Cai a noite e a janela para o mundo abre-se. Notícias frescas entram em casa pelo pequeno ecrã. Algumas delas já lidas ou ouvidas ao longo do dia, mas, o poder de síntese e da imagem da televisão tem a capacidade de nos atingir como um murro no estômago. Às vezes nem precisa do som.
No Bangladesh, um incêndio atinge um acampamento de refugiados Rohingyas. Milhares fogem e ficam sem abrigo. No norte de Moçambique crianças são decapitadas pelo Estado Islâmico. Milhares de pessoas estão deslocadas.
Nas Honduras, o desemprego, a violência e os danos causados pela passagem de dois furacões deixam o país devastado. Milhares fazem-se ao caminho, a pé, até aos Estados Unidos da América. Nesta jornada, ao chegar ao México, um pai pede à filha, uma criança, para continuar sozinha rumo a uma das mais perigosos fronteiras do mundo.
Da Austrália sabemos, num dia, de uma praga de milhares de ratos a invadirem plantações e cidades. No dia seguinte são notícia as cheias, depois as pragas de aranhas e de cobras. E ainda há pouco não estavam a lidar com fogos?
Na Islândia um vulcão adormecido há 800 anos acorda com toda a sua beleza feroz. Em Itália e na Guatemala outros dois vulcões expelem as suas lavas. Leves tremores de terra são sentidos em Portugal. As entranhas do planeta parecem estar em ebulição. Quererão dizer-nos alguma coisa?
Uma excelente metáfora, afinal, para o estado atual da humanidade. Problemas cozinhados em lume brando ao longo dos anos, numa panela que ficou esquecida no fogão. Fervilham, vão fazendo os seus estragos e estão prestes a eclodir em explosões maiores a qualquer momento. Tal como um vulcão.
E se antes todos estes acontecimentos pareciam distantes, até indiferentes, a pandemia veio mostrar o quão ligado está o mundo e como o longe se torna tão perto. Começa a ser difícil negar que o que se passa nas Honduras, em Moçambique, na Austrália ou aqui na vizinha Europa também nos diz respeito. Começa a ser difícil negar o quanto nós também não vamos assim tão bem.
Haverá solução?
Um novo dia começa. O sol brilha. O mesmo senhor de sempre varre as folhas caídas no jardim com a sua estridente máquina às costas… O som da normalidade por estes dias. Amarelas, brancas ou lilases, as flores continuam a crescer e a inundar-nos de cor. A esperança perdida no final do dia anterior, renova-se.
O que é para ti a sustentabilidade? Perguntaram-me recentemente. Sustentabilidade é isto, um dia sermos atingidos pela náusea, desesperança e sentimento de impotência, de tantos que são os problemas económicos, sociais e ambientais. Para no dia seguinte as pequenas grandes coisas voltarem a dar sentido ao puzzle e acreditarmos que pode haver saída.
Uma saída que tem de partir de nós, seres humanos, únicos na capacidade de cooperação, ambíguos na nossa natureza, onde coabitam as melhores e as piores qualidades, que nos fazem estar onde estamos. Uma saída que tem de puxar pelo melhor que há em nós: altruísmo, solidariedade, respeito, valores.
E se assim não for, que fale mais alto o amor pelos que são sangue do nosso sangue e a vontade de deixar um mundo possível de ser vivido aos nossos filhos, netos, bisnetos… As gerações do futuro.
Sustentabilidade é a luz ao fundo do túnel.