“Não te estupro [violo] porque você não merece”, Bolsonaro, 2003 e 2014
“Entre um homem e uma mulher jovem, o que o empresário pensa? ‘Poxa, essa mulher tá com aliança no dedo, daqui a pouco engravida, seis meses de licença-maternidade…’ Bonito pra c…! Quem que vai pagar a conta? Por isso que o cara paga menos para a mulher!”, Bolsonaro, 2015
“Tenho 4 filhos. Foram quatro homens, a quinta eu dei uma fraquejada e veio mulher”, Bolsonaro, 2017
“Eu sou favorável à tortura e o povo é favorável a isso também”, Bolsonaro, 1999
“Seria incapaz de amar um filho homossexual. Prefiro que um filho meu morra num acidente do que apareça com um bigodudo por aí”, Bolsonaro, 2011
“O grande erro da ditadura foi torturar e não matar”, Bolsonaro, 2008
“Conselho meu e eu faço. Eu sonego tudo o que for possível [de impostos]”, Bolsonaro, 1999
“Daria golpe no mesmo dia [se chegasse ao poder]”, Bolsonaro, 1999
Podia continuar. Há, infelizmente, muitas mais frases idênticas do homem à frente nas sondagens (com 26 a 28% de intenções de voto) para ser o próximo Presidente do Brasil, mas talvez não valha a pena. Se dúvidas houvesse – e a VISÃO tem falado sobejamente dele –, já teria dado para perceber o género do senhor: populista, provocador, misógino, homofóbico, racista, antidemocrático, fascista. Por incrível que pareça, Jair Bolsonaro, embalado pelas suas velhas ideias e aquele modo solto de falar latino-americano, quase faz Donald Trump parecer um líder político de elevado sentido de Estado.
Bolsonaro é mais um dos fenómenos antissistema que estão a espraiar pelo mundo: um político, influente nas redes, que capitaliza com o descontentamento das populações que se sentem esquecidas, abandonadas pelo sistema e distanciadas das elites, num país onde os escândalos de corrupção agravam a sensação de que os partidos tradicionais são todos “mais do mesmo”.
Só que Bolsonaro tem um opositor interno com o que não estava a contar, porque nunca lhe deu nenhum crédito: as mulheres. Essas mesmo que ele anda há anos a maltratar e a ofender em ignóbeis declarações discriminatórias e sexistas. Ele pode vir a ser eleito o Presidente de 108 milhões de mulheres, e a questão é só uma – deixarão elas?
Os tempos são, neste domínio, bastante diferentes dos de Trump, depois de o movimento #MeToo deixar claro o poder da viralidade das redes em prol do feminismo e do empoderamento feminino, ou melhor, em prol dos direitos de cidadania e da justiça social. E agora, no Brasil, uma campanha liderada por vários grupos de mulheres contra Bolsonaro, com o slogan #EleNão, está a varrer o Brasil nos últimos dias, antes da primeira volta das eleições, a 7 de outubro. Juntaram-se vários milhões nas redes, mas não se ficaram por ali – passaram do mundo virtual para as ruas. No sábado passado, centenas de milhares de manifestantes protestaram no Rio de Janeiro, em São Paulo e em mais de 100 cidades daquele país, naquela que foi a maior manifestação feminina na História do Brasil. E, também pela primeira vez, é já bastante notório que elas vão votar em sentido diferente dos homens. Desde o fim da ditadura militar que nunca houve uma diferença tão grande no voto dos dois géneros. É que, além de ter menos votos de mulheres, o candidato do PSL é mais rejeitado por elas.
As mulheres representam 52% dos 147 milhões de eleitores, e as sondagens mostram que 49% das mulheres se opõem à sua eleição, contra apenas 37% dos homens. Numa segunda volta, provavelmente contra o candidato do PT – Fernando Haddad (que entrou em substituição de Lula da Silva) – isso pode representar para Bolsonaro, segundo os cientistas políticos brasileiros, sérios problemas: se conseguir 30% dos votos das mulheres, vai precisar de 70% dos votos dos homens para vencer. Serão elas, com a sua sensatez e o seu pragmatismo, as guardiãs dos valores democráticos no Brasil? Oxalá que sim.