Não sei se elas também são afetadas pelo calor deste verão, mas a verdade é que as redes sociais andam bué de malucas, assim tipo mesmo ensandecidas. Ainda estava eu a recuperar do estado de choque e indignação por o algoritmo do facebook tentar impingir-me birkenstocks com desconto como se eu fosse um boomer hippie com problemas de coluna daqueles que vão ao festival Boom brincar à biodanza e eis senão que, pelo instagram, me chega aos olhos o convite para um ‘Polyamory Workshop’. Ignorante, sempre pensei que a versão traduzida de poliamor seria polylove mas afinal deve ser assim como veio. Segundo o texto, que acompanhava a imagem de uma jovem vestida (vestida?) de amazona com tiara e asas de fadinha, a dita formação permitia em duas horas aprender ‘How to love multiple people’ (sim, porque mesmo sendo a formação em Lisboa isto agora é tudo em inglês). Fiquei a matutar no assunto.
Como declaração de princípios, eu já fui alguém que no tempo dos blogues defendia a poligamia com o número de ‘esposas’ indexado ao número de filhos gerados, como forma de combater eficazmente a implosão demográfica e ao mesmo tempo ajudar ao orçamento das famílias. Tive pouca adesão à ideia, em especial quando algumas mulheres inicialmente entusiasmadas perceberam que ao contrário não podia ser porque a poliandria (é assim que se designa – e cito a Wikipédia – “a união em que uma só fêmea é ligada a dois ou mais machos ao mesmo tempo”) não contribui da mesma forma para o nascimento de bebés.
Dito isto, ganhei mais uns anos e hoje partilho a crença de que, se amar uma pessoa já é a carga de trabalhos que sabemos, amar várias é uma tarefa hercúlea que recuso aprender em workshops, por mais atraente que seja a formadora amazona-fada (ainda bem que o corretor automático não se enganou agora).
Ricardo Araújo Pereira foi recentemente atacado por escrever sobre o escamotear da sexualidade e a sua substituição pelas emoções no que toca aos temas de género e transgénero. Também aqui, há que dizê-lo com frontalidade, o que me parece é que esta coisa do poliamor não passa de uma versão sofisticada da pulsão animalescamente humana para darmos quecas com mais do que um/a parceiro/a.
Numa investigação obviamente feita à pressa porque tenho mais que fazer nesta vida, descobri que o neologismo – poliamor – foi primeiramente utilizado por alguém com o esdrúxulo nome de Morning Glory Zell-Ravenheart, batizada Diana Moore, esse sim nome de gente. Norte-americana, como estava bom de ver, é apresentada como uma “líder comunitária, autora e palestrante em neopaganismo, bem como uma sacerdotisa da Igreja de Todos os Mundos”. Chegado aqui, decidi parar a minha investigação. Não me inscrevi no workshop. Sou um frouxo incapaz de mudar e seguir o caminho para tornar-me esse alguém que os algoritmos querem que seja; um hirsuto poliamoroso de sandálias birkenstock. Fica para a próxima vida.
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