos parar a investigação. O estudo complementar para este grupo de queixas está disponível em centros mais diferenciados, onde temos à nossa disposição recursos tecnológicos para então chegar à origem da dor e seu tratamento, seja ela angina, doença esofágica ou ansiedade.
Artigo publicado na VISÃO Saúde nº33
A fotografia não foi encenada. Luísa Louro Grácio estava a tentar fechar a Panças, a Castanha, a Preta e a Choné no curral quando chegámos a sua casa, a mais alta da aldeia de Monte Cimeiro. Os ténis de um branco-OMO são de quem tinha ido à biblioteca do Sardoal, a vila mais próxima e sede do concelho, a dez minutos de carro, e se apressara para nos receber.
Andávamos desencontrados desde o início da tarde, primeiro à porta do Jardim de Infância de Presa, a única escolinha em toda Alcaravela, onde tínhamos ido à coca de casais jovens, ouvindo que “um de Lisboa” se mudara para a freguesia durante a Covid. Mais tarde, cruzáramo-nos junto à igreja de Santa Clara, vinha Luísa do Sardoal com a filha a dormir no carro e estávamos nós à espera do pároco. A conversa ia ter de esperar porque já sabíamos que Francisco Valente se paramenta em cima da hora por causa da correria entre as três comunidades de fiéis que tem a seu cargo e não queríamos perdê-lo nem atrasar a missa de quarta-feira.
Dali a minutos, não nos chegariam os dedos das duas mãos para contar as pessoas de frente para o altar, o que teve sabor a milagre ao fim de um dia de povoações aparentemente vazias, em que nos salvara a boa vontade de quem é primo ou cunhado deste e daquele, como se fizessem todos parte de uma grande família.
Newsletter
Rosa Lavrador Na companhia da uma das suas filhas e de uma vizinha, cuida que as suas terras produzam bons legumes que vende em Abrantes. Um dia, quem sabe, as suas batatas poderão internacionalizar-se como os trabalhos feitos nos teares da Artelinho, cooperativa fundada por mulheres, entre elas Alina Rodrigues
Agora, o sol que prometera trovoada ao longo do dia iria aguentar-se mais uma hora, nem tanto, e era preciso recolher as ovelhas para conseguir ouvir Luísa. “A Choné chegou esta semana e ainda está difícil de domar!”, ri-se ela e nós com ela, até que a jovem suffolk, de cabeça e patas pretas, cede ao engodo da ração. Os passarinhos embalam a conversa – e esta não é só uma frase para encantar citadinos. No campo, a primavera faz-se ouvir.
Para ninguém se perder no relato, adiante-se que Monte Cimeiro é uma das 14 aldeias de Alcaravela, uma freguesia rural junto à serra com o mesmo nome, onde, em 2021, os recenseadores contaram um total de 779 habitantes. Quase cinco anos depois, terão morrido uns e nascido outros, mas o certo é que é uma população “muito envelhecida”, com 670 inscritos para votar no próximo domingo, segundo o presidente da junta, Paulo Casola Pedro, que está no seu terceiro e último mandato.
Nas legislativas do ano passado, eram 690 eleitores e 566 foram descarregar o voto, como se usa dizer por aqui, dando maior vitória à AD. Votaram oito em cada dez, ou seja 82%, bem mais do que os 66% de média no território nacional – e tem sido assim historicamente, seja para eleger deputados, eurodeputados ou membros do poder local.
É verdade que houve uma freguesia no País, ilhas incluídas, que ainda votou mais: Lamosa, uma pequena aldeia do concelho de Sernancelhe, no distrito de Viseu, onde 91% dos seus 151 eleitores não se deixaram estar em casa no dia 10 de março de 2024. Mas ficámos mais curiosos com as 14 aldeias-votantes de Alcaravela e por isso metemo-nos ao caminho, que nem é longo, desde Lisboa – 1 hora e meia de carro e eis-nos prontos a encontrar explicações e a provar umas tigeladas de ir aos céus.
O fim dos resineiros
Antes de partir, aprendemos que não existe uma povoação chamada Alcaravela. As placas apontam na verdade na direção de Santa Clara, a sede da freguesia onde pontifica a igreja (centenária, à justa) e a casa do povo (uma das primeiras do País, há tanto tempo abandonada que ganhou dois pinheirinhos no telhado).
