Lançado há escassas algumas semanas, o ChatGPT, uma inovação disruptiva da Open AI, parceira da Microsoft, já ameaça mudar a forma como escrevemos e-mails, ensaios universitários e inúmeras outras formas de comunicação quotidiana, e até como se cria arte. Esta nova geração de chat bots pode mesmo reinventar ou substituir os mecanismos de busca tradicional da Internet, como o Google. Motivo que levou a empresa mãe, Alphabet, a reagir e a anunciar esta semana o Bard, o seu próprio chat bot. Um lançamento que desiludiu o mercado e fez as ações afundarem 9%.
O tema esteve em análise esta semana no Olho Vivo com um convidado especial no painel de olheiros: Rui da Rocha Ferreira, jornalista da Exame Informática, acabado de chegar de Paris depois de uma apresentação sobre a inteligência artificial (IA) da Google. “Tecnologicamente, a OpenAI não estará mais avançada do que outras grandes tecnológicas de referência na Inteligência Artificial. Basta lembrar que foi a Google a empresa que inventou a tecnologia – os transformadores linguísticos – que permite a existência de serviços como o ChatGPT, e que já em 2021 a própria Google tinha feito uma demonstração com um serviço de IA com o qual podíamos conversar para obter de forma simples resultados de pesquisas complexas”, explica.
Se o ChatGPT é uma ameaça à Google? Sim e não, diz Rui da Rocha Ferreira. “Sim, esta é uma nova forma de pesquisa que veio para ficar, a própria Google admitiu isso no evento que realizou nesta semana. Há cada vez mais NORA (No One Right Answer), os utilizadores fazem cada vez mais perguntas complexas para as quais uma simples resposta não é suficiente. E não, porque a Google já responde de forma eficaz a muitas das questões que lhe fazemos. E está melhor posicionada, devido ao domínio que tem no mercado das pesquisas, para crescer rapidamente no segmento dos chatbots.”
“Temos uma ideia errada de como vai funcionar a automatização. Não vamos chegar um dia e ter um robot no nosso lugar. As máquinas vão fazer percentagens cada vez maiores das nossas tarefas e, quanto pensamos em dezenas de pessoas numa empresa ou em milhares num setor, percebemos que serão necessárias menos”, afirma o jornalista Nuno Aguiar. “Se dissemos há dez anos que programadores seria uma profissão em risco ficaríamos surpreendidos. É muito difícil antecipar transformações e essa é a chave deste momento: a velocidade.” Rui concorda: “Mais do que um impacto direto na eliminação de postos de trabalho, acredito que a curto prazo sistemas como o ChatGPT vão ter um impacto muito mais significativo no aumento dos índices de produtividade em profissões específicas. Com a ajuda de um sistema avançado de IA é possível fazer mais com o mesmo nível de tempo”.
Para Mafalda Anjos, o tema da IA suscita duas preocupações fundamentais. Uma de ordem política e outra a ver com o ensino. Sobre a primeira, a diretora da VISÃO teme “o mau uso da inteligência artificial, com algoritmos que podem ser tendenciosos, parciais, engajado com uma visão distorcida da realidade e, assim influenciar estados de espírito e até resultados eleitorais.” Uma influência como a que teve a Rússia nas eleições de 2016 nos EUA seria facílima, por exemplo”. Por outro lado, “é preciso pensar que tipo de jovens estamos a formar hoje neste mundo onde a IA em breve vai ser uma realidade permanente”.
“Na Era da IA precisamos de mais humanismo e de menos conhecimento estático. Vamos ter de desenvolver as características que fazem de nós humanos: ter competências sociais e saber trabalhar em equipa, ter uma opinião e uma visão pessoal do mundo, ter empatia, simpatia, boa energia, estimular a criatividade e a intuição. Tudo competências que não são desenvolvidas devidamente nas nossas escolas, e muito menos neste ambiente em que os professores estão desmoralizados e mal pagos”, diz Mafalda Anjos.
Em análise esta semana esteve ainda o tema da imigração em Portugal. Em dez dias, dois episódios graves trouxeram novamente para a ordem do dia as condições precárias dos imigrantes em Portugal. Dois indianos morrem e 14 ficaram feridos em apartamento superlotado na Mouraria consumido pelo fogo no coração de Lisboa. E em Olhão, um nepalês foi agredido e roubado, o que levou o presidente da República a se desculpar em nome dos portugueses.
“Há duas histórias de imigração em Portugal: os nómadas digitais, reformados europeus e milionários com vistos gold, com regimes fiscais favoráveis e que compram casas a preços mais caros do que os portugueses; e os imigrantes asiáticos, como aqueles que estavam naquela casa da Mouraria, que nos entregam uber eats e se amontoam em pequenas casas”, aponta Nuno Aguiar. “Falar em quotas, como fez Luís Montenegro, não só não faz sentido perante a tragédia, como não resolve: estes imigrantes são necessários. Dificilmente se resolve este problema sem falar da precariedade geral do mercado de trabalho português.”
Para Mafalda Anjos, é essencial educar e explicar a importância da imigração para a economia portuguesa, porque é assim que se combate o racismo e a xenofobia. “A médio e longo prazo, precisamos de imigrantes como de pão para a boca! Temos uma população em queda entre 2011 e 2021, como revelou o último Censos. A única década em que se verificou um decréscimo populacional foi na de 1960 e 1970. São essenciais numa série de áreas onde falta mão de obra, como na agricultura, no turismo, a restauração, nas limpezas, e há muita imigração qualificada que também é bem vinda”, sublinha.
Nas notas finais, debaixo de olho estiveram ainda os temas dos terramotos e os dados do desemprego.
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