Estava este vosso amigo para começar a escrever esta crónica, quando recebe um perturbador SMS: «Assis 1 – Kamarada Kosta 0.» Ao princípio, ainda pensei que, sendo dia de Liga Europa, os resultados começavam a chegar pelos alertas de telemóvel. Não me lembrava, é certo, de que a cidade italiana de Assis tivesse um representante na segunda competição por clubes da UEFA, e apenas identificava vagas ressonâncias da Europa de Leste no nome da segunda equipa (que, pelos vistos, teria perdido por um a zero). Mas, também, quem é que já tinha ouvido falar do Skenerbeu (adversário do Sporting para hoje)? Ninguém.
Só que não era nada disso, claro. O que tinha acontecido é que, cancelado o almoço conspirativo marcado pelo eurodeputado socialista Francisco Assis para sábado, na Mealhada, devido à posterior convocação (por António Costa), da Comissão Nacional do PS para o mesmo dia, Assis, num golpe de rins, antecipou, inesperadamente, o repasto para sexta-feira, às 21 e 30. Desta forma, os membros da Comissão Nacional que discordarem da opção seguida pela direção – a de fazer um acordo com o BE e com o PCP – já vão para lá com uma estratégia concertada. Na mouche: com as poucas horas que restam para o repasto e com a Comissão Política já convocada para domingo, dificilmente Costa arranjará maneira de estragar o jantar a Assis e companhia.
A primeira conclusão que se tira é a de que o grupo contestatário cedeu às pressões do lóbi da restauração bairradina. Já com os leitões encomendados e quase 300 almoços marcados, o cancelamento da festa era um prejuízo incomportável para a economia local. António Costa começava mal, tanto mais que o seu programa tem como alfa e omega o aumento da procura interna. Francisco Assis terá sido sensível ao argumento e os leitões não se perdem.
O caso podia ter sido perfeitamente noticiado no conhecido periódico satírico Inimigo Público – e espero não estar a queimar a manchete aos meus camaradas desse ilustre representante da imprensa séria. Não estou a ser irónico: a realidade ultrapassa, em ridículo, a sátira. Porque isto acontece no próprio dia em que outra manchete fictícia possível do Inimigo é queimada pelos factos: Ricardo Salgado, que já recebia 29 mil euros de reforma, pode passar a receber 90 mil. Aqui, sim, já se sente o dedo da esquerda, que antes mesmo de formar governo começa a ver concretizado o programa de reposição das pensões. Neste caso, a de um banqueiro falido, a contas com a Justiça – mas por algum lado tinha de se começar.
Não é preciso esfregarem os olhos: é mesmo verdade. A Autoridade Supervisora de Seguros e Fundos de Pensões deliberou que o teto imposto por Vítor Bento, na sua passagem pelo BES, não se justifica – e que tanto Salgado como os seus colegas ex-administradores, para cima de uma dezena, podem vir a receber retroativos reportados a setembro do ano passado. Mais de 900 mil euros, só para o antigo dono disto tudo. Descontou muito, ao longo da vida profissional, é verdade. E o fundo de pensões do banco pode pagar, sem custos para a Segurança Social, é verdade. Mas eu, se fosse lesado do BES, interrogava-me por que razão esse dinheiro não pode vir diretamente da conta de Salgado e dos outros responsáveis pela minha ruína, para a minha conta e as dos outros como eu, até que aquilo que o BES ficou a dever seja totalmente ressarcido. Onde está um governo de esquerda radical quando precisamos dele?!
Já que é assim, libertem, ao menos, o homem! O milagre da triplicação da reforma pode ser bem útil, lá está, no aumento da procura interna. Mas, para o homem poder consumir, não pode ficar fechado em casa, em prisão domiciliária, sem poder, sequer, dar um saltinho à Mealhada. Já viram quantos leitões se poderiam comprar com 90 mil euros?…