É também em Santa Clara que os fregueses procuram a extensão do centro de saúde do Sardoal (agora sem médico de família e há dois meses com serviço de teleconsultas, uma vez por semana), a minifarmácia (oficialmente chamada de posto de medicamentos) e o único multibanco da zona (longamente negociado pelo Executivo da junta).
Aos domingos, é ainda na sede da freguesia onde se encontram os habitantes das aldeias por causa do mercado semanal que tem um pouco de tudo. De resto, espalhados pelas restantes aldeias há dois minimercados, três cafés, uns poucos de madeireiros resistentes, uma única serração, algumas empresas de construção civil, uma estrutura residencial para idosos (ERPI, inaugurada em janeiro do ano passado), além de várias associações recreativas, um grupo desportivo cuja equipa de futebol está na final da Liga Inatel (é já no sábado, 17, vamos lá, putos de azul e branco do GDA!) e uma cooperativa de tecelagem, bordados, cestaria, padaria e pastelaria, a Artelinho, onde se fazem as tais tigeladas deliciosas.
Sueca no Espanhol Em Alcaravela, todos dizem que vão ao Espanhol, sem especificar que é um café, o café de Luís Espanhol que ali em cima vemos a oferecer uma cerveja. Fica junto à estrada em Monte Cimeiro e se durante o dia recebe reformados em grandes suecas, à noite enche-se de jovens a jogar snooker. Espanhol era a alcunha do trisavô de Luís, que falava castelhano quando bebia
Chegando de Lisboa, pela A23, vê-se como a freguesia ainda está mergulhada em pinhais, apesar de os grandes incêndios dos anos 90 terem ditado a quase extinção dos resineiros e o êxodo de grande parte das suas gentes. Já na década de 80, muitos homens passavam a semana em Lisboa, em empreitadas de construção civil. O fogo seria a machadada final.
Em dezembro de 2021, em plena pandemia, Luísa e o marido, Pedro Grácio, decidiram fazer o caminho inverso e trocar São Domingos de Rana, no concelho de Cascais, pela aldeia onde ela nasceu e viveu até aos 6 anos. Pedro manteve-se então como gestor de frota numa empresa de reboques, à distância, e Luísa, professora do 1.º Ciclo desempregada, rapidamente estava a teletrabalhar como administrativa na mesma empresa e a querer ser mãe. “Em Lisboa, nunca quis porque não imaginava enfiar um filho num berçário aos seis meses”, conta. “Em junho, já estava grávida da Clarinha.”
Os Louro foram emblemáticos em Monte Cimeiro por causa do matadouro que o avô de Luísa teve até a legislação apertar, levando-o a trocá-lo por uma empresa de venda de fruta e legumes porta a porta. Hoje, ela faz negócio com ovelhas e cabras, sem nunca tocar nos bichos a que deu nome, e pôs em banho-maria o seu desejo de dar aulas numa escola de aldeia “à antiga”, enquanto espera pela oportunidade de ensinar adultos a ler e a escrever.
Votar para reivindicar
Na sua aldeia, há apenas três crianças em idade escolar, mais um bebé de 7 meses. E Clarinha só tem 12 coleguinhas no jardim de infância, onde entrou em março, mal fez 3 anos.
Pouco depois, já os seus pais andavam a tentar marcar uma reunião porque o recreio precisava de melhorias. E, aparentemente, eram os primeiros a queixar-se e a reivindicar mudanças, mas nada que os espantasse.
“Eu e o Pedro costumamos dizer que quem manda aqui [na região] não está habituado a pessoas como nós, com reivindicações. Sabemos onde devemos falar, não falamos só no café”, diz Luísa. E não é para se armar, é mais como quem aconselha. “Temos de fazer valer os nossos direitos”, acredita.
Já tínhamos ouvido Aida Lopes, funcionária da junta, dizer que na freguesia “as pessoas estão habituadas a arregaçar as mangas e a fazerem o que é preciso fazer”. Mas não será o voto a arma que os habitantes destas aldeias têm usado para levar avante as suas reclamações?
