Tenho uma confissão para fazer que chocará algumas almas mais sensíveis: sou o último cavaquista vivo. Entenda-se o que quero dizer com “cavaquista”: serei a única alma genuinamente convencida de que o Presidente fez um bom segundo mandato. Se tiverem pachorra explico porquê. Porque é a ele que o País fica a dever a estabilidade governativa e o facto de um executivo de coligação, com inúmeras fissuras internas, ter acabado o seu mandato de quatro anos nas duríssimas condições em que o fez. Foi ele que impediu o desabar da coligação quando o primeiro-ministro ainda amarrado à ortodoxia cega de Gaspar lançou (sem conhecimento cabal do seu parceiro de maioria?) a ideia desastrada de baixar a TSU das empresas aumentando a dos trabalhadores. A coisa deu no que deu, o povo saiu à rua, e terá sido Cavaco, no silêncio dos corredores de Belém, que deu ao Governo o suporte de vida de que precisava como de pão para a boca. Na crise do verão de 2013, a propósito da demissão irrevogável de Paulo Portas que, tudo indicava, mataria de vez um governo de parceiros mais do que desavindos, Cavaco voltou a ter um papel fundamental (a par, é verdade, do próprio Pedro Passos Coelho) e segurou as pontas de um executivo feito em cacos.
Note-se que, com esta opinião, não estou a fazer nenhuma apologia acrítica do trabalho do executivo de quem, de resto, fui muitas vezes muito crítico. Mais relevante, julgo que destes episódios não se pode igualmente inferir que Cavaco impediu a queda do governo porque subscrevesse, também ele, todas as políticas do executivo. Em muitos momentos ficou explícito exatamente o contrário.
O que aqui releva é portanto que, em dois momentos de crise cruciais na vida do País, o Presidente deixou para trás as suas preferências políticas e pessoais, e pensou na melhor solução para o País. E escolheu salvar a estabilidade governativa. Porque do ponto de vista institucional era o que fazia sentido fazer (não existiam razões bastantes para derrubar um governo sufragado maioritariamente pelos portugueses). E porque o Presidente se terá convencido de que as consequências de uma queda do governo, naquelas circunstâncias, teriam sido altamente nefastas para o País.
Será um Presidente com muitos outros defeitos. Mas foi um Presidente das horas cruciais. E nas horas cruciais, goste-se ou não da leitura que fez, a verdade é que a fez com alto sentido institucional e que escolheu a solução que, do seu ponto de vista, melhor servia o País.
Ora é precisamente porque sou o último dos cavaquistas que me permito aferir a bondade dos próximos candidatos à Presidência da República de acordo com o que imagino tivessem sido as suas reações nos momentos de crise que vivemos nos últimos quatro anos (até porque mais crises existirão nos próximos quatro). E o problema é que o que imagino não tem nada de particularmente reconfortante. Entre os já anunciados, confesso a minha total incapacidade de prever o que faria António Sampaio da Nóvoa. Em tese é admissível que pensasse tudo e o seu contrario porque é manifestamente pouco o que se sabe do que pensa. Entre os candidatos por anunciar, tremo só de pensar nas tropelias erráticas de Marcelo e nos impulsos populistas de Marinho Pinto, num qualquer momento de gravidade para a vida da nação.
Resta-me concluir o óbvio: os meus candidatos são, precisamente, os que não serão. O problema é seguramente meu. Quem me manda ser esquisito?