Depois dos ataques a obras de arte com polpa de tomate ou da colagem de activistas ao chão das faculdades, surge mais uma originalidade na luta para salvar o planeta: o esvaziar de pneus de SUV (automóveis de grande porte). Por um lado, tem a vantagem de não gastar recursos: nem molho de tomate, nem Super Cola 3, por outro, permanece a dúvida sobre a real eficácia destes protestos. Continuam a parecer partidas feitas por jovens da secundária, que tiveram furo a meio da tarde, porque o stôr de matemática faltou. Estes activistas pelo clima não se cansam de avisar que o tema é sério, mas teimam em fazer coisas que parecem a brincar. A acompanhar o pneu vazio vem uma carta, onde pode ler-se o seguinte: “Vais sentir raiva, mas não leves isto pessoalmente. Não és tu. É o teu carro.” Como quem diz “tu, pobre coitado, não soubeste escolher adequadamente o veículo em que te locomoves, mas nós, seres iluminados (por painéis solares, claro), tivemos a amabilidade de descer dos nossos skates para te vir educar”. Sim, já sei que estamos perante uma emergência climática, e que é urgente tomar medidas, mas imaginemos que um dos felizes contemplados com pneus vazios é alguém que, a meio da noite, precisa de levar uma criança com pneumonia ao hospital. A preocupação daquela mãe será mais com o oxigénio do que com o CO2, lamento.
Vocês podem sentir raiva, mas não levem isso pessoalmente. Não são vocês. É o bebé daquela senhora. Sei que este exemplo dificilmente comoverá estes esvaziadores de pneus que, quero acreditar, nunca hão-de se reproduzir. É que há poucas coisas mais poluentes do que uma criança. O meu filho de dois anos suga mais combustível que uma pickup. Se quiserem vir esvaziá-lo, só um bocadinho, combinamos ao fim do dia, depois da hora do banho. E sim, sei que é um hábito a rever, isto do banho diário… Se puderem cortar o abastecimento de água no meu bairro ajudavam-me a implementar esta mudança tão necessária. Este grupo ambientalista, Tyre Extinguishers, nasceu no Reino Unido, e deve ter exportado alguns membros para cá, porque não acredito que um português pudesse sugerir que o condutor troque o carro pelos transportes públicos. É mesmo coisa de estrangeiro, acreditar que os autocarros ou o metro funcionam bem em Portugal. “Os SUV são desnecessários e pura vaidade”, pode ler-se na tal carta. Ou seja, isto já não é apenas sobre emitir gases, é também sobre mandar estilo. Estes revolucionários querem proibir a vaidade. Acabaram-se os descapotáveis. A partir de hoje, quando um homem tiver uma crise de meia-idade, terá de arranjar outra infantilidade qualquer para descarregar as suas frustrações e, ao mesmo tempo, sentir-se vivo novamente. Talvez juntar-se a um bando de jovens de sandálias e andar por aí, noite fora, a esvaziar pneus.
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