Envolvimento As gentes de Alcaravela não serão todas religiosas, mas é na missa que contamos mais de dez pessoas juntas. Há 32 anos na paróquia, o padre Francisco aplaude o sentido gregário dos fiéis. “Sei de gente que mora fora e vem aqui só para votar”, diz David Martins, o habitual presidente da mesa de voto da freguesia (foto em baixo)
Essa é a teoria do pároco que está há 32 anos à frente da paróquia de Alcaravela. Nos primeiros tempos, o padre Francisco apelava na missa para que as pessoas salvaguardassem o seu direito e cumprissem o seu dever de participação “porque ainda não havia vinte anos de democracia”, lembra. A certa altura, deixou de o fazer porque foi vendo como a comunidade é gregária e participativa em termos associativos.
“As pessoas valorizam a comunhão, e a criação de laços dá-lhes consciência de que só há verdadeiro desenvolvimento se participarem. Nestas aldeias, nem faz sentido que seja doutro modo, mesmo que a internet torne tudo mais próximo”, defende o sacerdote, “e o ato eleitoral é uma maneira de as pessoas fazerem ouvir as suas convicções.”
Ao telefone, ainda antes de partirmos rumo a Alcaravela, tínhamos ouvido uma explicação simples a Noélia Rafael, da Artelinho: “Nós somos muito certinhos e direitinhos.” Luísa Grácio, outra vez ela, iria avançar uma outra mais mundana: “Em São Domingos de Rana, tínhamos filas de não sei quanto tempo. Aqui, é muito rápido, mas há pessoas que passam a tarde toda à porta da antiga escola de Santa Clara, onde é a mesa de voto, a conversar com quem aparece. É um dia diferente.”
Uma horta e tempo para tudo
David Martins, presidente da única mesa de voto da freguesia há uns vinte anos, começa por dizer algo parecido, acabando a destacar o dever cívico dos seus conterrâneos: “Sei de gente que mora efetivamente fora e vem aqui só para votar.”
Encontramo-lo no Pita, que em Alcaravela tanto é nome de café como de minimercado e pertencem ambos à sua sogra. O sol está a pôr-se no horizonte e ele acaba de chegar da zona industrial do Sardoal, onde tem uma carpintaria. A uma semana e pouco das legislativas, o seu stresse maior era a 5.ª edição da Chanfana n’Aldeia, festa que costuma juntar muito povo na Presa e que ia calhar no dia do dérbi entre o Benfica e o Sporting. Domingo, 18, não o afligia por aí além. “Eu na mesa costumo dizer: ‘Aqui não há partidos, só tem de correr bem’.”
Além de encabeçar a mesa de voto, sempre no edifício onde era a escola de Santa Clara, e de presidir à assembleia geral da Associação Recreativa da Presa, David é ensaiador do rancho folclórico Os Resineiros, mas ultimamente, por falta de sala para ensaiar, têm sido poucas as saias dançadas. Esse acaba por ser o seu único lamento em voz alta, porque de resto garante que “não falta nada” na freguesia. “Nós no campo safamo-nos sempre porque temos uma horta e tempo para tudo”, dirá, já à despedida, na esplanada do Pita, onde as guerras se veem ao longe, no televisor sintonizado num canal de notícias.
Estivesse ele de manhã no café, como nós estivemos, e teria ouvido a funcionária, Célia Silva, dizer que falta “tudo!”, assim mesmo, exclamado. É por isso que esta mulher não perde uma ida às urnas e leva consigo o filho, João Pedro, de 19 anos, para que descarregue o seu voto. Será em branco, já sabe, uma vez que ele não fala nem tem destreza nas mãos para fazer uma cruz.
Organização social Criada em 1934, a Casa do Povo de Alcaravela pretendia assumir-se como órgão político do corporativismo e, por isso, viveu alguns momentos de agitação popular. O seu edifício, em Santa Clara, está agora em ruínas. Para a “sua” cooperativa Artelinho, fundada nos anos 80 por um grupo de mulheres, a “padeira” Isabel Ambrósio Santos sonha com a divulgação internacional
“Teve meningite aos 18 meses, consegue andar e entende-nos, só que nem pega numa caneta, ficou com 92% de incapacidade”, conta a mãe, “mas votar é uma regalia, devemos usá-la para não a perdermos.”
