Com um passo vagaroso, arqueado em movimentos calculados, lentamente vou definhando a neve que insiste em se tornar gelo e a fazer sentir-me falivelmente humano – novamente.
Estou a chegar ao sexto mês do rigoroso inverno Mongol. A tundra mata ao mesmo tempo que embeleza belicamente os resquícios dos darwinismos menos humanos. Os menos 42 são mais penosos que os que menos se conseguem adaptar.
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A violência do toque no caminhar para os extremos, faz com que a própria vida seja questionada, o sentir que não controlamos uma realidade que afinal era alada e o reconhecimento que a espécie humana é sem dúvida a menos adaptada ao planeta Terra.
![knot buddha_preview.png](https://images.trustinnews.pt/uploads/sites/5/2019/10/12063603knot-buddha_preview.png)
Aprendi com o professor Rui Gaibino a teoria de Gaia do fantástico cientista James Lovelock, que sempre me faz reflectir na nossa progressão como um gerúndio cancerígeno. Enquanto destruímos a Terra com as alarvidades dos conceitos de aceitamento sociopatológicos do consumo extremo, construímos com o mesmo inconsciente e plástico sorriso o mais profundo occídio da nossa espécie.
![A montanha pariu um cão_preview.png](https://images.trustinnews.pt/uploads/sites/5/2019/10/12063604A-montanha-pariu-um-c%C3%A3o_preview.png)
Somos a deformidade do pensamento livre. Julgamos que o conceito do individuo e o da autorregulação que aplicamos piamente no quotidiano, é algo característico das espécies superiores, e esquecemo-nos das matemáticas vitais, do simples. Porque enquanto a flora e a fauna (não humana) no caos se expande regrada e automaticamente, nós os Pseudo Sapiens esquecemo-nos de medir impactes, de entender que tudo, tal como o amor, tem um fim. E o amor que temos pelos nossos umbigos contribuirá para esse cavalgar para um horizonte de uma nova era história para o planeta Terra – a fase pós-humana. E talvez não tenhamos de nos preocupar assim tanto com esta magnífica esfera de processos incompreensíveis. Este planeta desde o início dos tempos (ligeiramente antes dos 7 dias) sobreviverá, tal como já sobreviveu a tantas catástrofes e fenómenos que dizimaram muita da vida na terra. A diferença é que muito provavelmente pouca desta raça restará. Não quer dizer que nos extingamos, mas provavelmente a redução será brutal.. e a genética mudará, deixaremos de ser tal como hoje nos conhecemos, e quem sabe, para melhor.. enquanto o planeta reflorescerá noutros ciclos, noutros gerúndios vitais.
![Buddha sentado_preview.png](https://images.trustinnews.pt/uploads/sites/5/2019/10/12063605Buddha-sentado_preview.png)
Hoje fiquei sentado num templo Budista, primeiro partilhei o silêncio do espaço não contado e mais tarde cânticos marásmicos moídos em almofarizes feitos nas mais perenes e complexas emoções, levaram-me a mim. É bom encontrarmo-nos de quando em vez com pessoas de quem gostamos. Por vezes esquecemo-nos de falar connosco, de partilharmos e analisarmos todas aquelas frequências que frequentemente estão dessintonizadas, algo perdidas, tremendamente incompreendidas. Se há algo que a Mongólia me trouxe, foi o reforço da capacidade de desconstrução. Para contruirmos um segundo andar nas nossas casas, temos sempre de desconstruir, de partir, de quebrar, de forma a que todo o cimento emocional se torne mais concreto e nos ajude a reforçar, humildemente, as estruturas da personalidade.
![lone rider_preview.png](https://images.trustinnews.pt/uploads/sites/5/2019/10/12063606lone-rider_preview.png)
A mudança dói, e mudamos no incógnito do sofrimento que não sabemos reconhecer e na fragilidade que nos expõe. Somos como caranguejos na mudança da sua própria carapaça, somos iguais a todos os outros animais.
Toda esta profundidade é ecoada em processos lentos em que lentamente voltamos a levantar o corpo, num penoso querer de deixar de olhar para o umbigo e lentamente encontrar a linha do horizonte, a linha que nos faz caminhar de novo, não para lugar algum, mas no amor sentido das aleatoriedades da vida humana.