Kiev – 14 horas – (12h em Lisboa) 24 de Agosto (último dia da visita de Estado): Duas vezes, ao almoço, Zelensky escangalhou-se a rir. Mesmo. Até se agarrou ao braço do segundo homem mais poderoso da Ucrânia, Andriy Yermak, à sua direita. «O Presidente é uma pessoa com muito carisma e sente a voz do nosso povo», disse Zelensky à RTP (Cândida Pinto), sumarizando os seus encontros com o PR. Se na cerimónia do dia da Independência, de manhã, na praça da Igreja de «St. Sofia», Marcelo já tinha impressionado, falando em ucraniano, e conquistado o coração dos presentes («com algum sotaque!»), no almoço foi ainda mais empático e arrebatador para o Presidente ucraniano e os seus 9 acompanhantes. Aconteceu na Casa (Palácio) das Quimeras (!)
A entrada no perímetro presidencial e governamental é uma peripécia, só concebível num país em guerra: os telemóveis ficam nos carros, muito distantes, não são permitidos «smartwatchs», e a passagem pela segurança militar é para todos, incluindo o PR. Há sacos de areia, armas ligeiras e pesadas e um cheiro intenso a «bunker». Para se chegar ao palácio de sonhos, de Quimeras, e a Zelensky, é obrigatório percorrer este «inferno» da segurança. Já se sabia.
Zelensky, finalmente. Está no tapete vermelho que dá acesso ao palácio de estilo «Art Noveau», do início do século XX. É pequeno, mas espetacular. O PR apresenta-nos, e em conjunto com o MNE vai para o encontro oficial e formal entre as delegações. Do que se falou só o Presidente e MNE saberão, e a comitiva restrita, mas presume-se que de novos pedidos, e balanços, no quadro da transparência das nossas capacidades. Depois sim, o almoço, em 50 minutos.
Foi aí, sem sombra para dúvidas, que o nosso Presidente conquistou, definitivamente, Zelensky e a sua equipa, da qual sobressaiam o chefe do Gabinete Presidencial, e o ministro ucraniano dos Negócios Estrangeiros. O poder de cada um percebeu-se à mesa: à direita está Yermak, e à esquerda Kuleba.
O almoço, nada protocolar, revela e confirma um sinal: o presidente ucraniano e a sua comitiva, civil e militar, são muito pragmáticos: sabem o que precisam, e dizem-no sem rodeios. «Não nos mandem helicópteros de emergência médica, para retirar os feridos da frente. Precisamos de blindados para esse transporte. Temos muitos helicópteros, e os que voam são abatidos», disse Zelensky, ao almoço. Nada de secreto.
Há ainda um apelo direto de Zelensky ao nosso PR: «por favor ajudem-nos a falar com a América Latina e com África. Precisamos disso, e não estamos a conseguir». Marcelo tomou nota, e certamente que colocou o assunto na cimeira da CPLP, dois dias depois.
O Presidente da Ucrânia riu-se à gargalhada com alguns comentários do nosso Presidente, em particular da cerimónia das «Lendas da Ucrânia», e reconheceu que era muito importante para ele, e para os que o acompanhavam, poder rir e desanuviar. Marcelo confirma o seu carisma. Tudo acabou em 50 minutos. Despedidas no tapete vermelho, outra vez, e cada um com a sua foto para recordar.
Em Zelensky, numa proximidade invulgar, percebe-se a grandeza e o orgulho de não ter vergado à brutalidade de Putin, e a firmeza consciente de que sairá vitorioso desta guerra. É agradecido, mas não lamuriento, sabe o que todos nós, aliados, estamos a jogar nesta guerra, e assume o peso dos sacrifícios que o seu povo está a fazer. Quem vai a Kiev agradecer a Zelensky, e por seu intermédio aos ucranianos, vive um momento único. Irrepetível e inimitável.
Amanhã: Sucesso do PR (VII-Fim)
Notas de Rodapé: 1. O Presidente foi ver, ao final da tarde, os equipamentos militares russos destruídos na guerra. Na Praça da Independência, o seu sucesso multiplicou-se. É feriado, estão milhares de ucranianos na rua, e ouve-se repetidas vezes a palavra «portucalo». Ou coisa parecida. Tudo fora da agenda, e do guião dos serviços de segurança.
2. O comboio de regresso à fronteira com a Polónia parte às 21 horas de Kiev. Esperam-nos os mesmos funcionários dos caminhos de ferro, de camisa branca, que nos acompanharam na viagem de entrada. Sempre disponíveis, sempre com uma refeição para nos oferecer, e já habituados a esta correria protocolar.
3. 26 horas depois aterramos em Lisboa. Às 23 horas do dia 25 de Agosto de 2023. Acabou a «Visita de Estado à Polónia e Região».
PARA SABER MAIS:
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