Há expressões que ganham espaço em nós, ocupam-nos o ser e quando damos conta já fazem parte do nosso vocabulário como se sempre lá estivessem estado. Um desses exemplos é a expressão “tapau” que, por cá, todos os dias usamos. Os que a reconhecem já esboçam um sorriso nos lábios, certo?
“Tapau” é tão nosso que nos faz sentir (nós, aos da comunidade portuguesa) parte integrante de um todo. Há palavras que nos trazem cumplicidade à terra que nos recebeu. São sentimento, memórias, aprendizagem. É aqui que nos misturamos e na nossa vulnerabilidade nos assumimos como um todo.
Como seria de esperar “tapau” tem diversas formas de ser escrita e significados diferentes. Por aqui, dita-me uma tradutora, escreve-se 打包 e significa qualquer coisa como “para levar”, mas sou imediatamente alertada: noutro contexto pode também querer dizer “embalar um corpo morto”. Posto isto, muita atenção ao contexto e ao tom usado. Aqui entre nós, não tenho dúvidas em afirmar que quem nunca usou um tom errado não sabe o que é viver em Macau!
Para descomplicar. Tapau é o mesmo que take-away no resto do mundo. Para além de ser das primeiras palavras que qualquer emigrante recém-chegado deve aprender é uma prática diária e profundamente comum em todas as culturas que aqui estão. Mais do que isso, é prático, bom e barato.
Embora nos tenhamos que aperfeiçoar em termos ecológicos, substituindo os plásticos por elementos amigos do ambiente – há já quem leve a sua própria lancheira ao restaurante evitando o uso de embalagens de plástico – o tapau é uma perfeita forma de evitar desperdício alimentar.
Que fique escrito que Tapau não representa apenas “ir buscar comida”, inclui também levar para casa o que sobrou do almoço ou jantar. Desengane-se quem pensa que o tapau mora nos restaurantes de rua. Não. É prática geral, seja a tasca no virar da esquina com dois bancos vermelhos de plástico encostados ao pilar do prédio ou o restaurante Michelin. Sim, até o funcionário do Robuchon au Dôme pergunta depois de terminado um menu de 12 pratos: “tapau?”.
Chega mesmo a ser insultuoso desperdiçar comida. Se os meus avós me diziam que era pecado deixar comida no prato, os chineses ensinaram-me que é uma parvoíce de todo tamanho não levar o que sobrou para casa.
O mundo é um lugar incomum e brilhante. Se a determinada altura vi pessoas recusarem levar o que sobrou de comida por uma questão de status, hoje são os chineses que me deixam respirar em paz. Talvez seja através destas pequenas coisas que, no futuro, consigamos perceber o tanto que temos para aprender com as diferentes culturas. Talvez a perfeição seja o resultado dessa troca de aprendizado e da mistura do melhor de todas. Mas isso já são outras contas.