A verdade é que as queixas – e potenciais reivindicações – das gentes de Alcaravela são muitas, para mal dos pecados do presidente da junta, há 18 anos no Executivo (inicialmente como tesoureiro e sempre pelo PSD). A falta de transportes, a inexistência de médico de família, o pouco emprego e a parca rede móvel estão no topo da lista, mas poucos lhe apontarão o dedo.
O próprio não tem por costume gritar aos quatro ventos aquilo que vai conseguindo para a freguesia. “Antes quero que as minhas ações falem mais alto do que as minhas palavras. Não importa falar muito bem se não se fizer as coisas”, defende.
“A paz, o pão, habitação, saúde, educação.” No próximo domingo, contam-se 50 anos e 23 dias desde que os portugueses passaram a ter eleições livres – como esquecer o refrão de Liberdade, a canção que Sérgio Godinho lançou ainda em 1974?
Andamos há uns dias com ele na cabeça, misturado com os versos “esperar tantos anos torna tudo mais urgente” ou “só quer a vida cheia quem teve a vida parada”. Tem, por isso, piada quando entramos na cozinha da Artelinho, cuja sede fica num dos limites de Santa Clara, e ouvimos Isabel Ambrósio Santos dizer: “Acabámos de pôr pãozinho no forno.”
São nove e meia da manhã e os restantes pães de trigo do dia estão alinhados, à espera de serem cozidos num dos fornos a lenha, enquanto Isabel e a sua colega desta manhã, Rita Rodrigues, se afadigam a fazer bolos de limão. As nove dúzias de tigeladas arrefecem no fresco, já desenformadas das tigelas de barro, e hão de seguir-se os esquecidos, uns biscoitos com amêndoa em lâminas e açúcar por cima, também obedecendo a receituário antigo.
A cooperativa começou pela plantação e tecelagem de linho, nos anos 80, ideia de um grupo de ação católica que procurava uma ocupação para as mulheres que ficavam para trás, sozinhas com os filhos, quando os maridos iam trabalhar em Lisboa. Há uns vinte anos, avançou-se com a padaria e pastelaria.
Havemos de voltar à tarde, para ver Alina, uma das fundadoras, a fazer “de olhos fechados” um individual num dos teares, ao lado de Graciosa, que trabalhou como ajudante de ação direta antes de o centro de dia se transformar em ERPI. Mas, para já, estamos a ouvir como Isabel e Rita chegaram às cinco e meia da manhã, prontas a acender o forno com os atados que vêm da serração de Panascos.
Maria da Graça Pires Em Alcaravela, transporte público só a pedido, de um dia para o outro. No seu caso, já deu muito jeito para ir às sessões de fisioterapia, em Abrantes
O segredo de tanta coisa boa a sair da Artelinho está nos ovos verdadeiros, no muito trabalho manual e na vontade de fazer bem (ou o bem, apetece escrever depois de provar as tigeladas), contam sem nunca pararem de amassar e tender bolinhos, atentas ao forno. Quanto a votar, ah, isso “tem sempre de ser”, diz Isabel. “Votamos na tentativa de mudar alguma coisa, não é? Porque, se não votarmos, também não podemos reclamar.”
Há três meses, Rita ainda era cozinheira num restaurante em Alferrarede, perto de Abrantes. Se não fosse a Artelinho, teria apenas as limpezas nas casas de gente que mora em Lisboa e só ali vai ao fim de semana ou nas férias (uma ocupação habitual entre as mulheres da freguesia). “Voto para ver se o País melhora um bocadinho”, diz, sem levantar os olhos dos esquecidos.
Isabel já está a mandar para a Tagus, uma associação de pequenos produtores da região, a fruta e os legumes que vai tendo no terreno à volta de casa, em Panascos. Mas o que ela queria mesmo era ver a Artelinho a ganhar projeção internacional.
Lindo era de caminho as batatas de Rosa Lavrador também não se ficarem pelo mercado semanal de Abrantes, as vendas porta a porta no concelho e os cabazes da Prove, iniciativa que liga os produtores locais aos consumidores. E se, de repente, elas galgassem fronteiras?
Encontramos Rosa a cavar as ervas que se meteram entre as batatas que medram numa grande horta, na parte sul dos Panascos, na companhia de uma das suas filhas, Sónia, e de uma vizinha, Cláudia Dias, filha de um antigo resineiro. Em abril, andaram ali a semeá-las, depois foi preciso sachar e entancar (para a rega); agora, o sol está forte o suficiente para secar as danadas das ervas. “E, em julho, vocês passam por cá e levam umas batatinhas boas para fritar”, atira Rosa, sem nunca largar o sacho.
Mais à frente, havemos de passar pelas suas ovelhas e cabras “lá no bardo”, uma zona vedada também junto à estrada. “Sou viúva há 30 anos e continuo a trabalhar aos 71, é dos ares do pinho”, diz a agricultora, com uma gargalhada abafada pela buzina de um camião TIR, que nos assusta à passagem.
Alcaravela tem um grupo desportivo cuja equipa de futebol está na final da Liga Inatel (é já no sábado, 17, vamos lá, putos de azul e branco!)
É o cunhado de Cláudia, madeireiro como o seu marido. “Ela é casada com o Hugo Gaspar, um dos candidatos à junta em setembro, independente pelo PS [pelo PSD candidata-se Cristina Ambrósio]”, atalha Rosa, sem piedade, e mais uma vez ficamos convencidos de que Alcaravela é uma só família.
Não fossem Rosa, Sónia e Cláudia e não tínhamos visto ninguém a trabalhar a terra. Há pouca gente a fazê-lo, a maior parte das pessoas tem emprego fora da freguesia. “Ou são muito velhos e os filhos foram todos para Lisboa e ninguém trata disto”, vai dizendo a sra. Lavrador que também deu um curso de Gestão à outra filha para que ela pudesse livrar-se da enxada.
Rosa já sabe que Tânia não virá no domingo, porque tem de votar em Lisboa. Faltar a descarregar o voto é que não. “O meu é logo ali, em Santa Clara, em dez minutos vou e venho. Só não vota quem não quer”, remata, taxativa.
A acreditar na vox populi deste dia, vamos a assistir a uma nova corrida às urnas em Alcaravela. A maior incógnita é se o GDA ganhará a supertaça na véspera. “E se sempre vamos ter fibra em breve, nas nossas casas, porque usar o telemóvel é uma desgraça e net nem se fala”, diz Luísa Grácio.
Ela era uma miúda quando a Telecel (hoje Vodafone) lançou o anúncio “Tou xim? É p’ra mim!”. Já tem as ovelhas, só lhe falta um telemóvel com uma rede digna de 2025.
Onde se vota mais e onde se vota menos
Em 2024, votaram 66% dos eleitores a residir em território nacional. Esta média esconde grandes disparidades
Lamosa, distrito de Viseu Nesta aldeia do concelho de Sernancelhe, com 19,01 km2 de área e 179 habitantes, apenas 17 deles abaixo dos 25 anos (Censos 2021), votaram 138 pessoas das 151 inscritas nos cadernos eleitorais (91%), a maioria na AD. Lamosa é conhecida por uma atração vizinha: o Castelo do Adriano, construído por um popular, à saída da aldeia.
Rabo de Peixe, São Miguel Esta vila é a mais populosa do concelho da Ribeira Grande, na ilha de São Miguel, nos Açores, e, segundo o Censos 2021, é a freguesia portuguesa com maior percentagem de habitantes com menos de 15 anos (23,74%) e com a menor percentagem de pessoas com idade superior ou igual a 65 anos (6,74%). Entre os 7 679 eleitores, só 25% votaram no ano passado. A AD ficou em primeiro lugar, seguida pelo Chega e pelo PS.
Tem duas hipóteses para descobrir aonde se deve dirigir para exercer hoje o seu direito ao voto nas eleições legislativas antecipadas: através da internet ou por mensagem de texto.
Introduza o seu Número de Identificação Civil (Cartão de Cidadão ou Bilhete de Identidade) e a sua data de nascimento no formato AAAAMMDD (Ano / Mês / Dia)
Também é possível fazer a pesquisa pelo seu nome aqui: neste caso, tem de introduzir o seu nome completo e a sua data de nascimento no formato AAAAMMDD.
Por SMS:
Newsletter
escreva a seguinte mensagem: RE nº de Identificação Civil data de nascimento no formato AAAAMMDD (exemplo: RE 12345678 19531007)